Acórdão nº 0876/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Julho de 2005

Magistrado ResponsávelPIRES ESTEVES
Data da Resolução12 de Julho de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: A..., solteiro, licenciado em gestão e administração pública, residente na ..., ...Coimbra, interpôs recurso contencioso da deliberação de 2001/08/01 da Comissão de Inscrição da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, que lhe indeferiu o seu pedido de inscrição por não reunir as condições gerais de inscrição e/ou não possuir as habilitações exigidas no Estatuto da Profissão, por estar inquinada com vários vícios.

Por sentença do Tribunal Administrativo de Circulo de Coimbra de 2002/09/25 (fls. 145 a 152) foi negado provimento ao recurso contencioso.

Não concordando com tal decisão, da mesma interpôs o recorrente o presente recurso jurisdicional, em cujas alegações formula as seguintes conclusões: "I - A decisão recorrida não decidiu sobre a questão do indeferimento preventivo alegado pela recorrente; II - A decisão recorrida omitiu pronúncia quanto a matéria essencial - o indeferimento antecipado dos candidatos não detentores de licenciatura acreditada, porquanto o reconhecimento da licenciatura preexiste ao acto de candidatura; III - A decisão recorrida não resolveu a questão quanto à ilicitude da exclusão. Na verdade, uma coisa é a inadequação da licenciatura, outra o não reconhecimento dessa mesma licenciatura, tanto mais que não existe licenciatura específica para aquela concreta actividade; IV - E mal andou a sentença recorrida ao socorrer-se, analogicamente, do acesso à profissão de advogado e médico, pois que em nenhuma destas se exclui, ab initio, por exemplo, a licenciatura na Faculdade de Direito da Universidade Internacional da Figueira da Foz, ou da Universidade Moderna ou da Universidade Independente ou qualquer outra entretanto surgida, sendo que todas as licenciaturas se consideram aptas à inscrição na Ordem, impondo-se, para o exercício da profissão de advogado, a realização dum estágio e dum exame de agregação que o considere apto ao exercício da advocacia; V - A tese defendida pelo recorrente vem aliás confirmada no acórdão do STA supracitado (Ac. de 26/6/1997, in AD. 440/441, págs. 1034 ss), sendo obviamente legítimo e exigível, a par da licenciatura, ou seja, a par da habilitação académica, uma habilitação profissional antecedente à inscrição na Ordem; VI - O que num tal aresto não vem defendido é que a inscrição está dependente da obtenção de uma licenciatura em estabelecimento acreditado pela Ordem, sendo claro o requisito habilitacional mesmo para o cidadão comunitário - cfr. Ac. cit., págs. 1048/1049; VII - Em consonância com o que além se defende disse o recorrente que uma coisa é a eliminação do acesso que aquele indeferimento antecipado configura, outra bem diferente é a declaração de inadequação ao exercício da profissão após um estágio profissional; VIII - A subtileza da decisão na apreciação dos invocados vícios corresponde à denominada insuficiência de fundamentação; IX - Era exigível a justificação da não violação do princípio da igualdade que se diz respeitado, de forma a captar-se o fundamento do arbítrio; X - Não pode por isso deixar de citar-se aquele douto acórdão: «o direito ao título académico surge com a conclusão do curso respectivo e a atribuição do diploma e não depende de qualquer outro factor, sendo um verdadeiro direito potestativo, oponível a todos e sem poder ser limitado por condicionantes de espécie alguma…" XI - E porque tal vai permitido; nesta sede, recupera-se, por interesse à decisão a matéria de facto não controvertida: a) O recorrente é licenciado em Gestão e Administração Pública pelo Instituto Superior Bissaya Barreto, estabelecimento de ensino superior reconhecido pela Portaria n°10/93, de 6/1, tendo sido autorizado, nos termos constantes da Portaria n°205/95, de 21/3, a ministrar o curso de Gestão e Administração Pública, de acordo com plano de estudos à mesma Portaria, sendo aos respectivos diplomas reconhecido o grau de licenciatura, alterado pela Portaria n° 813/99, de 21/9; b) A inscrição como técnico oficial de contas encontra-se regulada no Estatuto da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, aprovado pelo DL. n° 452/99, de 5/11; c) Em 28/6/2001 o recorrente formalizou perante o Senhor Presidente da Comissão de inscrição da Câmara o pedido de inscrição na Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas; d) Em 24/7/2001 o recorrente foi notificado do indeferimento do pedido de inscrição por não reunir as condições gerais de inscrição e/ou não possuir as habilitações exigidas no Estatuto da Profissão (deliberação da Comissão de Inscrição de 19/7/2001); e) Desconhecendo a fundamentação do notificado indeferimento requereu certidão com o conteúdo integral da decisão, dos respectivos fundamentos de facto e de direito, concretizando quais as concretas condições por ele não cumpridas e quais as habilitações exigidas por ele não possuídas; f) O Senhor Presidente da Comissão em exercício por oficio de 2001.08.01 notificou o recorrente da motivação da rejeição da inscrição, justificando que nos termos do disposto no artº l6º nºs 1 e 2, só a licenciatura ou bacharelato com prova de frequência, com a aproveitamento, de contabilidade analítica, fiscalidade portuguesa e contabilidade geral ministrados por estabelecimentos de ensino superior e reconhecidos pela Câmara, constituem habilitações académicas para a inscrição como Técnico Oficial de Contas. Atendendo a que o Curso de Gestão e Administração Pública não consta da lista de cursos reconhecidos, não faz sentido avançar para o disposto no n°2 do art. 16º do Estatuto, isto é, para a exigência da demonstração da frequência de determinadas disciplinas com aproveitamento. Não sendo titular de curso que lhe permita a inscrição é indiferente as disciplinas que frequentou, motivo pelo qual não pôde ser aceite»; g) O recorrente fez prova da licenciatura em Gestão e Administração Pública, do curso de pós-graduação de Gestão de Empresas, do Instituto Superior Bissaya Barreto, do Curso «Plano Oficial de Contabilidade das Autarquias Locais - POCAL» e do Curso Prático de Contabilidade e Análise de Balanços;.

