Acórdão nº 01029/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Outubro de 2005
Magistrado Responsável | ALBERTO AUGUSTO OLIVEIRA |
Data da Resolução | 11 de Outubro de 2005 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam em subsecção, na secção do contencioso administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.
1.1.
A..., com os sinais dos autos, interpôs, no Tribunal Administrativo de Círculo do Porto, recurso contencioso do despacho do Presidente da Câmara Municipal de Barcelos, de 2 de Fevereiro de 1999, proferido ao abrigo de delegação de competências, que lhe recusou a aprovação do projecto de arquitectura relativo a legalização e ampliação de um edifício para instalação de um estabelecimento industrial de estamparia.
1.2.
Por sentença de fls. 333-345, foi negado provimento ao recurso.
1.3.
Inconformado, o recorrente vem impugnar aquela sentença, concluindo nas respectivas alegações: "DE FACTO: 1ª - Em cumprimento do disposto nos artigos 511°, n°1, 515° e 546° do CPC, 366°, 368°, 371°, 376°, 377° e 378° do CCivil, e 50° da LPTA, além dos factos dados por provados na sentença acima reproduzidos em 33, devem ser aditados os também acima reproduzidos em 34.
V - A entender-se que alguns daqueles factos são controversos, porque são relevantes para a decisão, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito (referido art° 511° do CPC), deverá o processo baixar para a necessária instrução.
DE DIREITO, considerando aquela matéria de facto: INADEQUADA INVOCAÇÃO DO DISPOSTO NA ALÍNEA
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DO ARTIGO 63°, N° 1, DO DL 445/91 E DO ARTIGO 32° DO REGULAMENTO DO PLANO DIRECTOR MUNICIPAL 3ª - Nos termos do artigo 63° n°1 do RJLMOP, o pedido de licenciamento é indeferido - com base na desconformidade com alvará de loteamento ou com instrumento de planeamento territorial, válidos nos termos da lei (alínea a).
Por sua vez, o artigo 32° do RPDM de Barcelos - cuja ratificação é referida em 34.7 supra - integra a secção III do capítulo II - dedicada aos Espaços Industriais - prescreve imposições de adequabilidade funcional e morfológica ao local por parte de qualquer "plano de pormenor", "loteamento" ou "actividade", exigindo que assegurem a integração e protecção paisagística no local - ver seu n°1 alínea c).
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- como se vê do projecto junto ao PA e resulta do facto condensado em 34.5 - através de documento junto pela entidade recorrida -, parte da construção do edifício já se encontra licenciada no Procº 1.263/84 e a maior parte do edifício projectado não respeita a uma ampliação a que procedeu, mas a ampliação a construir.
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- O artigo 32°, n°1, c) do RPDM de Barcelos dispõe quanto à integração urbanística dos planos, dos loteamentos e das actividades, não pretendendo tal norma substituir-se ao art° 63º-1.d) do DL 445/91 (ou duplicar inutilmente este normativo) no que respeita à integração urbanística das construções.
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- Na fase de apreciação do projecto de arquitectura o que está em causa é a configuração e a integração física de uma construção, independentemente da actividade que aí possa vir a exercer-se.
E a razão pela qual o despacho impugnado sustenta a violação do referido artigo 32° do RPDM (o facto de o projecto prever a manutenção da construção existente e, em parte, licenciada, em empena cega sobre a estrema do terreno a Sul), seria igualmente válida qualquer que fosse a afectação industrial da construção, ou mesmo que fosse para simples armazém ou, até, habitação.
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- A previsão útil e única do art° 32° do RPDM tem a ver com a possível instalação de indústrias enquanto não pressupõem a construção de edifícios ou se aprecia o seu grau de risco Poluente.
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- Para a indústria a instalar na construção em apreço ia havia sido passada Certidão de Localização Industrial pela CCRN. bem como o competente Licenciamento Industrial, pelo Ministério da Economia, nos termos previstos no DL 109/91, de 15/3, e art°s 4° e 6° e ss. do anexo ao Dec. Regul. 25/93, de 17/8, após o necessário parecer favorável do Ministério do Ambiente e o parecer da Câmara Municipal Por isso que a integração da actividade ia fora objecto de apreciação e licenciamento, que, obviamente, não violaram o PDM.
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- Não se verifica, portanto, o pressuposto de direito do indeferimento previsto na al. a), n°1. do art° 63° do DL 445/91 - que a sentença ora recorrida, por isso, violou.
DESCABIDA APLICAÇÃO DA ALÍNEA d) DO Nº1 DO ART° 63° DO DL 445/91, DE 20/11, E SUA APLICAÇÃO CONFORME COM A CONSTITUIÇÃO: 10ª - Nos termos do artigo 63°, n°1, al d) do RJLMOP, (que já só vigora para os casos pendentes à data da entrada em vigor do DL 555/99) o pedido de licenciamento é indeferido se a obra for "susceptível de manifestamente afectar a estética das povoações, a sua adequada inserção no ambiente urbano ou a beleza das paisagens, designadamente em resultado da desconformidade com a cérceas dominantes, a volumetria das edificações e outras prescrições expressamente previstas em regulamento.
