Acórdão nº 0994/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Abril de 2005

Magistrado ResponsávelPOLÍBIO HENRIQUES
Data da Resolução19 de Abril de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO ..., casado, residente na ..., nº ... NISA, intentou, no Tribunal Administrativo do Círculo de Coimbra, recurso contencioso de anulação do despacho do Vogal do Conselho Directivo do INGA - Instituto Nacional de Intervenção e Garantia Agrícola, de 16 de Outubro de 2002, pelo qual foi tomada a decisão final de não atribuir ao requerente a indemnização compensatória para a campanha de 2001, prevista no Regulamento da Aplicação da Intervenção Indemnizações Compensatórias anexo à Portaria nº 46/2001, de 25 de Janeiro.

Por sentença de 14 de Abril de 2004, o Tribunal Administrativo do Círculo concedeu provimento ao recurso, julgando o acto viciado por erro nos pressupostos de facto. 1.1.Inconformado, o Vogal do Conselho Directivo do INGA, recorre dessa decisão para este Supremo Tribunal apresentando alegações com as seguintes conclusões: A)O ora Recorrido, detentor de uma exploração agrícola em Nisa, candidatou-se por requerimento recebido pela Associação dos Agricultores do Distrito de Portalegre e datado de 2 de Março de 2001, à atribuição de apoios denominados intervenção "Indemnizações Compensatórias do Plano de Desenvolvimento Regional" referente à Campanha de 2001 (nº 1 da factualidade apurada na sentença recorrida); B)Em 13 de Abril de 1993, o ora Recorrido entregou formulário de identificação do agricultor, para efeito de atribuição de ajudas, onde indicava residir em Nisa (nº 2 da factualidade apurada na sentença); C)Em 21 de Fevereiro de 1996, o mesmo candidato entregou formulário de identificação, com a alteração da residência para Portalegre (a nºs 3 da factualidade apurada na sentença sob recurso); D)Até 2000, apesar de o beneficiário ter - desde 1996 - como residência a morada de Portalegre, a ajuda denominada "indemnizações compensatórias" foi-lhe concedida, porquanto, nos termos do regulamento vigente à data dos factos, ou seja, a Portaria nº 195/98, de 24 de Março, a ajuda era atribuída aos "agricultores a título principal que residam, ou tenham a sua sede, em região desfavorecida e explorem, pelo menos, 2ha de superfície agrícola útil".

E)Requisitos que o ora Recorrido reunia, e que lhe permitiram ter direito à ajuda mencionada até 2000.

F)Em 25 de Janeiro de 2001 é publicada a Portaria nº 46-A/2001, de 25 de Janeiro, que aprova o Regulamento de Aplicação da Intervenção Indemnizações Compensatórias do Programa de Desenvolvimento Rural (RURIS), publicado em anexo à mencionada Portaria, que revoga, expressamente, no seu artigo 3º, a secção II do capítulo V da Portaria nº 195/98, de 24 de Março, que regulou as indemnizações compensatórias concedidas até 2000 e introduz um requisito adicional nas condições de acesso aos agricultores que residem ou tenham a sua sede em zona desfavorecida, acrescentando "e no concelho de exploração ou no concelho limítrofe".

