Acórdão nº 0353/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 27 de Setembro de 2005

Data27 Setembro 2005
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: A..., solteiro, ladrilhador, residente na Rua ..., nº..., ..., ..., ... Loures intentou contra a Câmara Municipal de Lisboa, uma acção de indemnização baseada em responsabilidade civil extracontratual, pedindo que esta fosse condenada a pagar-lhe a quantia de 7 350 000$00.

Por sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa de 20/9/2002 (fls.139 a 151) foi tal acção julgada parcialmente procedente e a ré CML condenada a pagar ao autor a quantia de 750 euros.

Desta sentença interpôs a CML recurso jurisdicional, formulando nas suas alegações as seguintes conclusões: "1ª- Atentos os factos provados, ao despejar e demolir a barraca do A., a Ré praticou um acto lícito, ao qual se aplica o artº9º do DL. nº48 051, de 21/11/1967, bem como as regras e princípios gerais da responsabilidade civil, concretamente o instituto da culpa do lesado; 2ª- Consequentemente, se alguns objectos, sem valor, foram danificados ao serem retirados da barraca, tal deve-se à conduta do A., que não os removeu atempadamente mesmo após ter sido por diversas vezes notificado do despejo. Tais danos não constituem prejuízos especiais e anormais, nos termos e para os efeitos do citado artº9º do DL. nº48 051. Com efeito, o fundamento e critério de imputação da responsabilidade da Administração Pública por actos lícitos praticados no domínio da gestão pública é o princípio da igualdade dos cidadãos perante os encargos públicos. À luz do qual não se justifica que a colectividade assuma os alegados danos a objectos sem valor que o A. não retirou da barraca, onde não residia. Os danos em causa são riscos próprios da não acatação de um despejo validamente determinado pela entidade competente, resultando, em geral, para todos aqueles que assim actuam".

Também o então autor e ora recorrente interpôs recurso jurisdicional de tal sentença acabando as suas alegações com as seguintes conclusões: "a) - O Tribunal «a quo» não tomou na devida conta os factos acima articulados na petição inicial, apenas dando por provada parte da acção, ignorando, pura e simplesmente, a restante matéria articulada; b) - Não se pronunciando, efectivamente, sobre as questões que deveria apreciar, nomeadamente, as despesas tidas a com remodelação da barraca, bem como a indemnização que a entidade recorrida estava obrigada a pagar ao recorrente, em homenagem ao direito de igualdade e de oportunidade, ao indemnizar os proprietários de outras barracas que se encontravam nas mesmas condições que o recorrente, violando claramente a norma constitucional que proíbe a violação do princípio da igualdade; c) - O recorrente alegou e provou com os documentos que a demolição da sua habitação lhe causou danos irreparáveis, pelo que, deve ser ressarcido dos respectivos prejuízos causados com a destruição do seu bem essencial, como uma casa para morar; d) - Verificando-se, assim, no presente caso, todos os pressupostos legais exigidos para a efectivação da responsabilidade civil extracontratual da entidade recorrida, por facto ilícito, ao destruir um bem próprio do recorrente, na forma activa, culpa, prejuízo e nexo de causalidade; e) - Trata-se de culpa concreta e objectiva que o Tribunal «a quo» não apreciou à luz de presunção legal, nos termos dos arts. , e do DL. nº48 051, de 21/11/1967, conjugados com o nº1 do artº487º do Código Civil; f) - Tem-se, portanto, o acto ilícito da entidade recorrida, o qual constitui uma fonte de responsabilidade civil extracontratual e gera obrigação de indemnizar ao abrigo das disposições supra mencionadas, as quais não foram tidas em conta pelo Tribunal «a quo»; g) - Com efeito, nos termos da al.d) do nº1 do artº668º do CPC, «quando o juiz deixa de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar» a sentença é nula; h) - O conhecimento de tais factos é essencial à decisão do mérito; i) - A sua omissão constitui nulidade da sentença, nos termos do artº668º nº1 al.d) do CPC; j) - De facto, tais fundamentos de facto e de direito eram decisivos para o julgamento requerido ao Tribunal «a quo» e, consequentemente, a decisão do Mmo. Juiz seria outra".

Emitiu douto parecer o Exmo. Magistrado do Ministério Público, com o seguinte teor: "Os recursos jurisdicionais vêm interpostos de sentença do T.A.C. de Lisboa que julgou parcialmente procedente, por provada, acção emergente de responsabilidade civil intentada contra a Câmara Municipal de Lisboa, condenando-a, em consequência, a pagar ao Autor a importância de 750 Euros, a título indemnizatório por danos patrimoniais causados em bens móveis e ocorridos no decurso da remoção e transporte do recheio de mia barraca que fora objecto de demolição.

Tendo feita correcta interpretação e aplicação do direito, em face do quadro factual dado por assente, não se me afigura que a sentença mereça censura.

No que tange ao recurso interposto pelo recorrente, o seu inconformismo radica-se na improcedência do pedido indemnizatório relativo ao despejo coercivo e sequente demolição da barraca em que em tempos residira.

A esse respeito, todavia, bem se andou na sentença ao concluir pela inexistência do direito ao pertinente ressarcimento como decorrência da circunstância da barraca ser clandestina, bem como á luz do regime estabelecido no DL. nº163/93 tão pouco esse direito lhe assistia, uma vez que resultou provado que desde 1.998 o recorrente já não residiria nesse barraco.

Por outra parte, o recorrente não logrou demonstrar as nulidades de que arguíra a sentença, apresentando-se manifesto que a mesma se pronunciou sobre todas as questões que importava conhecer, a respeito do que produziu a correspondente fundamentação de facto e de direito.

À recorrente Câmara Municipal de Lisboa, por sua vez, também nenhuma razão lhe assiste, desde logo porque alicerça a sua alegação de recurso no entendimento de ter sido condenada com fundamento em facto lícito.

Ora, o certo é que a conduta culposa causadora dos danos no recheio da barraca reveste a natureza de acto ilícito e não de acto lícito, por exorbitar dos estritos limites da acção necessária à respectiva remoção legítima, traduzindo...

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