Acórdão nº 01036/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 02 de Fevereiro de 2005

Magistrado ResponsávelCOSTA REIS
Data da Resolução02 de Fevereiro de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

A... intentou no Tribunal Central Administrativo recurso contencioso de anulação do despacho, de 28/5/02, do Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa que manteve a decisão do Sr. Director Regional de Educação do Norte, que a condenou na pena de 250.000$00 de multa suspensa por um ano, arguindo a sua ilegalidade por o mesmo ter violado o disposto nos n.ºs 4, 36 e 37 do Despacho n.º 60/SEED/94, o n.º 4.3, do n.º 1, da Portaria n.º 130/86, de 3 de Abril, dos artigos 9.º, 10.º, 28.º, 29.º e 30.º do DL n.º 24/84, de 16 de Janeiro, do artigo 3.º n.º 1 do DL n.º 115-A/98, dos artigos 123.º n.º alínea d), 124.º n.º 1 alínea b) e e), 125.º n.º 2 do CPA, os artigos 31.º n.º 2 alínea b) e 36.º do CP e os artigos 13.º e 29.º n.º 1 da CRP.

A Autoridade recorrida respondeu para defender a legalidade do acto impugnado.

A solicitação do MP, a autoridade recorrida informou que a pena de multa aplicada à recorrente, cuja execução fora suspensa por um ano, tinha sido extinta em virtude de ter decorrido aquele período de tempo sem a Recorrente ter incorrido na prática de qualquer outra infracção disciplinar.

O que determinou a que a instância fosse julgada extinta, por inutilidade superveniente da lide, pois que foi entendido que, tendo o acto contenciosamente recorrido sido eliminado da ordem jurídica, não fazia sentido o prosseguimento do recurso para o conhecimento do seu mérito já que os efeitos meramente laterais, indirectos ou reflexos de um eventual julgado anulatório, que a Recorrente pretendesse fazer valer, não eram razão suficiente para esse prosseguimento.

Inconformada com este julgamento a Recorrente interpôs o presente agravo, concluindo as suas alegações da seguinte forma: 1. A recorrente foi condenada, por despacho do Sr. Director Regional de Educação do Norte de 15/11/01 na pena de 250.000$00 de multa, suspensa na sua execução pelo período de um ano, tendo recorrido hierarquicamente para Sua Excelência o Secretário de Estado da Administração Educativa que produziu o despacho em 28/12/01, sob parecer do jurista da D.R.E.N., mantendo a decisão do Sr. Director Regional de Educação do Norte.

  1. De tal despacho, a recorrente interpôs, tempestivamente, recurso contencioso de anulação, que tramitou no Tribunal Central Administrativo sob o n.º 11277/02, sendo que no prazo da contestação veio o recorrido, através de novo despacho, declarar "revogar o acto recorrido", sob proposta do mesmo jurista da D.R.E.N., tendo proferido o despacho ora recorrido em 28/5/02, sendo que nessa sequência o TCA ordenou, por efeito de tal despacho, supostamente revogatório do anterior, a extinção da lide por inutilidade superveniente.

  2. O despacho proferido no dia 28/5/02 - despacho recorrido - a recorrente interpôs novamente recurso (em 22/7/02) para o TCA, recurso esse que transitou sob o n.º 1158/02 na mesma 2.ª Subsecção da 1.ª Secção de Contencioso Administrativo.

  3. Em tal recurso veio o mesmo Tribunal Central Administrativo, por acórdão de 1/4/04 - acórdão recorrido - a declarar pela segunda vez extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, desta vez por, supostamente, o acto recorrido ter sido banido da ordem jurídica dado que a entidade recorrida havia julgado extinta a pena, mercê de ter sido ultrapassado o período da suspensão da execução da mesma pena.

  4. Na esteira da posição do Ministério Público junto do Tribunal Central Administrativo que considerou que a pena na qual foi condenada a recorrente no processo disciplinar não era uma verdadeira pena disciplinar, "(…) mas apenas uma ameaça de punição (…)", veio o tribunal recorrido a considerar que o acto recorrido "(…) consubstanciava a ameaça de aplicação de uma multa no valor de 250.000$00 (…).

  5. Ora, este entendimento não é, minimamente, de sufragar. De facto, o Estatuto Disciplinar inserto no DL n.º 24/84, de 16/1, prevê no seu artigo 11.º, n.º 1, que as penas aplicáveis aos funcionários pelas infracções disciplinares que cometerem são a repreensão escrita, a multa, a suspensão, a inactividade, a aposentação compulsiva e a demissão, pelo que a pena de multa aplicada à recorrente, ainda que suspensa na sua execução, não pode deixar de constituir uma pena, desde logo porque está prevista como tal no supracitado artigo 11.º do ED.

  6. Por outro lado, a decisão de um processo disciplinar ou é absolutória ou condenatória, implicando a condenação a aplicação de uma pena entre as estatuídas no artigo 11.º, não fazendo qualquer sentido que se pudesse recorrer de uma mera "ameaça de punição", desde logo porque a recorrente seria, provavelmente, neste caso parte ilegítima ou, pelo menos, não teria interesse em agir.

  7. Uma qualquer pena suspensa não pode deixar de se considerar como uma verdadeira pena e não como uma ameaça de punição, desde logo porque carrega um efeito estigmatizante para a pessoa que foi alvo da mesma.

  8. Propende o acórdão recorrido para aceitar a tese segundo a qual em processo disciplinar tendo o arguido sido punido com uma qualquer pena suspensa na sua execução e não tendo o mesmo cometido qualquer ilícito disciplinar na pendência da suspensão, a decisão da entidade recorrida que decretar a extinção da pena e ordene que seja retirado do seu registo de infracções a menção à condenação imposta, determina a inutilidade superveniente da lide.

  9. Ora, bastaria que a entidade administrativa condenasse os arguidos em pena suspensa por curtos períodos para que o acto em causa se tornasse absolutamente insindicável jurisdicionalmente.

  10. Nas suas últimas alterações a Lei Constitucional substituiu, ampliando, um mero controlo de legalidade sobre actos definitivos e executórios por uma garantia de tutela jurisdicional efectiva de quaisquer actos lesivos, independentemente da forma que esses actos revistam, sendo assim o único critério a atender actualmente é o da lesividade e não o do carácter definitivo e executório do acto.

  11. Deve considerar-se que o acto em causa é lesivo e permanece lesivo apesar de extintos os seus defeitos, uma vez que a recorrente foi condenada em processo disciplinar com toda a estigmatização que daí decorreu para a mesma, vendo-se alvo, atento o mediatismo do caso dos atestados médicos em Guimarães, dos olhares reprovadores dos seus pares, da opinião pública, vendo a sua vida devassada pela comunicação social e nos meios de comunicação social foi julgada sumariamente e condenada, aí sim, sem possibilidade de recurso e, por fim, vendo-se obrigada a recorrer aos tribunais para demonstrar a sua inocência que são os mesmos que agora lhes fecham as portas negando proferir decisão de mérito sobre a sua JUSTA pretensão.

  12. O facto de a pena ter sido considerada extinta pela entidade recorrida não implica necessariamente a inutilidade superveniente do recurso interposto, nem sequer se podem assacar culpas à recorrente, que tempestivamente interpôs recurso, pela normal delonga do processo.

  13. De facto, o recurso havia de prosseguir seus termos para ser produzida sentença anulatória do acto recorrido em ordem a apagar retroactivamente os efeitos produzidos ainda que fosse para que a recorrente vir a ser ressarcida dos danos emergentes do acto anulado, sendo esta a...

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