Acórdão nº 01434/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Janeiro de 2005

Data19 Janeiro 2005
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo 1.1. A… (id. a fls. 1) interpôs, na 1ª Secção deste Supremo Tribunal Administrativo, recurso contencioso de anulação do despacho de 20 de Junho de 2003 do Secretário de Estado da Justiça, que lhe indeferiu o pedido de indemnização ao abrigo do Decreto-Lei nº 423/91, de 30 de Outubro, por si formulado.

1.2. A entidade recorrida notificada nos termos do disposto no art.º 43.º da L.P.T.A., não respondeu.

1.3. A Recorrente apresentou as alegações de fls. 70 e segs, as quais concluiu do seguinte modo: "1- O ordenamento jurídico-legal português, constitucional e a administrativo, impõe o dever de fundamentação dos actos administrativos, designadamente quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos (art. 268º, nº 3 da CRP), e quando, total ou parcialmente, decidam em contrário de pretensão formulada por interessado (artº 124º, nº 1, al c) do CPA); 2- O ordenamento jurídico-legal português, considera ainda que equivale a falta de fundamentação do acto administrativo, a adopção de fundamentos que, por insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto (art. 125º, nº 2 do CPA); 3- No caso sub judice, o Senhor Secretário de Estado da Justiça praticou um acto administrativo cuja fundamentação foi feita por mera declaração de concordância e remissão para o parecer elaborado pela Comissão; 4- O referido parecer enferma de vício - a falta de fundamentação -, porquanto, não se pronunciou relativamente à aplicabilidade do art.º 3º da Lei nº 10/96, de 23 de Março, ignorando, nesta parte, a pretensão da requerente; 5- Na situação em apreço, o Senhor Secretário de Estado não fundamentou o acto administrativo, violando o disposto no artigo 268º, nº 3 da Constituição da República Portuguesa, bem como o disposto nos artigos 124º e125º do Código de Procedimento Administrativo.

Termos em que o despacho recorrido deve ser anulado." 1.4. A entidade recorrida contra-alegou nos termos constantes de fls. 78, dando como reproduzido o conteúdo do parecer da Comissão de Protecção às Vítimas de Crimes, no qual se baseou o despacho recorrido, e formulando as seguintes conclusões: "

  1. O acto impugnado não padece dos vícios que lhe são imputados.

  2. Ocorrendo, no caso concreto da recorrente, uma restrição à concessão da indemnização que reclama por força do disposto no nº 5 do artigo 1º do D.L. nº 423/91, de 30 de Outubro." 1.5. A Exmª Procuradora-Geral Adjunta junto deste S.T.A., emitiu o parecer de fls. 81 e 82, que se transcreve: "A nosso ver o recurso contencioso merece provimento.

    O que está em causa é tão só saber se o acto contenciosamente recorrido - despacho do Senhor Secretário da Justiça de 2003.06.20 - que indeferiu o pedido da interessada de concessão de indemnização ao abrigo do regime de protecção às vítimas de crimes violentos, sofre ou não do imputado vício de falta de fundamentação.

    Tendo o acto impugnado negado um direito que a interessada pretendia ver reconhecido, a fundamentação é obrigatória, à luz do art° 268°, n° 3, da CRP, e, do art° 124°, n° 1, alínea a), do CPA.

    Constata-se que a decisão recorrida remete para os fundamentos constantes do Parecer da Comissão de Protecção às Vítimas de Crimes, que se debruçou sobre o pedido formulado, sublinhando não se encontrarem reunidos os requisitos legais exigidos para a atribuição de indemnização, além de que o direito invocado estaria sempre excluído por força do n°5 do art° 1º do DL 423/91, de 30.10. Importa então verificar se a fundamentação em que assenta esse acto obedece ou não aos requisitos impostos por aquele dispositivo da Lei Fundamental e pelo art° 125°, nos 1 e 2, do CPA.

    A propósito desta matéria, tem a jurisprudência deste STA considerado que a fundamentação do acto administrativo é um conceito relativo que varia conforme o tipo de acto e as circunstâncias do caso concreto, mas só é suficiente quando permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do acto para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do acto decidiu como decidiu e não de forma diferente (cfr, a título de exemplo, os acórdãos de 2001.11.14, no proc. n° 39559, de 2003.03.12, no processo n° 1786/02, e, todos os arestos citados neste último).

    Cremos que o acto contenciosamente recorrido, cuja fundamentação é feita por remissão, não satisfaz estas exigências.

    Essencialmente, aquele Parecer funda o indeferimento do pedido na circunstância de não se verificarem todos os requisitos exigidos pelo art° 1º, nº 1, do DL n°423/91, de 30.10, visto não se encontrar demonstrado que o acto de violência tenha sido intencional, e, ainda no facto de - mesmo verificando-se esse requisito - estar excluída a aplicação do diploma ao abrigo do n° 5 desse art° 1°, dado as lesões em causa terem sido causada por acidente de viação.

    Acontece que a interessada, prevendo este obstáculo, fez apelo, no seu requerimento, ao disposto no art° 3º da Lei n° 10/96, de 23.03, que estabelece que quando relevantes circunstâncias morais ou materiais o justifiquem, o Ministro da Justiça pode dispensar os pressupostos que condicionam a concessão da indemnização constantes do Decreto-Lei n° 423/91, de 30 de Outubro.

    E, a esse propósito, alegou a matéria constante dos artigos 22° a 35° do mesmo requerimento.

    Ora, nos fundamentos daquele Parecer, de que se apropriou o acto impugnado, nada é referido sobre a verificação ou não dos pressupostos da concessão da indemnização ao abrigo do citado art° 3° da Lei n° 10/96, ficando-se sem saber por que razão foi indeferido o pedido à luz deste preceito. Estamos, assim, perante uma fundamentação insuficiente que, nos termos do art° 125°, n° 2, do CPA, equivale à falta de fundamentação.

    Procede, nestes termos, o invocado vício de falta de fundamentação.

    Em razão do exposto, emitimos parecer no sentido de que deverá ser concedido provimento ao recurso contencioso, anulando-se o acto contenciosamente recorrido." 2. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

    2.1. Com interesse para a decisão, consideram-se assentes os seguintes factos: A- Por requerimento entrado em 28-4-03 no Ministério da Justiça/Comissão de Protecção às Vítimas de Crimes, a Recorrente A… requereu à Ministra da Justiça a concessão de indemnização, ao abrigo do Decreto-Lei nº 423/91, de 30 de Outubro, alegando as razões constantes do referido requerimento, de fls. 29 a 15 do instrutor apenso, que se dá por reproduzido.

    B- Dá-se por reproduzido o conteúdo dos docºs nºs 1 e 2 de fls. 13 a 1 do instrutor apenso.

    C- Em 26 de Maio de 2003, foi emitido, pela Comissão de Protecção às Vítimas de Crimes, o parecer de fls. 33 a 31 do instrutor apenso, do seguinte teor: "I - Os Factos Tendo em conta os factos alegados pela requerente A… e ainda os já resultantes da instrução dos autos, pode-se dar como provado o seguinte: - Em 4 de Novembro de 2000, entre as 1,30 e as...

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