Acórdão nº 01844/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Outubro de 2004
Magistrado Responsável | ANTÓNIO MADUREIRA |
Data da Resolução | 26 de Outubro de 2004 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1. RELATÓRIO 1. 1. A..., com os devidos sinais nos autos, interpôs recurso contencioso do despacho do Secretário de Estado Adjunto e do Ordenamento do Território (SEAOT) de 13/9/2 002, que declarou a utilidade pública e atribuiu carácter urgente à expropriação de uma parcela de terreno onde a recorrente tinha construído uns armazéns comerciais, imputando-lhe vários vícios geradores da sua nulidade, de violação de lei e de forma.
Indicou como directamente prejudicada com o provimento do recurso a B...
em Viana do Castelo.
A autoridade recorrida respondeu, tendo arguido a ilegitimidade da recorrente e defendido a improcedência de todos os vícios arguidos pela recorrente.
A recorrida particular contestou, tendo igualmente arguido a ilegitimidade da recorrente e defendido a improcedência de todos os vícios arguidos pela recorrente.
Após cumprimento do disposto no artigo 54.º da LPTA, foi relegado para a decisão final, por despacho de fls 205 dos autos, o conhecimento da excepção da ilegitimidade da recorrente, e ordenado o prosseguimento dos autos, para produção de alegações.
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2.
A recorrente produziu alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões: 1.ª) - O despacho em análise refere apenas a expropriação de uma "parcela de terreno" e remete para uma planta ilegível (v. DR, 2.ª Série, de 2 002/9/30, pp 16 446), não identificando os vários edifícios implantados no terreno, nomeadamente o que foi construído pela recorrente e estava na sua posse (vd.doc. 4 junto com a p.r) - cfr. texto, n.ºs 1 e 2.
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) - O despacho recorrido não indica os direitos e ónus que incidiam sobre o prédio expropriado e respectivos titulares (v. art.º 17.º da Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro - CE 99), nomeadamente o arrendamento e a posse da recorrente - cfr. texto, n.º 3.
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) - O despacho sub judice assenta assim em pressupostos que se não verificam e não identifica de forma clara, precisa, completa e intelegível o respectivo objecto e destinatários, não permitindo a determinação inequívoca do seu sentido, alcance e efeitos jurídicos, pelo que é nulo (v. artigos 123.º/1 e 2 e 133.º/2/c) do CPA - cfr. texto, n.ºs 3 e 4.
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) - A publicação de uma planta que não permite a delimitação legível dos bens a expropriar, como se verifica in casu, equivale à falta de publicação, o que determina a ineficácia do acto declarativo de utilidade pública da expropriação (vd. artigo 17.º do CE 99; cfr. artigo 130.º do CPA) - cfr. texto, n.ºs 3 e 4.
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) - O despacho recorrido refere que é expropriada "uma parcela de terreno (...) propriedade da Câmara Municipal de Viana do Castelo", não identificando ou referindo o edifício construído pela recorrente e a sua posse, pelo que violou o artigo 17.º/3 do CE99 - cfr. texto, n.ºs 5 e 6.
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) - O despacho recorrido violou ainda os artigos 1.º e 13.º do CE 99, pois não foi invocada qualquer causa concreta de utilidade pública da expropriação, que nem sequer existe (vd. artigo 62.º da CRP) - cfr. texto, n.º 7.
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) - O despacho sub judice viola clara e frontalmente o disposto no artigo 15.º do CE 99, pois não foram invocados, nem se verificam, os pressupostos e fundamentos legais dos quais depende a atribuição de utilidade pública, não se referido sequer se seria ou não necessário proceder-se de imediato à construção do "edifício de realojamentos" (cfr. artigo 266.º da CRP e artigo 3.º do CPA) - cfr texto, n.º 8.
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) - O acto em análise ofendeu ainda frontalmente o caso julgado da sentença do Tribunal Judicial de Viana do castelo, de 1994/05/10 (cfr. acórdão do STJ de 1994/03/02, proferido no mesmo processo), que ordenou a restituição provisória à recorrente da posse do edifício implantado na parcela expropriada, pelo que é nulo (v.
Doc. 1, adiante junto; cfr. artigos 202.º e 205.º da CRP e artigo 133.º/2/i) do CPA) - cfr. texto, n.ºs 9 e 10.
