Acórdão nº 01134/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Outubro de 2004
Magistrado Responsável | JOÃO BELCHIOR |
Data da Resolução | 19 de Outubro de 2004 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo (STA): I - RELATÓRIO A..., com os sinais dos autos, recorre para este Supremo Tribunal Administrativo, do despacho nº 23/SET/2003, de 17 de Abril de 2003 (ACI), do Secretário de Estado do Turismo, que negou provimento ao recurso hierárquico que para esta entidade (ER) interposto da decisão do Inspector-Geral de Jogos, que lhe aplicou a coima de 4.000 Euros, imputando-lhe vícios de violação de lei.
Na sua resposta, a autoridade recorrida invocou a questão prévia de erro na forma de processo e a incompetência do tribunal, visto que, e em resumo, estando em causa uma decisão da autoridade administrativa que aplicou uma coima, o regime aplicável é o dos artº59º e seguintes do DL 433/82, de 27.10 (ilícito de mera ordenação social), sendo o tribunal judicial da comarca o competente.
Quanto ao mérito, sustentou o não provimento do recurso.
Notificado, nos termos do artº54º da LPTA, veio o recorrente afirmar que o acto administrativo foi praticado ao abrigo do DL 314/95, de 24 de Novembro (alínea f) do nº 1 do artº 40º), sede em que as infracções aqui em causa são qualificadas como administrativas.
O Digno Magistrado do Ministério Público neste Supremo Tribunal pronunciou-se pela improcedência da aludida questão prévia, em virtude de, e em resumo, ser o aludido DL 314/95 a qualificar a conduta em causa como infracção administrativa sujeita a regime próprio, designadamente no que tange à punição, ali se prevendo como e para quem se recorre da medida punitiva, bem como o modo de cobrança das multas não pagas voluntariamente (artºs 38º e 39º), sendo que só os artºs 41º e 45º se referem às contra-ordenações, estas sim puníveis com coimas.
Por despacho do relator, foi o conhecimento da aludida questão relegado para ulterior decisão.
Notificados os intervenientes processuais para produzirem alegações, ao abrigo do artº 67º do RSTA, fizeram-no o recorrente e o recorrido.
Nas suas alegações o recorrente formulou as seguintes conclusões: "- A Inspecção-geral de Jogos acusou, em processo administrativo com o nº 6.9.2.13.18/02 o recorrente da falta dos documentos comprovativos do pagamento mensal à segurança social referente ao mês de Abril de 2002, das dívidas ao Estado e ao CRSS que deveria ter sido efectuado até ao último dia do mês de Maio seguinte.
- A IGJ, em sede de decisão, entendeu que o recorrente, com tal omissão, cometeu uma infracção que consideraram como muito grave, foi o mesmo condenado ao pagamento de uma coima de € 4.000.
- Não conformado com tal decisão foi interposto recurso hierárquico para o ex. Sr. Secretário de Estado de Turismo que, por despacho 22/SET/03 de 1/04/03, concordou com os termos e com os fundamentos do parecer junto aos autos, não concedendo provimento aquele recurso.
- Desta decisão versa o presente recurso contencioso, na medida em que e salvo o devido respeito, entende o recorrente que não era competência da IGJ, a aplicação das coimas pelos factos vertentes na nota de culpa.
- A nota de culpa constam factos em que o recorrente é acusado de não ter exibido os documentos comprovativos do pagamento mensal à segurança social referente ao mês de Abril de 2002, das dívidas ao Estado e ao CRSS que deveria ter efectuado até ao último dia do mês de Maio seguinte.
- A integração como infracção muito grave prevista na alínea H) do nº 3, do artigo 38º, dada pela entidade que aplicou a multa, diz respeito a matéria que agora está directamente atribuída à Direcção Geral de Finanças.
- Deste modo, ao condenar o arguido violou o disposto no artigo 31º do DL 314/95, em harmonia com o disposto no artigo 31º nº 2 do Regulamento de Exploração do Jogo do Bingo (REJB).
