Acórdão nº 01703/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18 de Janeiro de 2005

Magistrado ResponsávelALBERTO AUGUSTO DE OLIVEIRA
Data da Resolução18 de Janeiro de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em subsecção, na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

1.1.

A..., médico, instaurou, no Tribunal Administrativo do Círculo de Coimbra acção declarativa para condenação do Estado Português a pagar-lhe a quantia de 21.374.330$00, acrescida de juros de mora legais a contar da citação, como indemnização e compensação por danos patrimoniais e não patrimoniais.

Alegou, em síntese: - Por despacho do Subdirector do Serviço de Pessoal da Direcção do Serviço de Pessoal do Estado-Maior do Exército foi determinada a rescisão do contrato de provimento que celebrara com a Academia Militar; - Esse despacho foi contenciosamente anulado, por sentença transitada em julgado; - Apesar de ter requerido, não houve execução da sentença.

1.2.

Por sentença de 30 de Abril de 2002, a acção foi julgada parcialmente procedente e condenado o réu a pagar ao autor a quantia de € 94.144,76€, acrescida de juros legais, contados à taxa legal desde a citação até integral pagamento.

1.3.

Inconformados, Réu e Autor interpuseram recurso: independente, o do Réu, subordinado, o do Autor.

1.4.

O Réu concluiu nas suas alegações: "

  1. Os danos patrimoniais devem ser fixados tendo em conta os vencimentos e outros subsídios líquidos do autor, porquanto eram esses que o autor recebia e, por isso, só nesses montantes foi prejudicado, pelo que só também neles pode ser indemnizado, sendo certo que a Academia Militar teria de efectuar os correspondentes descontos legais.

  2. A douta sentença recorrida ao tomar como base da indemnização do dano patrimonial ao vencimentos ilíquidos do autor violou, assim, o disposto no artigo 566º nº 2 do Código Civil.

  3. Apenas se provou que a decisão que determinou a rescisão do contrato que ligava o autor à Academia Militar, lhe causou sofrimento moral e desconforto, bem como desprestígio e humilhação, danos que, a nosso ver, não assumem gravidade que justifique a tutela do direito.

  4. Na verdade não se mostra, por não se ter provado, que o autor tenha sido afectado psicologicamente com a rescisão do contrato, nem que a sua carreira tenha sido minimamente prejudicada com tal decisão.

  5. Depois, não pode ser grande o "desprestígio" ou a "humilhação" do autor que viu terminado contrato a tempo parcial, com apenas alguns meses de vigência e com fundamento em "conveniência de serviço".

  6. Por tal razão, os simples incómodos sofridos pelo autor não justificam a indemnização arbitrada por danos não patrimoniais.

  7. Foi assim violado o disposto no artigo 496º, nº1 do Código Civil.

  8. Em todo o caso, e sem conceder, o valor dos danos não patrimoniais fixado é exagerado, não devendo exceder, atenta a modéstia do dano não patrimonial, a importância de 300.00$00 (1.500 euros) i) Mostra-se, pois, também violados os artigos 494º e 496º nº 3 do citado código".

    1.5.

    Contra-alegou o Autor, formulando as seguintes conclusões.

    "1ª Não resulta demonstrado no processo que a douta sentença recorrida tinha considerado, na fixação dos danos patrimoniais, os vencimentos ilíquidos; 2ª O recorrente, quanto a esses danos - patrimoniais -, faz derivar unicamente dessa circunstância a procedência do recurso; 3ª Daí que, por falta da verificação do seu único sustentáculo - que foram os ilíquidos os vencimentos considerados -, não proceda a impugnação da sentença, nessa parte; 4ª Demais, e sem nada conceder, sempre seria de considerar como dano patrimonial indemnizável a desvalorização da moeda entre o momento em que o A. se viu despojado dos vencimentos e aquele em que receberá os correspondentes montantes; 5ª O A. já a partir de 1990, e até Julho de 1999, se viu privado de vencimentos - valores que só após Setembro de 2000 começarão a ser actualizados (pelo vencimento dos juros de mora); 6ª E teve também o prejuízo - não computado na indemnização arbitrada - de haver perdido os consabidos benefícios de ser funcionário público e, nomeadamente, dos advindos, por inerência, como as regalias da ADSE; 7ª O que não foi atendido na sentença e, se considerado, deveria levar à fixação de uma maior indemnização (cf. Artº 566º - 2 do Código Civil); 8ª Sempre haverá que ter em conta o pedido global efectuado, independentemente dos seus valores parcelares (artº 661º - 1 e Ac. do STJ, de 16.05.93, no BMJ 428º, p. 530); 9ª No tocante à compensação dos danos não patrimoniais, os factos provados apontam no sentido de que ela não se operará - equitativamente - por valor inferior ao fixado; 10ª Com efeito, designadamente, os factos provados vertidos nas alíneas b), ff), gg), hh), ii), jj), kk) e ll) do ponto II, supra, evidenciam que o A. era ainda um jovem, em início de carreira, mas já bem apetrechado no plano científico profissional para nela prosperar; 11ª Era - e é - médico, com a especialidade de estomatologista, que exerce no âmbito hospitalar e da medicina privada; 12ª O exercício da sua profissão na Academia Militar alargava-lhe o campo dos seus potenciais clientes e propiciava-lhe um maior êxito na sua angariação - de grande importância para o desenvolvimento da sua medicina privada, então incipiente; 13ª Tratava-se de lugar único no País, que promovia profissionalmente quem o ocupasse, mormente pelo muito bom relacionamento que propiciava, e que o A. desempenhava em quatro horas semanais e no período (morto) do almoço: entre as 12 e as 14 horas, às terças e quintas-feiras; 14ª Daí que a sua perda - abrupta e injustificada (através de acto inquinado de vários vícios jurídicos) - haja causado ao A. os demonstrados sofrimento moral, desprestígio pessoal e humilhação, que até o levou, nos tempos que se seguiram, a omitir ou ocultar dos seus colegas o seu afastamento; 15ª A culpa do Estado na produção de tais danos morais não foi, seguramente, leve ou mera culpa, uma vez que o acto inquinado de ilegalidade que produziu se revelou ser nulo por violação não de um mas de vários princípios do direito aplicável; 16ª Depois, conforme se evidenciou no acima citado Acórdão do STJ, de 08.07.99, a compensação por danos não patrimoniais, para atingir o seu objectivo, tem de ser de montante significativo para o lesado.

