Acórdão nº 01585/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Março de 2005

Data01 Março 2005
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1. FUNDAMENTAÇÃO 1. 1. A..., com os devidos sinais nos autos, interpôs recurso contencioso do despacho do Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Cultura de 12/5/2003, que procedeu à homologação do Concurso de Apoios às Actividades Teatrais de Carácter Profissional e de Iniciativa Não Governamental para o ano de 2003, imputando-lhe vários vícios de violação de lei e de forma e o vício do desvio de poder.

A autoridade recorrida respondeu, tendo defendido a inverificação de todos os vícios arguidos e, em consequência, a improcedência do recurso contencioso (resposta de fls 63-74).

Foram indicados como interessados a quem o provimento do recurso podia directamente prejudicar as seguintes entidades: ...; ...; ...; ...; ...; ...; ...; ...;...; ...; ...; ...; ...; ...; ...; ...; ...; ...; ....

Devidamente citadas, nenhuma delas contestou o recurso.

  1. 2. O recorrente apresentou alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões: a) Tendo o júri acordado que os parâmetros definidos para o critério parcerias de produção e intercâmbio fossem "Co-produções e intercâmbios previstos e Co-produções e intercâmbios comprovados" e para o critério capacidade de angariação de outras fontes de financiamento ou outro tipo de apoio, nomeadamente com a participação das autarquias, Protocolos de financiamento previstos e comprovados, não nos parece razoável que tenha classificado positivamente candidaturas que não comprovavam adequadamente as suas intenções de co-produção ou nem apresentam protocolos ou contratos de financiamento.

    1. Por outro lado, o júri classifica negativamente a ora recorrente nesses critérios, quando a mesma explicitou que os projectos que apresentava a concurso e os compromissos de financiamento decorrentes eram sobejamente conhecidos do Instituto Português das Artes do Espectáculo, uma vez que resultavam de um projecto financiado pela Comissão Europeia no âmbito do programa Cultura 2000 e que decorria desde há dois anos, tendo sido objecto de informações regulares aos Serviços do Instituto Português das Artes do Espectáculo, pelo que se deviam tomar por devidamente comprovados.

    2. Em nossa opinião, o júri usou de diferentes critérios para avaliar negativamente a candidatura do recorrente no que respeita à apreciação das alíneas f) e g) dos critérios enunciados no número 1 do artigo 10.º do Regulamento constante do Anexo I à Portaria n.º 1056/2002, de 20 de Agosto. d) Julgamos, sempre com o devido respeito por outra opinião melhor, que o legislador teve em mente, ao enunciar o referido art. 10.°, parcerias de produção e intercâmbio efectivas, bem como efectiva "capacidade de angariação de outras fontes de financiamento ou outro tipo de apoio, nomeadamente com a participação das autarquias" e não meras intenções ou vagas promessas de algumas entidades que, sem as comprometer, dão a ideia de que tais parcerias poderão vir a acontecer no futuro, como o júri aceitou, e que o despacho ora recorrido homologou. Ao aceitar-se estas "promessas" de parcerias e intercâmbio, bem como "promessas" de angariação de outras fontes de financiamento" está a desvirtuar-se o concurso, já que assim bastou aos concorrentes solicitar a entidades cartas de possíveis intenções futuras, o que é muito diferente de apresentar parcerias, intercâmbios e fontes de financiamento reais e efectivas, que já estão a decorrer, como foi o caso do ora recorrente.

    3. Com esta actuação, o recorrido violou os princípios da igualdade, da proporcionalidade, da boa-fé e da transparência da actuação do júri, enfermando o acto de vicio de violação de lei.

    4. Por outro lado, só na terceira reunião - depois de ter tomado conhecimento das candidaturas -, é que o júri definiu os critérios de distribuição de verbas.