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) - O despacho recorrido não contém quaisquer fundamentos de facto e de direito da atribuição do carácter de urgência à expropriação (v. artigo 15.º/2 do CE 99) - cfr. texto n.ºs 11 a 14.
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) - O acto recorrido enferma assim da falta de fundamentação de facto e de direito, ou, pelo menos, esta é obscura, insuficiente e incongruente, pelo que foram violados o artigo 268.º/3 da CRP, os artigos 13.º/1, 15.º/2 do CE 99, e os artigos 124.º e 125.º do CPA - cfr texto, n.º 15.
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) - O acto em análise violou os artigos 267.º/5 e 268.º/1 da CRP e os artigos 8.º, 55.º, 56.º, 68.º, 70.º, 100.º, 103.º e 105.º do CPA, pois a recorrente nunca foi notificada para se pronunciar sobre as questões suscitadas antes da prolação do acto sub judice, não tendo sido aduzidas quaisquer concretas razões de facto e de direito que justificassem o carácter urgente da expropriação e dispensa da audição prévia - cfr. texto, n.ºs 16 a 18.
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) - O acto recorrido violou os princípios da justiça, igualdade e proporcionalidade (v .artigo 13.º da CRP; cfr. artigo 5.º do CPA), pois determinou o sacrifício imotivado e arbitrário dos direitos da recorrente, sem se basear numa concreta causa de utilidade pública, cuja existência nem sequer foi invocada ou demonstrada (v. artigo 15.º/2 do CE 99; cfr. artigo 17.º/2 da Declaração universal dos Direitos do Homem, DR, I Série, de 87/03/09) - cfr. texto, n.ºs 19 e 20.
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) - O despacho em análise causou prejuízos absolutamente desproporcionados, violando os princípios da prossecução do interesse público, legalidade, boa fé, confiança e do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos da recorrente (v. artigo 266.º da CRP; cfr. artigos 3.º, 4.º, 5.º e 6.º do CPA) - cfr. texto, n.ºs 20 e 21.
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3.
A Autoridade recorrida contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões: 1.ª) - Na sua qualidade de detentora precária de bem público (e mesmo na de arrendatária que lhe viesse a ser reconhecida) a recorrente apenas tem legitimidade para efeito de questões indemnizatórias, não podendo pretender pôr em causa a transferência de propriedade que o expropriado aceitou alienar (contrato (?)/licença outorgado em 26/1/59, artigo 1051.º, 1, f) do CC e artigos 9.º, 30.º, 31.º e 33.º e sgs do CE).
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) - A ocupação de que a recorrente beneficiou na parcela, coisa pública, precária ou mesmo que não, era de direito administrativo, implicando sempre a entrega do imóvel quando necessário para fim público. Determinada a desocupação, em 1992, não recorrida a decisão, firmou-se como "caso resolvido", estando a recorrente em mora na desocupação à data da decisão da DUP e da sequente posse administrativa.
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) - É um equívoco da recorrente a invocação do caso julgado no acórdão de 2/6/94. O que aqui o STJ decidiu foi um indeferimento liminar de pedido de restituição provisória da posse, ordenando o seguimento do processo para inquirição de testemunhas e decisão (vd aquela sentença do STA e artigo 383.º, 1 e 4 artigo 393.º do CPC).
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) - O despacho impugnado, como dele se lê, e se confirma no processo instrutor, tem todos os elementos de identificação do bem em causa, do proprietário, do fim da expropriação, justifica a urgência, está fundamentado, não lhe faltando qualquer elemento exigível.
Vd. o texto da DUP, o DL 314/2000, de 2/12, v. gr. Os artigos 6.º e 7.º, o processo instrutor, o artigo 103.º, 1, al. a) do CPA.
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) - O acto recorrido, como resulta das conclusões anteriores, não violou os princípios da justiça, igualdade e proporcionalidade, nem determinou sacrifício imotivado e arbitrário dos bens da recorrente.
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4.
Também a recorrida particular contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões: 1.ª) - A recorrente não possui qualquer título que legitime a ocupação da parcela objecto do acto recorrido, pelo que não se enquadra no conceito de interessado constante do artigo 9º do Código das Expropriações, não possuindo qualquer interesse pessoal, directo e legítimo que justifique a impugnação do acto recorrido, sendo, consequentemente, parte ilegítima no presente recurso contencioso de anulação, devendo ser decretada a absolvição da instância, de acordo com o disposto nos artigos 493º, n.º 1...
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