Acórdão nº 0768/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 15 de Dezembro de 2004

Magistrado ResponsávelANTÓNIO SAMAGAIO
Data da Resolução15 de Dezembro de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NA 1ª SECÇÃO DO STA: PROC. Nº 768/04 A..., B... E C..., todos identificados nos autos, interpuseram recurso jurisdicional do acórdão do TCA Sul, de fls. 209 e ss., que, pronunciando-se sobre o pedido de declaração de ilegalidade das normas insertas no regulamento emitido pela Comissão Instaladora da Associação dos Técnicos Oficiais de Contas, julgou o tribunal incompetente em razão da matéria para conhecer da parte do pedido que se fundamenta na violação de princípios constitucionais e rejeitou o pedido na parte restante, «por manifestamente ilegal».

Os recorrentes terminaram a sua alegação de recurso com o oferecimento das conclusões seguintes: 1 - O douto acórdão recorrido andou mal ao considerar o TCA incompetente para apreciar a ilegalidade de regulamentos administrativos por violação da Constituição.

2 - Ao decidir-se assim, permite-se a situação paradoxal de se admitir um meio directo de acesso à tutela judicial aos cidadãos lesados por normas administrativas meramente ilegais, ao mesmo tempo que nega o aceso a um meio de impugnação equivalente relativamente a regulamentos violadores de normas constitucionais.

3 - Tal interpretação, além do mais, é desconforme ao sistema de fiscalização e de controlo da constitucionalidade vigente em Portugal, porquanto ignora a possibilidade de fiscalização difusa.

4 - Aquele entendimento viola ainda o princípio do acesso ao direito e à justiça, assim como o princípio da tutela jurisdicional efectiva, ambos plasmados na CRP, no art. 20º e no art. 268º, n.º 5, que dispõe: «os cidadãos têm igualmente direito de impugnar as normas administrativas com eficácia externa lesivas dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos».

5 - Ao considerar inadmissível o presente pedido de declaração de ilegalidade de normas, o douto acórdão recorrido fez uma interpretação errónea dos pressupostos deste meio processual.

6 - Isto porque o normativo em causa nos autos é um exemplo de regulamento imediatamente operativo ou exequível em si mesmo, como se demonstrou e bem se decidiu no acórdão do STA de 26/3/03.

7 - Na verdade, aquele regulamento contém normas que afectam directamente uma categoria abstracta de pessoas, constituída por todos aqueles que desenvolveram a sua actividade profissional como responsáveis pela contabilidade organizada nos termos do POC, no período de tempo previsto na Lei 27/98.

8 - O regulamento em causa, designadamente ao restringir, de forma inadmissível e ilegal, os meios de prova daquele requisito afecta directamente todos os seus destinatários, sem necessidade de intermediação de qualquer acto de indeferimento da inscrição na ATOC, pois ele impede ou condiciona a própria apresentação de tal pedido, por inútil.

9 - Isso é tanto mais evidente, quanto é certo que muitas das pessoas que estariam, nos termos da lei, nas condições previstas para aceder à profissão, nem sequer o requerem, dada a impossibilidade de fazerem prova dos requisitos legais, dadas as restrições dos meios de prova impostas pelo regulamento.

10 - Assim, o douto acórdão, ao decidir pela ilegalidade do recurso, interpretou erradamente o art. 40º, al. c), do ETAF.

11 - Acresce que tal interpretação é manifestamente inconstitucional, por violação do princípio do acesso ao direito e à justiça e do princípio da tutela jurisdicional efectiva, ambos plasmados no art. 20º da CRP.

12 - Igualmente se ofende o direito conferido pelo art. 268º, n.º 5, da CRP, que dispõe: «os cidadãos têm igualmente direito de impugnar as normas administrativas com eficácia externa lesivas dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos».

Contra-alegou a Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, defendendo a bondade do acórdão «sub censura» e concluindo pelo não provimento do recurso.

O Ex.º Magistrado do MºPº junto deste STA emitiu douto parecer no sentido do não provimento do recurso.

A matéria de facto pertinente é a dada como provada na decisão «sub censura», que aqui se dá por integralmente reproduzida - como estabelece o art. 713º, n.º 6, do CPC.

Passemos ao direito.

A pretensão que os ora recorrentes enunciaram «in initio litis» foi qualificada, por decisão do TAC de Lisboa entretanto transitada em julgado, como um pedido de declaração de ilegalidade das normas constantes do regulamento que a Comissão Instaladora da Associação dos Técnicos Oficiais de Contas (ATOC), em 3/6/98, aprovara com vista à execução da Lei n.º 27/98, de 3/6 - cujo art. 1º viera permitir que os profissionais de contabilidade requeressem a sua inscrição como técnicos oficiais de contas na ATOC, desde que, entre 1/1/89 e 17/10/95, tivessem sido, durante três anos seguidos ou interpolados, responsáveis directos por contabilidade organizada, nos termos do POC.

Foram duas as pronúncias do aresto «sub judicio» a propósito da pretensão de se declarar a ilegalidade das ditas normas regulamentares: a de que os tribunais administrativos são incompetentes «ratione materiae» para conhecer do pedido na parte em que este se fundamenta na violação de princípios constitucionais; e a de que o pedido tinha de ser rejeitado na parte restante, já que as normas regulamentares em causa não foram julgadas ilegais em três casos concretos nem acarretam efeitos produtíveis imediatamente.

Os recorrentes não se conformam com qualquer...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT