Acórdão nº 0855/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Maio de 2005

Data25 Maio 2005
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo.

1.1.... e ..., em representação do seu filho menor ..., intentaram, no T.A.C. do Porto, acção declarativa de condenação contra o Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia e o médico A..., a prestar serviço naquele Centro Hospitalar, com fundamento na actuação ilícita e culposa daquele médico, pedindo a condenação solidária dos mesmos no pagamento do montante indemnizatório global de 10.068.064$00, acrescido de juros de mora à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.

1.2.Foi admitida a intervenção acessória do ..., que fez sua a contestação apresentada pelo Réu A..., seu segurado.

1.3.Tendo atingido a maioridade no decurso da acção, o ... veio juntar procuração forense e ratificar o anteriormente processo. Por despacho de fls. 121 foi considerado regularizada a representação judiciária do Autor 1.4.Por sentença daquele T.A.C., proferida a fls. 339 e segs, foi julgada "parcialmente provada e procedente a acção, e: - condenados solidariamente os dois réus a pagar ao autor a quantia de vinte e cinco mil euros, acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos desde a data da sentença até efectivo pagamento.

- condenados solidariamente os dois réus a pagar ao autor a despesa tida com a segunda intervenção cirúrgica, a liquidar em execução de sentença, acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos desde a citação até efectivo pagamento .

3) Absolver ambos os réus do restante pedido.

1.5.Inconformado com a decisão referida em 1.3, interpôs o Réu A... recurso jurisdicional para este S.T.A., (ao qual aderiu a ..., nos termos do disposto no art.º 683.º do C.P.C. - fls. 382), o qual foi admitido por despacho de fls.386.

1.6.O Autor ... veio interpôr "recurso subordinado", mediante o requerimento de fls. 391, o qual foi também admitido pelo despacho de fls. 399.

1.7.O Recorrente A... apresentou as alegações de fls. 404 e segs, as quais concluiu do seguinte modo: "PRIMEIRA: - O autor intentou a presente acção contra o aqui recorrente e o Centro Hospital de Vila Nova de Gaia, imputando-lhes responsabilidade civil extra-contratual por acto de gestão pública, e alegou apenas factos tendentes a demonstrar que houve negligência na assistência médica que lhe foi prestada no Hospital.

SEGUNDA: - À acção proposta pelo autor são aplicáveis as normas do Dec.-Lei n.º 48.051 de 21 de Novembro de 1967.

TERCEIRA: - Dado que a causa de pedir assenta apenas em facto que tipificam a mera negligência no exercício das funções do réu Dr. A..., só o réu Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia é que terá que responder perante o autor pelos prejuízos decorrentes da conduta negligente que é apontada ao réu Dr. A....

QUARTA - Nestes termos, e conforme o disposto no n.º 1 do art.º 2° do Dec. - Lei 48051 de 21 de Novembro de 1967, o réu Dr. A... é parte ilegítima.

QUINTA - O médico, réu na presente acção, não tem qualquer interesse em contradizer (art.º 26° do Código de Processo Civil), na medida em não pode ser condenado pelos danos que o autor tenha sofrido, sendo da exclusiva responsabilidade do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia ressarcir o autor dos danos que sofreu.

SEXTA: - A ilegitimidade do réu Dr. A... é de conhecimento oficioso e o réu Dr. A... deve ser absolvido da instância.

SÉTIMA: - Em face dos factos dados como assentes nas alíneas C), D) e E), e dos factos dados como provados nos quesitos 7°., 42°. e 45°., verifica-se que há contradição nas respostas dadas aos quesitos 37°. e 39°..

OITAVA: - Estando considerado como assente o que consta no registo clínico da ficha do SU (alínea C) e ainda que ficou provado que. o testículo sobe quando há torção e que esta provoca dores violentas, não é possível dar como provado que a torção testicular já existia - ou tinha existido - aquando do exame ao autor pelo Dr. A....

NONA: - O autor quando foi examinado pelo Dr. A... apresentava: - edema no testículo esquerdo, sem alterações do cordão, sem sinal de elevador. Temperatura de 37,6°C (alínea C)). Quer isto dizer que o testículo não subiu, nem o cordão apresentava qualquer sinal de torção.

DÉCIMA: - Também não é possível dar como provada a existência da torção quando o Dr. A... examinou doente, dado que se considera que o autor não tinha dores intensas e agudas (resposta ao quesito 7º.).

DÉCIMA PRIMEIRA: - A torção testicular impede a irrigação sanguínea do respectivo testículo, provocando necrose (alínea D)) pelo que sendo diagnosticada a torção testicular, é imperativo o tratamento cirúrgico logo nas primeiras 6 a 8 horas (alínea E)), o que não conjuga com o resultado da primeira intervenção cirúrgica, em que foi conservado o testículo, e consequentemente afasta a hipótese de o autor apresentar uma torção testicular quando foi examinado pelo Dr. A....

