Acórdão nº 01535/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 27 de Outubro de 2004

Magistrado ResponsávelANGELINA DOMINGUES
Data da Resolução27 de Outubro de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo 1.1.A Fundação Social - Democrata Oliveira Martins interpôs no T.A.C. de Lisboa recurso contencioso "do acto do Director-Geral do Departamento para os Assuntos do Fundo Social Europeu de 25/9/97, praticado ao abrigo de delegação de competência da Ministra para a Qualificação e o Emprego, que lhe ordenou a devolução da importância de 3.965.446$00, do total recebido pela Recorrente no valor de 24.395.678$00, resultante do financiamento para a realização de uma acção de formação - PO 1001(90.1108P1) Pedido 864 -, por entender que a importância cuja devolução se pede corresponde a despesas consideradas não elegíveis".

1.2.Por sentença daquele T.A.C., proferida a fls. 470 e segs, foi negado provimento ao recurso contencioso.

1.3.Inconformados com a decisão referida em 1.2, interpuseram os recorrentes o presente recurso jurisdicional cujas alegações, de fls. 484 e segs, concluiram do seguinte: "1. Como ficou demonstrado, a douta sentença recorrida enferma de erro ao qualificar a Autoridade Recorrida como a entidade competente para analisar e decidir quanto às despesas apresentadas pela Recorrente em sede de saldo e, assim, atribui-lhe todos os poderes de deveres em matéria de certificação de despesas; 2. Nos termos do quadro jurídico aplicável ao caso em concreto a competência em matéria de aprovação dos pedidos de pagamento de saldo pertence à Entidade Gestora que, no caso presente, é a DREFP (vd., entre outros, arts. 15° e ss. do DN 68/91, de 25 de Março); 3. Mais, o art. 17° do citado Despacho Normativo, atribui à Entidade Gestora a competência para, na sequência da aprovação do saldo, emitir as autorizações de pagamento para o DAFSE (nº 2); bem como a possibilidade de suspender o prazo da decisão caso necessite de documentos adicionais ou entenda necessário proceder à verificação dos elementos factuais ou contabilísticos (nº 4); 4. É ainda a lei que estabelece a repartição de competências entre a Entidade Gestora e o DAFSE, quanto aos mecanismos de controlo das acções co-financiadas pelo FSE.

