Acórdão nº 0866/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Fevereiro de 2005

Magistrado ResponsávelCOSTA REIS
Data da Resolução23 de Fevereiro de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. A...

    e B... intentaram neste Supremo Tribunal o presente recurso contencioso pedindo a declaração de nulidade, por violação de direitos constitucionalmente protegidos, da Portaria n.º 811/01, de 25/7, e a declaração de inconstitucionalidade da Lei 173/99, de 21/9, e do DL 207-B/00, de 5/9, que regulamenta aquela Lei e ao abrigo da qual foi publicada a identificada Portaria, para o que.

    sumariamente, alegaram : - Que a referida Portaria - publicada no âmbito do citado DL 207-B/00 e da Portaria 467/01, de 8/5, que regulamentam a Lei de Bases da Caça (Lei 173/99, de 21/9) - criou a Zona Municipal de Caça do Lavre e nela integrou um prédio rústico de que os Recorrentes são donos e legítimos proprietários, sem o seu prévio acordo, o que atinge o seu direito de propriedade.

    - Que este direito, sendo fundamental e gozando de protecção constitucional, só pode ser atingido nos termos previstos na lei e, em todo o caso, mediante processo de declaração de utilidade pública e com a compensação económica pelos danos daí decorrentes.

    - Deste modo, a criação da referida zona de caça, porque colide com o direito de propriedade dos particulares afectados, só poderia ser concretizada através de um processo expropriativo com a correspondente e justa indemnização daqueles.

    - O que não aconteceu.

    - Pelo que se impõe a declaração de nulidade das normas da mencionada Portaria.

    - Os vícios que enfermam este Diploma reflectem, de resto, os vícios que ferem a própria Lei de Bases da Caça e a legislação que a regulamenta, como o DL 227-B/00 e a Portaria 467/01.

    - Inconstitucionalidade que se manifesta em duas vertentes (1) na criação infundada de reservas em matéria de gestão de recursos cinegéticos e (2) na criação de zonas de interesses nacional e municipal com afectação do direito de propriedade sem acordo dos particulares, sem processo de expropriação e sem o pagamento de uma justa compensação.

    A Ilustre Magistrada do Ministério Público, logo na vista inicial, emitiu parecer no sentido da declaração de incompetência dos Tribunais Administrativos para conhecer da matéria atinente aos pedidos aqui formulados.

    O que provocou a prolação do Acórdão de fls. 59 a 62 no qual se decidiu declarar este Tribunal incompetente para declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da Lei 173/99 e do DL 207/B-/2000, mas julgá-lo competente para conhecer da legalidade do acto administrativo impugnado.

    Notificadas, a Autoridade Recorrida e a Recorrida particular, Associação de Caça e Pesca da Herdade ..., responderam defendendo que o despacho recorrido não sofria dos vícios que lhe foram imputados e, consequentemente, pugnando pela sua manutenção.

    Os Recorrentes concluíram as suas alegações do seguinte modo: 1. Deve ser declarada a nulidade da Portaria n.º 811/01, de 25/7 por

    a) Violar a lei e os art.s 62.º e 267.º da CRP.

    b) Bem como o Acórdão n.º 866/96, de 18/12.

  2. Ainda remetida para o Tribunal Constitucional a apreciação da inconstitucionalidade da Lei 173/99, de 21/9, e do DL que a regulamenta, DL 227-B/00, de 15/9.

  3. Com a declaração de nulidade da Portaria n.º 811/01, de 25/6, deverá ser determinada a desanexação dos terrenos dos Recorrentes da zona de caça municipal do Lavre, cuja gestão foi atribuída à Associação de Caça e Pesca da Herdade dos ....

    Contra - alegou apenas a autoridade recorrida para sustentar a legalidade do seu despacho.

    A Ex.ma Sr.ª Procuradora Geral Adjunta, no seu parecer, considerou que o presente recurso merecia provimento porquanto, muito embora o acto impugnado não estivesse inquinado dos vícios de violação de lei que lhe eram imputados, foi proferido sem que os Recorrentes dessem autorização para que o seu prédio fosse integrado na reserva em causa, "desconhecendo-se, até porque do processo administrativo não constam elementos, se aqueles foram ouvidos nos termos do art.º 100.º do CPA", o que constituía ilegalidade determinante da sua anulação.

    Mostrando-se colhidos os vistos legais cumpre decidir.

    FUNDAMENTAÇÃO I. MATÉRIA DE FACTO.

    Julgam-se provados os seguintes factos : 1. Em 6/7/01 a Autoridade Recorrida aprovou, pela Portaria n.º 811/2001, publicada no DR, I Série B, de 25/7/01, a criação da zona de caça municipal de Lavre, pelo período de seis anos, e transferiu a sua gestão para a Associação de Caça e Pesca da Herdade dos .... - vd. a citada Portaria, que se encontra a fls. 9 destes autos, que aqui se dá por reproduzida.

  4. Entre os terrenos que passaram a integrar aquela zona de caça, cuja área é de 2454, 8195 ha, encontra-se um prédio rústico de que os Recorrentes são proprietários.

  5. A Recorrente não deu o consentimento para a criação da Zona de Caça referida no anterior ponto 2.

    1. O DIREITO O presente recurso dirige-se contra o despacho que criou a Zona de Caça Municipal do Lavre - que integrou um prédio rústico dos Recorrentes - e transferiu a sua gestão para a Associação de Caça e Pesca da Herdade dos ..., o qual vem reputado de ilegal por ter sido sustentado em normas materialmente inconstitucionais e por ter sido proferido sem que tivessem dado o seu consentimento para aquela integração.

    Vejamos, pois, começando-se pela alegada ilegalidade do despacho recorrido em virtude do mesmo ter sido fundamentado em normativos inconstitucionais.

  6. Estatui o n.º 1 do art.º 62.º da CRP que "a iniciativa económica privada exerce-se livremente nos quadros definidos pela Constituição e pela lei e tendo em conta o interesse geral".

    A Recorrente entende que o princípio da liberdade de iniciativa económica que se colhe neste dispositivo foi violado quando, na lei ordinária, se prescreveu que "a gestão dos recursos cinegéticos compete ao Estado, podendo ser transferida ou concessionada nos termos da presente lei"...

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