DÉCIMA SEGUNDA: - A sintomatologia descrita na própria decisão fls. 358 não se enquadra no quadro clínico do autor quando foi examinado pelo Dr. A....

DECIMA TERCEIRA: - Com a resposta dada ao quesito 39 não se pode responsabilizar o Dr. A..., já que refere que a torção testicular existia ou tinha existido aquando do exame do autor por aquele médico. Quer isto dizer, que aquando deste exame não se sabe se existia ou não a torção testicular, logo não era exigível ao Dr. A... efectuar o diagnóstico de algo que não existia.

DÉCIMA QUARTA: - Por outro lado, foi considerado não provada a matéria de facto constantes dos quesitos 37°. e 38°., quando tal matéria em face do que aqui se tem referido deveria ter sido dada como provada.

DÉCIMA QUINTA: - O autor alegou apenas factos tendentes a demonstrar que houve negligência na assistência médica que lhe foi prestada no Hospital, pelo que a responsabilidade no pagamento de qualquer indemnização só pode ser atribuída ao réu Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia.

DÉCIMA SEXTA: - O próprio Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia no processo de averiguações que realizou veio a aceitar a conclusão do relatório do instrutor de arquivamento do processo por falta de prova indiciária suficiente de uma infracção disciplinar. Em face desta decisão não pode também o réu Dr. A..., ser condenado no pagamento da indemnização dos presentes autos.

DÉCIMA SÉTIMA: - Dos factos provados não resulta que no momento em que o Dr. A... examinou o autor este apresentava torção testicular, já que não era exigível o diagnóstico de uma torção que não existia quando o examinou.

DÉCIMA OITAVA: - Quer o exame, quer as intervenções cirúrgicas não foram realizados na sequência da actuação do Dr. A... mas sim em virtude da evolução do estado de saúde do autor.

DÉCIMA NONA: - O autor optou por realizar os tratamentos fora do Serviço Nacional de Saúde, pelo que o pagamento daquelas quantias não pode ser considerado da responsabilidade do Dr. A....

VIGÉSIMA: - O montante atribuído pelos danos não patrimoniais é excessivo e sem fundamentação para tal.

VIGÉSIMA PRIMEIRA: - A amputação do testículo não é limitadora ou incapacitante, Nem sequer é visível.

VIGÉSIMA SEGUNDA: - as dores emergentes das intervenções não são da responsabilidade do Dr. A... mas sim da evolução do estado de saúde do autor.

VIGÉSIMA TERCEIRA: - A douta sentença sob recurso violou as -normas legais citadas no corpo das alegações, designadamente: - artºs. 26°., 495°. do Código de Processo Civil.

- art°s. 2° e 3°. do Decreto-Lei n°. 48.051, de 21 de Novembro de 1967." 1.8.O Autor ... apresentou as alegações de fls. 417 e segs. formulando as conclusões seguintes: "1 - Na douta sentença em crise, deu-se como provado - (ponto 32) "O ... tinha perfeito conhecimento do que lhe tinha acontecido, bem como das fracas possibilidades de recuperação do testículo - resposta ao quesito 28"; - (ponto 33) que "Com a primeira cirurgia, sofreu dores físicas e grande ansiedade pelo resultado - resposta ao quesito 29°; - (ponto 34) "Com a segunda cirurgia, sofreu dores físicas e perdeu qualquer esperança de conservar o testículo - resposta ao quesito 30º; - (ponto 35) "O ..., antes do ocorrido, era um rapaz sem defeitos físicos aparentes - resposta ao quesito 31°"; (ponto 36) "Frequentava as aulas de educação física - na escola - e jogava futebol - resposta ao quesito 32°"; - (ponto 37) "Depois do ocorrido, passou a ter vergonha de se despir na presença dos colegas de escola e de jogo -resposta ao quesito 33°"; - (ponto 38) "Pede constantemente aos pais para não comentarem a sua situação - resposta ao quesito 34°"; - (ponto 39) "E demonstra grande preocupação e ansiedade no tocante à sua vida sexual - resposta ao quesito 36°".

2 - Depois do sucedido - e estando provado que por mera negligência médica - o A., então com 16 anos de idade, fase da vida em que as dúvidas e insegurança já são naturalmente acentuadas, viu o seu corpo mutilado.

3 - Trata-se de um trauma que, com fortes probabilidades, o A. não conseguirá ultrapassar e, portanto, o acompanhará para toda a vida, afectando a sua vida sexual.

4 - Assim, entende-se não ser exagerada, mas antes...

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