Acórdão nº 01272/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 02 de Março de 2005

Magistrado ResponsávelJORGE DE SOUSA
Data da Resolução02 de Março de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1 - A..., C.R.L., interpôs no Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra recurso contencioso de anulação da deliberação da Câmara Municipal das Caldas da Rainha que revogou o deferimento tácito de um pedido de licenciamento que apresentara àquela Câmara para construção de um pavilhão, e indeferiu o respectivo projecto de arquitectura.

Aquele Tribunal entendeu que não ocorreu o deferimento tácito, declarou nula a deliberação impugnada na parte a ele respeitante e negou provimento ao recurso na parte da deliberação que indeferiu o projecto de arquitectura.

Inconformada, a Recorrente interpôs o presente recurso para este Supremo Tribunal Administrativo, apresentando alegações com as seguintes conclusões: 1ª Salvo o devido respeito, mal andou a, aliás, douta sentença sob recurso, ao declarar a nulidade do acto recorrido por falta de objecto, objecto esse que consiste no deferimento tácito do projecto de arquitectura apresentado à CMCR por parte da ora recorrente, e que se formou, conforme o exposto, por força do disposto nos artigos 35.º, 45.º, 47.º, e 61.º do Dec.-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro, com a redacção que lhe foi dada pelo Dec.-Lei n.º 250/94, de 15 de Outubro; 2ª Pelo que é manifesta a ilegalidade da, aliás, douta sentença recorrida, por violação dos referidos preceitos legais, devendo a mesma ser revogada, com as legais consequências; 3ª Na interpretação que lhes é dada pelo, aliás, douto aresto sob recurso, é evidente a inconstitucionalidade de que padecem os artigos 35.º, 45.º, 47.º, 52.º e 61.º do Dec.-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro, com a redacção que lhe foi dada pelo Dec.-Lei n.º 250/94, de 15 de Outubro, por violação dos princípios fundamentais por que imperativamente se pauta a actividade administrativa, nos termos dos artigos 2.º, 3.º e 266.º da Constituição da República Portuguesa, já que daqueles preceitos jamais é possível retirar da inércia da Administração a ausência do seu dever legal de decidir, e por violação do direito à tutela jurisdicional efectiva consagrado nos artigos 20º e 268º, também da Lei Fundamental; 4ª Mal andou a, aliás, douta sentença recorrida ao declarar a nulidade do acto recorrido por carência de objecto, uma vez que não só o mesmo tem existência jurídica, nos termos já expostos, como é perfeitamente válido, nos termos do artigo 141.º do CPA; 5ª Mal andou a, aliás, douta sentença sob recurso ao não anular o acto recorrido por vício de violação de lei, pois que, de acordo com o artigo 12º, n.º 1 do Código Civil, a lei só dispõe para o futuro, pelo que, as normas provisórias para as Caldas da Rainha jamais poderiam ser invocadas para fundamentar a revogação de acto de deferimento tácito produzido anteriormente à sua entrada em vigor; 6ª Do exposto resulta manifesto não existir qualquer violação por tal acto tácito do disposto nos artigos 52º e 63, n.º 1, alínea d) do DL 445/91; 7ª Pelo que, a, aliás, douta sentença recorrida é ilegal, por violação do artigo 140.º do CPA, devendo, consequentemente, ser revogada com as legais consequências; 8ª Mal andou, mais uma vez, a, aliás, douta sentença sob recurso, ao não considerar que acto administrativo recorrido enferma de vício de forma por falta de fundamentação dado que carece de uma capaz fundamentação de facto e de direito, não permitindo ao recorrente, e muito menos a um destinatário normal, conhecer o iter cognitivo e valorativo que presidiu à decisão aí alcançada, sendo, portanto, ilegal por violar o disposto nos artigos 124.º e ss. do CPA, e devendo ser revogada com as legais consequências; 9ª Mal andou a, aliás, douta sentença sob recurso ao não considerar, nos termos expostos, o vício de violação de lei de que padece a deliberação então recorrida, por violação do princípio da boa-fé contido no n.º 2 do artigo 266.º da CRP e nos n.ºs 1 e 2 do artigo 6.º-A do CPA, pelo que é a mesma ilegal devendo ser revogada com as legais consequências.

NESTES TERMOS, Deve o presente recurso jurisdicional ser julgado provado e procedente, revogando-se a, aliás, douta sentença recorrida, nos termos expostos e com as legais consequências.

A Câmara Municipal das Caldas da Rainha contra-alegou, defendendo a improcedência do recurso jurisdicional, não apresentando conclusões.

O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer nos seguintes termos: A principal questão que vem suscitada no presente recurso jurisdicional interposto de sentença do TAC de Coimbra, é a de saber se, no regime jurídico do licenciamento municipal de obras particulares, ocorre acto tácito de deferimento nos casos em que, por imposição legal, haja necessidade de consultar entidades estranhas ao município e este as não promova atempadamente.

Na sentença recorrida entendeu-se que no caso em apreço se não formou acto tácito de deferimento, porquanto, mau grado a inércia da Câmara Municipal na solicitação do parecer previsto no artigo 5º nº 1 do DL 61/90 de 15.02, o prazo previsto no artigo 47º nº 2 do DL 445/91 de 20.11 se conta a partir da data da recepção dos pareceres emitidos pelas entidades consultadas ou do termo do prazo da sua emissão, nos termos do nº 3 alínea c) do mesmo artigo.

Concordamos inteiramente com este entendimento.

De resto, esse é também o sentido de jurisprudência recente deste STA, que no acórdão proferido em 22.10.2002 no Rec. nº 47166 conclui expressamente que não ocorre a situação de deferimento tácito, no caso de haver lugar a consulta de entidades exteriores ao município, quando essa consulta não for desencadeada, quer pela câmara municipal quer pelo próprio interessado, nos termos previstos nos nºs 1 e 2 do artigo 61.º do mesmo diploma, pois que nas situações em que essas consultas são exigidas, só após o recebimento dos respectivos pareceres, autorizações ou aprovações, impende sobre a câmara o dever legal de decidir.

Improcedem assim, em nosso entender, as conclusões 1ª a 7ª das conclusões da alegação recorrente.

Igualmente no que respeita às demais questões suscitadas, levadas...

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