Assim, nos termos do art. 27° do DL 121-B/90, de 12 de Abril: O controlo ao primeiro nível é exercido pelo Gestor do Programa Operacional e consubstancia-se na verificação da elegibilidade e do cumprimento dos aspecto técnico-pedagógicos da acção; O controlo ao segundo nível é exercido pelo Departamento para os Assuntos do Fundo Social Europeu (DAFSE) e corresponde à verificação financeira, factual e contabilística. Por outro lado, a redução, suspensão ou supressão do financiamento em resultado de certificações negativas, que são necessariamente uma consequência da decisão do pedido de pagamento de saldo, pertencem, igualmente, à esfera de competências da Entidade Gestora; 5. E, no caso em concreto não se verifica nenhuma das causas de redução, supressão ou suspensão do financiamento, tal como se encontram tipificadas pelo n° 1 do citado preceito, a saber: - não consecução dos objectivos, - não justificação dos custos, - não consideração de receitas provenientes da acção, - ou modificações à decisão de aprovação; 6. É por isso que se torna fundamental evidenciar a ilegalidade do acto de auditoria/verificação do DAFSE ao processo de formação realizado pela Recorrente, sob o número de dossier PO 1001 (90 1008 P1), Pedido 864; 7. Mesmo que tivesse cobertura legal formal, o comportamento do DAFSE de reduzir o financiamento pela introdução de critérios de razoabilidade só conhecidos pela Recorrente - e pelo DREFP "a posteriori", depois de prestados e pagos os serviços de terceiros, é profundamente injusto e como tal, seria ilegal por força do art. 266°, n° 2 e art. 6° do Código de Procedimento Administrativo (CPA); 8. Mas, o comportamento e acto de auditoria/verificação e, depois, a ordem de devolução do DAFSE são ainda ilegais por enfermarem de incompetência, violação da lei e, com grande probabilidade de desvio de poder; 9. Os poderes que o DAFSE (e através dele a BDO) utilizou são poderes de controlo em matéria de erros de facto, desvios, deficiências e erros ou falsidades em matéria contabilística e financeira. Tal como é afirmado insistentemente pela Autoridade Recorrida, o que justificou os cortes no financiamento foram juízos de razoabilidade; 10. Esses juízos de razoabilidade envolvem necessariamente o exercício de poderes discricionários e consubstanciam juízos de adequação pedagógica que só à Entidade Gestora, "in casu", a DREFP, caberia fazer - vejam-se os arts. 2°, al. a) e 10º do DN n° 68/91, de 25 de Março e o art. 27° do DL n° 121-B/90, de 12 de Abril; 11. 0 exercício de um poder de controlo sobre poderes discricionários significaria necessariamente que a entidade controladora detinha poderes de direcção ou de tutela sobre a DREFP, o que não é obviamente o caso; 12. O acto de auditoria/verificação do DAFSE está assim viciado de incompetência, por invadir as atribuições legalmente cometidas à Entidade Gestora; 13. Trata-se, para sermos mais rigorosos, da incompetência em razão da matéria para revogar um ou mais actos da DREFP; 14. Mas há também vício de violação da lei nos actos de auditoria/verificação e da ordem de devolução por revogação de um acto legal constitutivo de direitos; 15. O acto da DREFP que aprovou o pedido de financiamento da Fundação Oliveira Martins é constitutivo de vários direitos e obrigações para o Estado e para a destinatária; tanto é assim que alguns documentos oficiais portugueses falam de um contrato administrativo; 16. Parece antes preferível, contudo, qualificá-lo como um acto constitutivo de direitos receptício; 17. É a própria sentença recorrida que reconhece que a decisão impugnada pôs em crise o anterior acto de aprovação e feriu os interesses e direitos da Recorrente; 18. Ora, os actos constitutivos de direitos ou de interesses legalmente protegidos, se válidos, são irrevogáveis. Sendo um acto legal e correctamente executado, como o atesta o facto de o acto de auditoria/verificação do DAFSE ter baseado os seus cortes em meros critérios de razoabilidade/arbitrariedade introduzidos "ex post" ou mesmo em motivos ilegais, não pode ser revogado - CPA, art. 140º; 19. Não é o DAFSE (como erradamente é dito na douta sentença recorrida), mas sim a DREFP, que tem competência para aprovar os pedidos de pagamento de saldo e aferir da conformidade técnico-pedagógica dos resultados alcançados face às propostas aprovadas, bem como solicitar ao DAFSE, se necessário, a correspondente verificação dos elementos factuais e contabilísticos; 20. Mas foi precisamente o DAFSE que fez introduzir e aplicar novos critérios de apreciação, revogando parcialmente o acto da DREFP; 21. O DAFSE considerou erroneamente o acto de aprovação do pedido como uma espécie de acto contabilístico interno e provisório de autorização de despesas. Esquece-se que só se autorizam despesas em cumprimento de obrigações já existentes e que, a própria autorização é criadora de direitos, embora possa ser sujeita a algumas condições, raras vezes sendo a provisoriedade total. Uma provisoriedade global a que ficassem sujeitas as obrigações, dependente de um acto arbitrário/discricionário posterior da Administração, constituiria uma verdadeira condição potestativa " a parte debitoris " e por conseguinte totalmente inadmissível; 22. Admitindo, sem conceder, que o acto da DREPF pode ser inválido por algum vício gerador de anulabilidade respeitante ao exercício de poderes pertinentes à competência técnica, exclusiva da DREFP, também já há muito tinha corrido o prazo de um ano em que seria permitido proceder à sua revogação - CPA, art. 141º; 23. A tese do DAFSE que os créditos da Recorrente são condicionados assenta num equívoco; as condições, como elementos acessórios do acto, devem ser lícitas e legais; uma condição potestativa "a parte debitoris" é ilegal e tendo sido já executadas as obrigações da outra parte terá de ser considerada como não escrita; 24. Para haver possibilidade de modificar os direitos da...

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