G)O novo regime tem como objectivo confesso o de contribuir para a fixação de comunidades rurais viáveis, como decorre do Preâmbulo do Regulamento de 2001; H) No âmbito das suas competências de controlo - que compreende, entre outras acções, a verificação da existência e da manutenção das condições de acesso às ajudas - determinadas no nº 1 do artigo 13º do Decreto-Lei nº 8/2001, de 22 de Janeiro, com a redacção que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei nº 202/2001, de 13 de Julho, o INGA efectuou o controlo de primeiro nível da candidatura do Recorrido à intervenção "indemnizações compensatórias"; I) E constatou que o candidato não reunia as condições de atribuição da ajuda, porquanto, em 2001, residiu em Portalegre, que não é nem o concelho da exploração agrícola, nem concelho limítrofe; J) Assim, em 14 de Fevereiro de 2002, o Recorrente notificou o candidato da intenção de indeferimento da sua candidatura e convidou-o a pronunciar-se em sede de audiência prévia (nº 7 da factualidade apurada na sentença recorrida); K)Perante a mencionada notificação o ora Recorrido encetou duas diligências: (i) Em 13 de Março de 2002, entregou novo formulário de identificação do agricultor, alterando a sua residência para Nisa (nº 8 da factualidade apurada na sentença); (ii)Em 14 de Março de 2002, apresentou resposta, em sede de diligência prévia, afirmando que, em 2001, apesar de residir em Portalegre (onde a mulher trabalha, as duas filhas estudam e onde tem casa de morada), também residiu em Nisa, juntando, para o efeito, atestado de residência emitido pela Junta de freguesia de Espírito Santo (nºs 9 e 10 da factualidade apurada na sentença recorrida); L)O Recorrente, em 16 de Outubro de 2002, notificou o candidato da decisão final de indeferimento, por não considerar provada a alegada residência do Recorrido, em 2001, em Nisa (nº 11 da factualidade apurada na sentença sob recurso); M)Inconformado, o candidato interpôs recurso contencioso de anulação do acto de indeferimento, imputando ao acto vício de forma, vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto da decisão, ao dar como assente que o candidato não tinha, em 2001, residência em Nisa e vício de violação de lei por inconstitucionalidade da norma constante da alínea a) do nº 1 do artigo 4º do Regulamento anexo à Portaria nº 46-A/2001, de 25 de Janeiro; N)Em sede de recurso, o INGA alegou que o artigo 100º do CPA foi cumprido, o que o próprio Recorrido confessa ao transcrever parcialmente o teor do ofício nº INC 110/2002/38370, que lhe foi enviado em 14 de Fevereiro de 2002, para efeitos do exercício daquele direito, ao qual respondeu em Março de 2002, assim o exercendo (documentos juntos sob os nºs 1 e 2 à resposta à petição de recurso); O)Alegou ainda o INGA que não ocorre vício de forma por falta de fundamentação com violação do artigo 125º do CPA, uma vez que do acto sob recurso consta a respectiva fundamentação de facto e de direito e o Recorrente entendeu não só os motivos, elementos, como os fundamentos da decisão - tendo-os impugnado; P)Mais referiu o INGA não ocorrer qualquer "ausência manifesta de qualquer pronúncia sobre as duas razões apresentadas em fase de audiência", como alegado pelo então Recorrente, ora Recorrido, para fundamentar o alegado vício formal, como se apura da leitura do acto recorrido que expressamente se pronuncia sobre os argumentos alinhados pelo candidato em sede de audição prévia; Q)Não resultou provada dos autos a alegada residência em Nisa, facto que, pelo menos, seria muito fácil de provar, por exemplo pela junção de recibos de água, electricidade, telefone, contrato de compra e venda e/ou arrendamento de imóvel, pelo que vai, igualmente, inverificado o vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto, pois, em 2001, o Recorrente declarou ter domicílio em Portalegre e não provou ter o alegado domicílio em Nisa; R)Sustentou ainda o INGA que não se verificava o invocado vício de violação de lei por erro de direito, por alegada interpretação ilegal e inconstitucional (face aos artigos 3º e 266º nº 2 CRP) do teor da alínea a) do nº 1 do artigo 4º do Regulamento anexo à Portaria nº 46-A/2001, de 25 de Janeiro, uma vez que a nóvel interpretação da norma citada, denominada "dupla limitroficidade/interpretação lata e correctiva", aventada pelo Recorrente para fundamentar o alegado vício é manifestamente ilegal, carecendo, em absoluto, de qualquer correspondência com o espírito e/ou a letra da lei; S)Nos autos de recurso contencioso foi proferida sentença que considerou verificado o invocado vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos de facto e inverificados os demais vícios alegados pelo ora Recorrido; T)A sentença em apreciação julgou o recurso procedente e anulou o acto então recorrido, com o fundamento de que não aceitando (factualmente) para efeitos de atribuição das indemnizações compensatórias, a morada de Nisa, declarada pelo Recorrente em sede de audiência prévia e não admitindo a existência simultânea de dois domicílios, sendo certo que o Código Civil o permite e o Regulamento exige a simples residência do agricultor «no concelho de exploração ou em concelhos limítrofes», o acto impugnado é ilegal, por violação dos artigos 82º e 83º do Código Civil, bem como da alínea a) do nº 1 do artigo 4º do Regulamento anexo à Portaria nº 46-A/2001, de 25 de Janeiro; U)Inconformado com a sentença, o INGA interpôs o presente recurso jurisdicional, por entender que a mesma viola o artigo 669º, nº 3 do CPC ao presumir uma residência que não ficou provada nos autos, não constando da factualidade assente; V)A sentença sob recurso incorre ainda em erro de julgamento por violação de norma substantiva - artigo 9º do Código Civil - ao interpretar a alínea a) do nº 1 do artigo 4º do Regulamento anexo à Portaria nº 46-A/2001, de 25 de Janeiro, sem qualquer correspondência verbal na letra da norma; W)A sentença sob recurso incorre em erro de julgamento por violação de norma substantiva - artigo 4º nº 1 alínea a) do anexo à Portaria nº 46-A/2001, de 25 de Janeiro - ao sufragar que a multiplicidade de domicílios de um candidato permite a atribuição da ajuda "Indemnizações Compensatórias"; X)A Portaria nº 46-A/2001, de 25 de Janeiro estatui como objectivo, como se lê no § 2 do seu preâmbulo e na alínea a) do artigo 2º do Regulamento aprovado pela mesma Portaria, a fixação de comunidades rurais viáveis, ou seja o fim visado pela norma tem como contrapartida da percepção do subsídio a residência em zona desfavorecida; Y)Os critérios definidos nos artigos 82º e 83º do Código Civil, de aferição do domicílio das pessoas singulares, têm aplicação subsidiária, não podendo aplicar-se validamente a multiplicidade de domicílios aí consignada para todo e qualquer efeito; Z)In casu, os artigos mencionados têm de ser interpretados e aplicados em consonância com o bloco legal aplicável, ou seja, com o Regulamento anexo à Portaria nº 46-A/2001, de 25 de Janeiro; AA) Não se questionando que as pessoas singulares, em geral, possam ter vários domicílios, o que se...

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