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- Conforme a sentença aceitou a circunstância única que suporta o acto administrativo de indeferimento é o afastamento (a falta ou insuficiência deste} à estrema do terreno do requerente do licenciamento - o ora recorrente.
De facto, como se vê na matéria provada em 33.6, 33.7, 33.12, 34.2, 34.3, condição do deferimento do projecto seria a apresentação de aditamento que cumprisse o desencosto da estrema, nos termos previstos no desenho esboçado que integra a informação de fls, 54-verso.
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- Quando indefere um projecto em aplicação do com fundamento no disposto na al. d) do n°1, do art° 63°, do DL 445/91, a Administração não exerce um poder discricionário, mas vinculado a tais normativos, ainda que vagos e indeterminados, sendo facultado a quem recorre do acto de indeferimento demonstrar que as previsões do projecto eram, afinal, conformes com a lei e não violadoras do dito art° 63°-1.d), para o que deverá demonstrar erro grosseiro no preenchimento daqueles conceitos ou utilização de critério claramente desadequado.
Em tal sentido Ac.s deste STA de 26-03-2003, em Cad. Just. Administrativa, nº 5/6-2003, de 11-05-1999, em dgsi.pt, nº convencional JSTA00051710, 10-12-1998, em dgsi.pt, nº convencional JSTA00050680.
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- Os casos conhecidos de apreciação judicial da aplicação daquele normativo do art° 63°-1 .d) respeitam à apreciação de cérceas de edifícios a construir ou legalizar, relacionada com a cércea dominante da envolvente.
Segundo o sentido e do senso comuns, a estética das povoações, a inserção no ambiente urbano e a beleza das paisagens (em função do edificado) são conceitos cuja definição ou preenchimento respeita ao relacionamento entre edifícios ou entre estes, os acidentes físicos naturais e a paisagem envolvente.
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- As distâncias ou os afastamentos das construções (ainda hoje regulados no RGEU, nos artigos 58° e seguintes) apenas preocupam o direito urbanístico quando relacionados com outros edifícios construídos, projectados ou previstos (caso, por exemplo, da regulamentação dos afastamentos em loteamentos) e não em relação às estremas dos terrenos - que estas outras questões não têm a ver com o interesse público da estética das povoações, da inserção no ambiente urbano e da beleza das paisagens, antes respeitam às relações de vizinhança, que não importam à Administração Pública.
Por isso que, a partir do acórdão de 11/12/64, em Ac. Doutrinais, n° 40, ANOIV, PAG. 458, se firmou o entendimento de que "as relações jurídicas de vizinhança...quanto a terceiros confinantes não podem ser discutidas no contencioso administrativo." 15° - Resulta, pois, que, no presente caso, ao enquadrar naqueles conceitos legais da estética das povoações, da inserção no ambiente urbano e da beleza das paisagens, a circunstância de uma parte da construção se encontrar implantada sobre a estrema do terreno - que é o fundamento do indeferimento decidido no acto recorrido (conclusão 11ª), constitui, ao mesmo tempo, erro grosseiro sobre os pressupostos de direito e uso de critério claramente inadequado.
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- Um outro requisito do art° 63°-1.d) que não se vê, no caso, preenchido é o de a circunstância de uma parte da construção se encontrar implantada sobre a estrema do terreno "manifestamente" afectar a estética da povoação, a inserção no ambiente urbano, ou a beleza da paisagem, até porque o terreno por esse lado confinante encontra-se no mesmo plano, mantém-se desocupado e está destinado face ao PDM, ao mesmo tipo de ocupação - matéria provada supra 34.7. 34.13 e 34.14. Aquela afectação "manifesta", que a norma exige (supra 10), manifestamente não é afectada pela distância da construção à estrema do terreno.
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- Por outro lado, a exigência de afastamento das construções relativamente às estremas dos prédios que lhes servem de implantação não consta prescrita em qualquer regulamento aplicável em vigor no Município de Barcelos, pelo que o acto administrativo impugnado viola o disposto na al. d) do referido art° 63°.
É que, para além da volumetria e da cércea determinantes da estética, do ambiente urbano e da paisagem, a al. d) do referido art° 63° exige que a invocação de outros parâmetros seja suportada por prescrição expressa em regulamento.
Na verdade, deve entender-se que o legislador foi rigoroso no uso e na escolha das palavras (artº. n.º 3, do CCivil). ORA A utilização do termo "designadamente", que se associa a uma enumeração taxativa, em vez do termo "nomeadamente", de sentido exemplificativo, na enumeração dos parâmetros (volumetria, cércea e prescrições regulamentares) admissíveis como condicionantes da estética, do ambiente urbano e da paisagem, mostra que o legislador quis ser taxativo.
E, para além do argumento semântico, aponta no mesmo sentido o da lógica do emprego da expressão "e outras prescrições expressamente previstas em regulamento", que não teria qualquer significado útil se, afinal, se entendesse que a Administração, no preenchimento dos conteúdos determinantes da estética, do ambiente urbano e da paisagem poderia criar, casuisticamente, as prescrições que entendesse - então, teria ficado pela expressão: "e outras." Em conclusão, a sentença violou o disposto no referido art° 63°, n°1,d) e no art° 9°, n°3, do CCivil.
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- Ainda que lhe fosse atribuída a...
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