- Ao aplicar sanções, através dos presentes processos, o recorrente está a ser penalizado duas vezes pela prática da mesma infracção.
- Isto porque as entidades que fiscalizam directamente o cumprimento das obrigações em causa, nomeadamente a Direcção Geral de Finanças, tem, como não poderia deixar de ser, a desencadear os respectivos, processos, tendentes à cobrança coerciva, por um lado, e por outra à respectiva penalização do recorrente pelo incumprimento.
- Conforme se descrimina extensivamente nas presentes alegações com a referência aos respectivos processos.
- Temos de considerar aqui os princípios básicos que nos levam aos institutos da litispendência e do caso julgado.
- Assim, como tem vindo a IGJ, a instaurar um processo administrativo, por cada mês, a que se reporta a nota de responsabilização, sem se contemplar as figuras do crime continuado e a conexão de processos.
- Todos estes factores devem ser considerados quando se está a aplicar, em média, por estes factos, uma multa de € 4.000 por mês, não tendo em consideração na aplicação desta pena o cumprimento da obrigação constante da acusação por parte do arguido, na pendência deste processo.
- E muito principalmente porque o recorrente não é uma empresa com fins lucrativos, mas tão só uma agremiação desportiva com um fim eminentemente social.
- Factor que deve ser considerado por quem julga, para que o recorrente continue a cumprir com as suas obrigações, para assim poder cumprir com a sua finalidade de proporcionar aos adeptos do desporto a sua prática.
- Isto posto não resta alternativa ao recorrente a de apelar, como se disse, para a compreensão de quem de direito, para o ajudarem a fazer face a estes obstáculos, de forma a poder desempenhar na sociedade portuguesa o papel que vem desenvolvendo há muitas décadas." A Entidade Recorrida, tendo também alegado, apresentou as seguintes conclusões: "1. O acto recorrido determinou a aplicação de uma coima ao recorrente, em processo de contra-ordenação.
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Assim e nos termos do Dec.Lei nº 433/82, deveria o ora recorrente ter impugnado judicialmente a decisão que lhe aplicou a coima, através de recurso a ser julgado pelo tribunal judicial da comarca onde ocorreu a alegada infracção.
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Há, pois, no presente recurso, erro na forma de processo e incompetência do Tribunal.
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Pelo que nunca poderia proceder este recurso.
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Não estamos no caso em apreço perante infracção sob a forma continuada, mas sim perante várias infracções justificativas da instauração de vários processos.
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Não ocorrendo caso julgado nem litispendência.
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Nunca podendo, pois, em qualquer caso ser dado provimento ao recurso." A Exm.ª Procuradora-Geral-Adjunta neste Supremo Tribunal, através do seu parecer de fls. 67 pronunciou-se pelo improvimento do presente recurso nos seguintes termos: "Questões idênticas às que vêm suscitadas no presente recurso contencioso foram já apreciadas em acórdãos proferidos noutros recursos que seguiram termos neste STA, relativos a situações idênticas, em que o recorrente é o mesmo. -cfr os acórdãos de 2004.06.24, no processo na 1131/03-11, de 2004.06.29, no processo na 1161/03-12, e, de 2004.06.24, no processo na 1445/03-11.
Em todos estes arestos se decidiu pela improcedência da censura dirigida aos actos contenciosamente impugnados.
Atenta a fundamentação em que se apoiaram essas decisões, e, não se vendo razão para uma alteração da orientação que tem vindo a ser tomada, emitimos parecer no sentido do improvimento do presente recurso contencioso." Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
II.FUNDAMENTAÇÃO II.1.
Face ao que resulta dos autos e do processo instrutor apenso consideram-se provados os seguintes FACTOS (Mª DE Fº):
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Em 6-7-02, foi levantado o Auto de Notícia, que consta de fls. 4 do processo instrutor, cujo teor aqui se dá por reproduzido, onde se refere, designadamente, que o agora Recorrente não tinha procedido à entrega na Inspecção-Geral de Jogos, "(…) nas...
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