XII - Do vício de violação de lei: a Comissão de Inscrição recusou o pedido do recorrente sem que o apreciasse nos termos das normas aplicáveis - artº 16° do Estatuto; XIII - A Comissão de Inscrição não informou a lista de cursos reconhecidos, sendo que a recusa se limita à simples constatação da não «acreditação» do curso devidamente homologado pelo Ministério da Educação, nem se pronunciou nos termos dos nºs 2 e 3 do art° 16º do ECTOC, do que decorre vício de forma por preterição de formalidade essencial; XIV - Falta de fundamentação: a fundamentação exigível pelo legislador para um acto postergante de direitos há-de obedecer, no mínimo, aos critérios estabelecidos na letra da lei (critérios objectivos fundamentados nos currículos, na carga horária, nos meios de ensino e nos métodos de avaliação); Há-de conhecer-se, no acto que impõe um prejuízo ao administrado o seu quid, a ratio decidendi.

Mais, há-de considerar-se, contrariamente ao que vem sendo assumido pela autoridade recorrida, que o acto de recusa de inscrição não é um acto de conteúdo negativo, porquanto a recusa no acesso à profissão de TOC a quem frequentou um curso superior que à data da sua aprovação era adequado ao exercício da mesma, configura uma verdadeira derrogação de direito formado na esfera jurídica de qualquer estudante de um curso superior daquela área científica ministrado por estabelecimento de ensino superior XV - O acto de reconhecimento não é um mero acto pró-forma inconsequente, sendo antes o momento essencial e garante de salvaguarda do direito de inscrição dos candidatos, sendo, consequentemente, exigível porque legalmente definida, a fundamentação do reconhecimento segundo critérios objectivos, nos termos do citado normativo, o que não foi cumprido pela Comissão no acto de recusa de inscrição do recorrente, consubstanciando o vício de falta de fundamentação legal; XVI - É pacífico o entendimento da Doutrina e da Jurisprudência acerca da fundamentação dos actos administrativos, exigindo que estes revelem o motivo pelo qual a Administração resolveu (deliberou) em determinado sentido e não noutro; XVII - A Comissão de Inscrição não esclareceu porque razão deliberou como deliberou, omitindo, em absoluto, a exigência contida no nº 3 do art. 16º do ECTOC; XVIII - O erro de direito: o interesse, público subjacente às normas em causa não é excludente, no reconhecimento de cursos da área científica sub judice, sendo antes exigente na formação especifica dos interlocutores privilegiados com a administração, de quem se exige formação académica e profissional adequada; XIX - Incorreu a Comissão de Inscrição em violação de lei; XX - Violação dos princípios da legalidade, da igualdade e da justiça: ao estabelecer a admissibilidade e a inadmissibilidade da inscrição com base em critério distinto que não aqueles a que alude o nº 3 do art. 16º do ECTOC a Comissão de Inscrição violou os princípios da legalidade - art.°3 do CPA - , da igualdade - art.° 5º do CPA - e da justiça - art.° 6º do CPA - , dos actos administrativos, XXI - Enfermando a deliberação de violação de lei; XXII - Desvio de poder: a actuação da Comissão de Inscrição, a arbitrariedade que utiliza na deliberação de inscrição ou recusa de inscrição, demonstra a intenção, corporativista, de favorecimento de determinadas licenciaturas em detrimento de outras, sendo certo que estas também foram, tal como as outras, reconhecidas pelo Ministério da Educação; XXIII - Em nenhuma outra associação pública que regulamente o exercício de uma profissão se consagrou um «direito público» de exclusão no reconhecimento de cursos ministrados por estabelecimentos de ensino superior. Por isso, o acto impugnado enferma de desvio de poder, violando, igualmente, o principio da. Imparcialidade - art° 6 do CPA; XXIV - O regime de excepção da Lei nº 27/98, de 3/6, deu mão aos do licenciados, licenciando a...

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