Acórdão nº 0216/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Novembro de 2004

Data10 Novembro 2004
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: A Caixa Geral de Depósitos, SA, interpôs recurso jurisdicional da sentença do TAC de Lisboa que julgou improcedente a acção que a ora recorrente intentara contra a sua trabalhadora A..., identificada nos autos, acção essa tendente à condenação da ré no pagamento da importância de 300.000$00 - e respectivos juros de mora vencidos e vincendos - correspondente ao prejuízo sofrido pela Caixa em resultado de conduta negligente da ré durante o exercício de funções.

A recorrente terminou a sua alegação de recurso, formulando as conclusões seguintes: 1 - O tribunal «a quo» ataca a própria aptidão da petição inicial da acção ao ter considerado que a causa de pedir invocada na acção pela autora seria, não a violação de deveres funcionais da ré, estabelecidos e decorrentes de um contrato administrativo, mas sim o exercício do direito de regresso por via de responsabilidade civil contratual da autora para com uma sua cliente, alicerçada em violação do contrato de depósito.

2 - Sendo atacada a correcção da petição inicial, a consequência seria o indeferimento liminar da mesma.

3 - Não tendo o tribunal «a quo» considerado inepta a petição inicial da acção, nem tendo tomado conhecimento da eventual nulidade processual derivada de tal facto até ao despacho saneador, a petição inicial consolidou-se com o trânsito em julgado do despacho saneador, tendo-se formado caso julgado formal em relação a essa matéria (deriva do disposto nos arts. 193º, n.º 2, 206º, n.º 2, 493º, n.º 2, 494º, n.º 1, al. b), e 510º, n.º 1, al. a), todos do CPC).

4 - A decisão recorrida encontra-se ferida da nulidade prevista na al. c) do n.º 1 do art. 668º do CPC ao ter julgado improcedente a acção por via do alegado nas conclusões 1.ª a 3.ª, que antecedem.

5 - De facto, mesmo que se considerasse que o tribunal «a quo» poderia tomar conhecimento de tal ineptidão da petição inicial da acção em sede de sentença (o que sem conceder e por mera facilidade de raciocínio se admite), sempre a consequência de tal facto seria a absolvição da ré da instância e nunca julgar-se improcedente a acção, como aconteceu (cfr. o disposto nos arts. 493º, n.º 2, e 495º do CPC).

6 - Contudo, sempre se dirá que não existe qualquer ineptidão da petição inicial da autora, pois o pedido formulado não está em contradição com a causa de pedir, nem tão pouco o pedido ou a causa de pedir são inexistentes ou ininteligíveis, nem tão pouco ainda o pedido e a causa de pedir são substancialmente incompatíveis entre si.

7 - Por outro lado, embora a autora de facto não tenha invocado o disposto no DL n.º 48.051, de 21/11/67, para compaginar qualquer direito de regresso contra a ré, face ao teor do exarado nos artigos 2º a 23º da petição inicial da acção não se pode aceitar que a autora, naqueles artigos, não tenha invocado a falta de diligência e zelo da ré, manifestamente inferiores àqueles a que se encontrava vinculada pelo exercício do seu cargo.

8 - Igualmente a sentença recorrida sofre da nulidade prevista na al. c) do n.º 1 do art. 668º do CPC quando considera a acção improcedente por falta de competência material do TAC de Lisboa para conhecer da acção, face ao disposto «a contrario» no art. 51º, n.º 1, al. h), do ETAF.

9 - De facto, conforme se retira desde logo do disposto no art. 105º, ns.º 1 e 2, do CPC, a consequência da eventual incompetência material do tribunal sempre seria a absolvição da ré da instância, e nunca ser julgada, como foi, a acção improcedente, quando é um facto que o tribunal não tomou posição quanto à relação material controvertida («vide» o disposto nos arts. 493º, n.º 2, 494º, n.º 1, al. a), e 495º, todos do CPC).

10 - Contudo, e no que diz respeito a esta última questão, que é a da competência do tribunal para a acção, entende a recorrente que também merece reparo o decidido na douta sentença recorrida.

11 - De facto, embora a autora seja uma sociedade anónima, os seus capitais são exclusivamente públicos, sendo o estatuto laboral da ré indubitavelmente de direito público.

12 - Sendo o estatuto laboral da ré equiparável em tudo ao de qualquer funcionário público, nunca a apreciação da violação de deveres inerentes ao exercício das funções que lhe estavam e estão cometidas (as quais revestem interesse público atenta a natureza de sociedade de capitais exclusivamente públicos da autora) poderia ser feita por outro tribunal que não fosse o TAC de Lisboa.

13 - Sendo essa violação de deveres inerentes ao exercício da sua função de empregada com estatuto laboral de direito público que constitui o fundamento da acção proposta pela autora.

14 - Encontrando-se o critério da ambiência de direito público, como índice de uma relação jurídica de direito administrativo, espelhado no contrato de trabalho da ré.

15 - Conduta essa da ré violadora dos seus deveres contratuais e legais impostos pela relação de trabalho de natureza administrativa, a qual foi em exclusivo responsável pelos prejuízos sofridos pela autora e que constituem a ré na obrigação de indemnizar.

16 - Ao não ter decidido desta forma, a douta decisão recorrida violou também o disposto no art. 31º, n.º 2, do DL n.º 48.963, de 5/4/69, que se mantém em vigor por força do disposto no n.º 3 do art. 9º do DL n.º 287/93, de 20/8.

A...

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