Acórdão nº 01630/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 15 de Fevereiro de 2005

Data15 Fevereiro 2005
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I- RELATÓRIO A... e B...

, com os sinais dos autos, interpõem recurso contencioso do despacho do Secretário de Estado da Habitação, proferido em 24 de Fevereiro de 2003, no âmbito do recurso hierárquico necessário, que os recorrentes interpuseram nos termos do nº2 do artº22º do DL 61/99, de 02.03, com fundamento em vários vícios de forma, pedindo seja declarado nulo e de nenhum efeito o acto recorrido e, quando assim se não entenda, anulado com todas as consequências legais e, em qualquer dos casos, deverá o acto recorrido ser substituído por um outro que reconheça a capacidade da recorrente B... para técnica até à classe 3 no Alvará do IMOPPI.

Foi cumprido o artº43º da LPTA.

A autoridade recorrida pronunciou-se, na sua resposta, pelo não provimento do recurso.

Cumprido o artº67º do RSTA, vieram recorrentes e autoridade recorrida apresentar as suas alegações, tendo os recorrentes formulado as seguintes CONCLUSÕES: 1. Eventualmente, a resposta da Administração junta aos autos é inadmissível, por ser assinada por quem não tinha para tanto competência.

  1. A confirmar-se a inexistência de delegação de competências terá de ser desentranhada dos autos e devolvida à apresentante.

  2. Com as legais consequências da falta de resposta por parte da Autoridade Recorrida.

  3. O acto em crise é ilegal, pois, encontra-se inquinado de vícios procedimentais, de forma e não encontra sustentabilidade na lei.

  4. O acto em crise não se reporta ao recurso hierárquico, apresentando fundamentação e resposta que, em nada contraria a pretensão dos recorrentes.

  5. De facto, responde a autoridade recorrida a " alhos" com " bugalhos", o que se afirma com todo o respeito.

  6. O único fundamento apresentado pela autoridade recorrida no acto em crise para indeferir o recurso hierárquico prende-se com o facto da recorrente B... não estar inscrita na Ordem de Engenheiros.

  7. No entanto, da análise e interpretação da legislação aplicável não é obrigatório sequer ser engenheiro ou engenheiro técnico para que possa legalmente ser deferida a pretensão dos recorrentes.

  8. Na verdade, sendo certo que a recorrente B... não está inscrita na OE, está inscrita no SNET, tem curso de engenharia civil reconhecido pelo Estado Português, curso esse que lhe custou 5 anos, tem experiência na área de construção ( nada disto questionado pela Administração); 10. A classe de alvará a que os recorrentes pretendem ter acesso permite que empreiteiros, electricistas, encarregados, etc. confiram a capacidade técnica necessária.

  9. No entanto, o único fundamento é a falta de inscrição na OE.

  10. Os recorrentes não pretendem nestes autos que o Tribunal reconheça o direito da recorrente B... em ser aceite na OE, ou em ser reconhecida como Engenheira, o que pretendem é que lhes seja reconhecido o direito de acesso à profissão nos mesmos moldes em que o é àqueles que não são Engenheiros, mas têm capacidade necessária.

  11. Aliás, veja-se que podem inclusivamente ser aceites bacharéis ou licenciados em outras áreas diversas da engenharia.

  12. A verdade é que a Administração desde o início de todo este processo tem vindo constantemente a vedar o acesso à profissão com fundamentos absolutamente ilegais e desviando a atenção para o facto da recorrente B... não estar inscrita na OE, o que procura inclusivamente com a sua resposta à p.r.

  13. Resposta essa onde a Administração entra em total baralhação confundindo licenciados com Engenheiros e confundindo conceitos e funções..

  14. De facto, se alguém que não é engenheiro pode conferir capacidade técnica a uma empresa até à classe 3, tal não significa que possa exercer as funções de engenheiro.

  15. Sendo assim absolutamente desprovidos de lógica os artº 15º a 17º da resposta junta aos autos.

  16. Ou será que o empreiteiro também terá de estar inscrito na OE ou noutra qualquer Ordem que se desconhece? 19. Não é exigido em nenhum diploma legal aplicável que a técnica responsável para um alvará de CLASSE 1 tenha de estar inscrita na OE ou na ANET - este é um facto incontornável.

  17. A recorrente B... concluiu com aproveitamento o curso de Engenharia Civil na Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias em Lisboa ( à data ISMAG), estando o curso devidamente reconhecido pelo Ministério da Educação ( Órgão competente do Estado para o efeito)- Portarias nº868/93, de 14 de Setembro e nº43/99, de 21 de Janeiro.

  18. Temos assim uma licenciada num curso superior de engenharia civil, reconhecido como bom pelo Estado Português (5 anos), que está a ser impedida do exercício da actividade profissional enquanto técnica responsável por obra no quadro de uma empresa que se candidatou a ALVARÁ DE CLASSE 1, o que leva a Autoridade Recorrida a impedir também uma empresa de laborar.

  19. Toda a fundamentação do acto em crise assenta em pressupostos que não se verificam, em exigências abusivas e que não constam da lei e num entendimento errado daquilo que é requerido.

  20. A própria resposta da Administração junta aos autos reconhece que para a classe de alvará requerida podem conferir capacidade técnica os encarregados e os consultores técnicos ( artº11º e 12º).

  21. Não existem assim dúvidas que nem é exigido o grau de engenheiro, nem engenheiro técnico ( artº13º).

  22. A recorrente tem 5 anos de curso superior, conta já com vários anos de experiência na construção, está inscrita no sindicato dos engenheiros técnicos.

  23. E não esclarece a Administração qual a " experiência" ou a " formação" que para si será suficiente.

  24. Desde o início que os recorrentes alegam que para ser deferido o alvará em causa ( CLASSE 1) não é necessário constar dos quadros da empresa construtora, nem Engenheiro Civil, nem sequer é necessária a conclusão de um curso superior, indicando a legislação aplicável e a Administração continua a defender que para ser Engenheiro terá de estar inscrito na respectiva Ordem…Ora, uns falam em " alhos" e outros em " bugalhos"! 28. E, nos termos do nº2 do artº125º do CPA, " Equivale à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto", onde, ainda que pudessem levantar-se dúvidas quanto à obscuridade ou à "contradição", certo é que, pelo menos quanto à "insuficiência" não existe qualquer dúvida: a fundamentação do acto é mais que insuficiente, é inexistente por carecer inclusivamente de lógica.

  25. Por outro lado, a decisão seria sempre ilegal atentas as exigências que não têm qualquer correspondência com a lei.

  26. A recorrente quando tirou o seu curso superior e quando se inscreveu no Sindicato dos Engenheiros Técnicos (SNET), com o nº16.070, ficou logicamente reconhecida como tendo capacidade técnica.

  27. Por outro lado, ainda que a recorrente não estivesse inscrita e devidamente reconhecida pelo SNET, a verdade é que, como licenciada numa área científica adequada às autorizações e tendo experiência profissional relevante na área ( o que aliás não é colocado em causa), fica abrangida pela excepção do artº6º da Portaria nº412-J/99, de 4 de Junho.

  28. Pela interpretação literal do corpo do nº1 do artº6º da dita Portaria, a referência a " áreas científicas da engenharia" refere-se apenas aos bacharéis.

  29. E ainda que assim não fosse, sempre essa restrição seria absolutamente inconstitucional por violadora do princípio da igualdade previsto no artº13º da CRP, onde nos termos do nº1 todos os cidadãos são iguais perante a lei, e nos termos do nº2, ninguém pode ser privilegiado, beneficiado ou prejudicado em razão da sua "(…) instrução(…)".

  30. SE um licenciado ou um bacharel de áreas diversas da engenharia podem, desde que preenchidos determinados requisitos legais, será aceites como bons, qual o fundamento para afastar aqueles que estão vocacionados?! 35. Todos os requisitos cumulativos do artº6º da dita Portaria estão preenchidos e não são colocados em causa.

  31. Na lógica transposta da Autoridade Recorrida se um indivíduo concorresse para um determinado cargo onde os requisitos são o 12º ano de escolaridade concluído, poderia ser excluído pelo facto de ter uma licenciatura… do mesmo modo que poderiam ser impedidos os licenciados em Direito de exercerem a profissão em gabinetes jurídicos, nomeadamente nos gabinetes jurídicos do Estado, sendo-lhe exigida a inscrição na Ordem dos Advogados, mesmo que não fossem contratados para o exercício da profissão de Advogado.

  32. A interpretação que a Autoridade Recorrida pretende revela-se absolutamente inconstitucional, pelo que nos termos do artº204º da CRP deverá ser apreciada.

  33. Por outro lado, revela-se como ilegal a exigência da cédula da OE ou da carteira da ANET, porquanto o que a lei exige- anexo II da Portaria nº412-H/99, de 4 de Junho- é a " Fotocópia do certificado de habilitações ou da carteira profissional dos técnicos." 39. Ao exigir o recorrido aquilo que não exige a lei, procura substituir-se ao próprio legislador.

  34. O recorrido interpretou de forma errada a disposição legal, os princípios básicos e decidiu contrariamente aos fins para os quais o próprio IMOPPI foi criado.

  35. A não ser assim, cair-se-ia no ridículo de existirem, por exemplo, construtores civis ou electricistas sem qualquer curso superior, a poder integrar quadros na classe 1 que um licenciado em engenharia civil ( curso superior reconhecido pelo Estado e como tal logicamente reconhecido pelo IMOPPI) não poderia.

  36. Pelo que, para além da ilegalidade da decisão verifica-se um total atropelo ao mérito que todas as decisões da administração devem cuidar, até porque não deveria a autoridade recorrida ver-se como um litigante ( razão pela qual está isenta de custas), mas sim como um defensor do bem comum! A autoridade recorrida, nas suas contra-alegações, defende a competência do autor do acto e a sua, ambas ao abrigo de delegações ministeriais e ratifica todos os actos praticados nos autos, incluindo a resposta da Secretária de Estado da Habitação e concluiu...

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