Acórdão nº 01954/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 29 de Junho de 2005

Magistrado ResponsávelPOLÍBIO HENRIQUES
Data da Resolução29 de Junho de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO 1.1. A... SA", com sede em Amôr, Leiria, vem intentar recurso contencioso de anulação do despacho de 30 de Setembro de 2002, do Senhor Secretário de Estado da Administração Educativa que negou provimento ao recurso hierárquico interposto do despacho de 29 de Abril de 2002, do Senhor Director Regional de Educação do Centro, que determinou, ao recorrente a reposição da quantia de € 558 893,80.

Na sua alegação final, formula as seguintes conclusões: I A interpretação adoptada pela Administração Educativa quanto à natureza e conteúdo dos Contratos de Associação não obedece à Lei; II A contrapartida contratual ou preço posto à disposição do "Colégio" para pagamento dos serviços de ensino por este prestados constitui uma verba global não sujeita a cabimento parcelar; III As escolas particulares em geral e o "A..." em particular não são chamados a participar na construção do preço que lhes é devido por força dos contratos de associação que celebram com as Direcções Regionais de Educação; IV O Estado (Administração Educativa) não tem cumprido com a obrigação legal de pagar às escolas particulares com contrato de associação um preço por aluno correspondente ao custo de manutenção e funcionamento por aluno das escolas públicas de nível e grau equivalente; V A Administração Educativa tem calculado a contrapartida contratual a pagar, com base num modelo estabelecido no Despacho nº 256-A/ME/96, que é ilegal e se afasta da execução devida à norma imperativa contida no art. 15º, nº 1 do Dec-Lei nº 553/80; VI Este Despacho, pela aplicação que lhe tem sido dada, não pode representar mais do que um instrumento interno e oficioso da Administração Educativa destinado a tentar uma aproximação ao cumprimento da contrapartida legalmente devida ao "A..."; VII As parcelas representativas dos parâmetros que servem de base ao cálculo do preço de acordo com tal Despacho, não têm efeitos externos, nem podem ser erigidas em rubricas orçamentais rigidamente cabimentadas.

VIII Por seu lado, o "A..." em momento algum se obrigou a dar um destino parcelar e cabimentado à verba global recebida; IX O "A..." cumpriu exemplarmente as suas obrigações de resultado, do ponto de vista pedagógico, tal como contratualmente definido.

X Ao "A..." em momento algum lhe foi solicitado que apresentasse os justificativos das despesas que teve de suportar para ministrar o ensino gratuito a 600 alunos em cada ano lectivo; XI Ao "A..." não foi solicitado pela Administração Educativa que apresentasse qualquer "orçamento de gestão para o ano seguinte"; XII Ao "A..." não foi solicitado pela Administração Educativa que periodicamente procedesse à apresentação de qualquer tipo de demonstração financeira; XIII Ao "A..." não foi solicitado pela Administração Educativa que apresentasse uma "conta de gestão com justificativos das despesas efectuadas"; XIV Ao "A..." não foi comunicado pela Administração Educativa qual o valor correspondente ao custo de manutenção e financiamento por aluno das escolas públicas de nível e grau equivalente aos do "A..." (como expressamente obriga o art. 15º do Dec-Lei nº 553/80); XV Não se encontra presentemente ainda apurado o valor que a Administração Educativa tem de pagar ao "A...", correspondente à diferença entre o que lhe era legalmente devido e aquilo que (por defeito) lhe atribuiu e disponibilizou; XVI Se se considerar que há necessidade de apurar as contas (deve e haver) entre o "A..." e a DREC, tal prestação de contas (em caso de conflito) deverá ser objecto de uma Acção Sobre Contratos; XVII O certo é que o "A..." não deve à Administração Educativa as verbas que esta unilateralmente lhe pretende exigir; XVIII O Contrato de Associação celebrado entre a Administração Educativa e o "A..., S.A" é um contrato Administrativo, legalmente consagrado, como tal, nos artºs 14º e 15º do Dec-Lei nº 553/80 de 21 de Novembro.

XIX É um Contrato Administrativo, com um regime materialmente administrativo; XX É um Contrato Administrativo também na acepção do Art. 9º do ETAF e do Art. 178º do CPA.

XXI É também um Contrato Bilateral Perfeito, XXII A Administração Educativa, que foi parte co-outorgante deste Contrato de Associação não pode, por mero acto administrativo, impor uma pretensa obrigação contratual fazendo prevalecer uma interpretação do contrato ou das suas cláusulas, agindo como juiz em causa própria, em desrespeito pelo objecto do contrato e do seu equilíbrio financeiro.

XXIII Fazendo-o, com fez, no caso "sub judice", incorre no vício de usurpação de poderes.

XXIV No caso vertente, a Administração Educativa não dispunha de poderes de auto-tutela administrativa que lhe permitissem declarar, como força executiva, uma situação de incumprimento contratual, por parte da contratante "A...", E, pois, XXV Não podia a Administração Educativa decidir e exigir mediante acto administrativo as prestações ou restituições contratuais pretensamente em falta.