    5. O júri não justificou as percentagens propostas, nem tão-pouco os escalões progressivamente decrescentes, pelo que se torna difícil apurar a razoabilidade dos resultados assim obtidos. Em nossa opinião esta matéria está sujeita a fundamentação exigida legalmente para os actos administrativos, com o que se violam os artigos 124° e 125° do C.P.A., o que equivale a existir um vício de forma do próprio acto, que tem por consequência a sua anulabilidade.

    6. Além disso, ao decidir-se critérios de distribuição de verbas depois de conhecer as candidaturas que se apresentam a concurso, com todos as suas virtudes e defeitos, está a colocar-se em causa o princípio da imparcialidade porque, mesmo que inconscientemente, os critérios podem escolher-se de forma a adaptarem-se aos candidatos que, na perspectiva de quem avalia, serão merecedores, por qualquer motivo, de maior financiamento, quando deveria ser precisamente o contrario.

    7. Pelo que, com tal procedimento, estamos perante uma violação do princípio da justiça e imparcialidade, consagrados no art. 6° do C.P.A.

    8. Além disso, não nos parece correcto utilizar a verba solicitada por cada candidato como factor de adequação da atribuição das verbas disponíveis, até porque faz depender do candidato um poder que compete à administração, já que é o candidato que contribui para a "escolha" do montante do seu financiamento, não por qualquer razão de mérito da sua acção, mas apenas porque ousou pedir mais verba, o que nos leva de imediato para um tratamento desigual das candidaturas, com violação do princípio da igualdade que deve presidir às decisões administrativas.

    9. Com este procedimento do júri, não contemplado pelo Regulamento ou legislação aplicável, resultou a atribuição de montantes de financiamento mais elevados a candidaturas que obtiveram menor classificação.

    10. Pelo exposto, a ora recorrente entende que estamos perante um vício de desvio do poder, já que a decisão da administração não obedece ao interesse público, que faria coincidir o maior financiamento com a melhor classificação obtida no concurso, sendo esse o fim que o legislador teve ao atribuir o poder discricionário à administração para decidir este concurso ou, pelo menos, perante a violação do principio da imparcialidade.

    11. Por último, a deliberação do júri não respeitou o prazo previsto no Regulamento para apresentação das candidaturas, pelo que, em nossa opinião, o júri, ao alterar um prazo previsto legalmente, viola o princípio da legalidade previsto no art. 10 do C.P.A., verificando-se assim um vício de violação de lei susceptível de provocar a anulabilidade do acto administrativo, nos termos do art. 135° do C.P.A., além de que, tendo a lei previsto um prazo certo para a prática do acto, prazo esse que não foi verificado, há uma omissão de uma formalidade que gera um vício de forma e, em consequência, a anulabilidade do acto administrativo.

  2. 3. A autoridade recorrida contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões: 1.ª) - Como se demonstrou, não está o acto homologatório inquinado de insuficiente fundamentação, uma vez que a avaliação e a selecção efectuada pelo júri do concurso teve sempre o mínimo de determinabilidade prevista na lei, nem viola o princípio da igualdade de tratamento, pois revela ter existido uniformidade de critérios e de procedimentos relativamente a todas as candidaturas.

    1. ) - Neste tipo de procedimentos concursais de apoio financeiro às artes do espectáculo, esse Supremo Tribunal vem entendendo que "As decisões administrativas de classificação ou valoração do mérito devem considerar-se suficientemente fundamentadas desde que das respectivas actas constem, directamente ou por remissão para outras peças do procedimento, os elementos, factores, parâmetros ou critérios com base nos quais o órgão decisor procedeu à ponderação determinante do resultado concreto a que se chegou." - Acórdão do STA, 1.ª Secção, 1.ª Subsecção de 3/4/2003, proc. N.º 1126/02.

    2. ) - Além de que, "o júri de um concurso detém uma margem de liberdade relativa na avaliação do cumprimento dos critérios legais indeterminados de apreciação das candidaturas" (...) "essa liberdade exerce-se através da enunciação de orientações, pontos de referência, ou parâmetros que, permeando aqueles critérios, aumentam a clareza, a...

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