    1. A sentença recorrida não violou as normas apontadas pelo recorrente, ou quaisquer outras".

      1.6.

      Nas alegações do seu recurso subordinado, concluiu o Autor: "1ª Na «audiência final» procedeu-se ao registo dos depoimentos, que permite que o presente recurso abranja a própria matéria de facto considerada provada com fundamento na prova testemunhal (artº 522º-B e 712º-1, a) do CPC).

    2. Esse registo e a análise da gravação conduz a que se deva considerar provada, também, a matéria respeitante aos nºs 1º e 11º da «base instrutória»; 3ª E ainda plenamente provada, sem as restrições do julgamento da 1ª instância, o factualismo a que respeitam os seus nºs 4º, 5º, 8º, 10º e 12º.

    3. É o que resulta, com segurança, dos depoimentos das testemunhas Dr..., quanto a toda a matéria aqui questionada; Dr..., à matéria dos nºs 1º, 4º, 5º e 8º;..., à matéria do nº 11º; Dr..., à matéria dos nºs 4º e 5º; Dr. ..., também a toda a matéria questionada - 1º, 4º, 5º, 8º, 10º, a 12º; Dr..., à matéria do nº 11º.

    4. O A. já a partir de 1990, e até Julho de 1999, se viu privado de vencimentos - valores que só depois de Setembro de 2000 começarão a ser actualizados (pelo vencimento dos juros de mora); 6ª Pelo que, sempre será de considerar como dano patrimonial indemnizável a desvalorização da moeda entre o momento em que o A. se viu despojado dos vencimentos e aquele em que receberá os correspondentes montantes; 7ª E teve também o prejuízo - não computado na indemnização arbitrada - de haver perdido os consabidos benefícios de ser funcionário público e, nomeadamente, dos advindos, por inerência, como as regalias da ADSE; 8ª O que não foi atendido na sentença e, considerado, deveria levar à fixação de uma maior indemnização (cf. artº 566º- 2 do Código Civil); 9ª Daí que o valor peticionado a título de lucros cessantes, de 12.469,94 Euros, se mostre equilibrado - justificando a elevação para ele do montante fixado na sentença, a respeito, de 7.481,97 Euros; 10ª Sempre haverá que ter em conta o pedido global efectuado, independentemente dos seus valores parcelares (artº 661º- 1 e Ac. Do STJ, de 16.05.93, no BMJ 428º, p. 530); 11ª No tocante à compensação dos danos não patrimoniais, os factos que devem ser considerados provados apontam no sentido de que ela se operará - equitativamente - pelo valor peticionado pelo autor, de 12.469,49 Euros, ao invés do insuficiente arbitrado na sentença; 12ª Com efeito, designadamente, os factos provados vertidos nas alíneas b), gg), hh), kk) e ll) do ponto II, supra, evidenciam que o A. era ainda um jovem, em início de carreira, mas já bem apetrechado no plano científico profissional para nela prosperar; 13ª Era - e é - médico, com a especialidade de estomatologista, que exerce no âmbito hospitalar e da medicina privada; 14ª O exercício da sua profissão na Academia Militar alargava-lhe o campo dos seus potenciais clientes, projectando-o profissionalmente e propiciando-lhe um maior êxito na sua angariação - de enorme valia para o desenvolvimento da sua medicina privada, então incipiente; 15ª Tratava-se de lugar único no País, que promovia profissionalmente quem o ocupasse, mormente pelo muito bom relacionamento que propiciava, e que o A. desempenhava em quatro horas semanais e no período (morto) do almoço: entre as 12 e as 14 horas, às terças e quintas-feiras; 16ª Daí que a sua perda - abrupta e injustificada (através de acto inquinado de vários vícios jurídicos) - haja causado ao A. os demonstrados sofrimento moral, desprestígio pessoal e humilhação, que até o levou, nos tempos que se seguiram, a omitir ou ocultar dos seus colegas o seu afastamento; 17ª A culpa do Estado na produção de tais danos revela-se, seguramente, grave, atendendo a que o acto inquinado de ilegalidade da sua autoria revelou-se ser nulo por violação não de um mas de vários princípios do direito aplicável...

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