XXVI A pretendida execução forçada de uma prestação contratual como aquela que é imputada à recorrente "A...", só pode ser obtida pela Administração Educativa, através dos tribunais administrativos, no âmbito do nº 2 do art. 55º do ETAF e nas condições previstas no art. 187º do CPA.

XXVII O despacho de 30 de Setembro de 2002 do Senhor Secretário de Estado da Administração Educativa que impõe à "A..." o dever de restituir a importância de € 555 893,80, com recurso ilícito ao procedimento previsto no art. 55º do CPA, enferma de vício de usurpação de poderes e viola designadamente o disposto no art. 178º, 180º e 187º do CPA.

XXVIII Constituindo um acto meramente opinativo, na acepção do art. 186º do CPA.

XXIX. Pelo que, deve tal acto ser anulado.

Ainda sem prescindir, XXX Nos termos do inquérito que levou a efeito no "A...", em que apurou a obrigação de reposição de verbas, tendo levado essa conclusão ao relatório de 31 de Agosto de 2001, conferindo-lhe carácter definitivo e de "dado adquirido" e não, como se impunha, tratando-o como um relatório provisório, desrespeitando, por isso, o princípio da audiência prévia do interessado - art. 100º do CPA - a IGE violou o disposto neste normativo, pelo que ainda por mais esta razão, deve o despacho recorrido ser anulado.

Sem prescindir XXXI O acto administrativo praticado, tendente a impor uma determinada obrigação contratual com força executiva, assenta na consideração e aplicação de forma ilícita do Despacho do Ministro da Educação nº 256-A/ME/96, de 11 de Dezembro de 1996, que é ilegal e frontalmente inconstitucional, na medida em que desfigura os contratos de associação, fugindo à indicação do valor da contrapartida ("custo de manutenção e funcionamento por aluno das escolas públicas equivalentes") prevista na Lei Habilitante (art. 15º, nº 1 do Dec-Lei nº 553/80); instituindo um regime ilegal de fixação administrativa do preço; sujeitando a gestão económica-financeira e pedagógica das escolas particulares a uma "administrativização" que ofende a liberdade de ensino e afecta o conteúdo essencial da autonomia das escolas particulares e dos respectivos projectos educativos.

XXXII Pelo que, também por esta razão o despacho recorrido se não pode manter na ordem jurídica.

XXXIII Finalmente, mas não menos importante, o autor do acto recorrido não detinha competência para a sua prática, pelo que, também por esta razão, o despacho do senhor Secretário de Estado da Administração Educativa deve ser anulado.

XXXIV E isto, ainda que, em termos meramente académicos, se conceba que o Despacho de delegação de poderes nº 15468/2002, opera uma delegação genérica de competências.

XXXV Se assim se considerar, então o supra citado Despacho assume carácter ou natureza regulamentar ou normativa.

XXXVI E, deste modo, nos termos da alínea l) do nº 1 do art. 1º do Dec-Lei nº 3/83, de 11/1, deveria ter sido publicado na 1ª Série do Diário da República, sob pena de ineficácia jurídica.

XXXVII Ora, tendo o Despacho em referência sido publicado na 2ª Série do Diário da República e tendo o acto recorrido, sido praticado ao abrigo daquela delegação de poderes ineficaz, então, o autor do acto, por não ter competência para a sua prática, é relativamente incompetente.

XXXVIII Incompetência essa que afecta o acto recorrido em termos de o tornar anulável.

XXXIX Pelo que, também por esta razão o despacho recorrido não se pode manter na ordem jurídica." 1.2. Alegou a entidade recorrida propugnando pela legalidade do acto impugnado, dizendo, nas conclusões 1, 2 e 3, no essencial, que: - o acto impugnado foi praticado com precedência de audiência do interessado; - sendo que a autoridade recorrida ordenou a reposição de dinheiros públicos no exercício de uma competência que lhe é conferida por lei, com privilégio de execução prévia, portanto sem usurpação de poderes; - não devendo o Tribunal conhecer da alegada inconstitucionalidade por se tratar de arguição abstracta.

Conclui, ainda que:5º O que se defende na petição inicial não é, como agora em alegações finais, a total ineficácia desta delegação de poderes por não ter sido publicada na I Série do Diário da República, com a consequente incompetência do autor do acto recorrido para a prática do acto recorrido ou de qualquer outro acto produzido ao abrigo desta delegação.

  1. O que se defende na petição inicial é sim não estar delegada na entidade recorrida, através do Despacho nº 15 468/02, de 18.06 - que encerra uma acto de delegação formalmente lícito, assim se expressa a recorrente - a competência para a prática deste concreto acto recorrido.

  2. Ou seja, não ter sido delegada a competência para interferir num contrato administrativo e associação e ditar o que deve ser pago ou o que deve ser restituído, nas palavras do recorrente.

  3. Mas apenas terem sido delegadas as competências para a entidade recorrida se substituir ao Ministro da Educação em assuntos respeitantes às Direcções Regionais de Educação nas matérias apontadas no...

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