Acórdão nº 0103/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Outubro de 2004

Magistrado ResponsávelSÃO PEDRO
Data da Resolução12 de Outubro de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo 1. Relatório A..., e outros, identificados nos autos, recorreram para este Tribunal da sentença proferida no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa que julgou improcedente a ACÇÃO ORDINÁRIA proposta contra a CÂMARA MUNICIPAL DE CASCAIS, formulando as seguintes conclusões: a) a douta sentença recorrida enferma de erro de julgamento ao decidir que, verificados os demais pressupostos da responsabilidade civil, faltaria o nexo de causalidade entre o facto ilícito culposo, fundada na hipotética relevância negativa de uma causa virtual que a decisão veio a afirmar existir e que consistia no facto de entender que os danos reclamados (v. g. desvalorização dos imóveis por proximidade excessiva, gastos em materiais com vista a evitar a devassa, nomeadamente no último piso), sempre se verificariam caso o edifício do lote 19 tivesse sido devidamente implantado (isto é, com menos 2 pisos - cerca de 6 metros de altura - ou com os mesmos pisos e a cerca de 17 metros e não aos cerca de 11 metros verificados); b) a douta sentença enferma de erro de julgamento quando vem afirmar que, afinal, é completamente indiferente em sede de responsabilidade civil aquiliana dos entes públicos, que um edifício cumpra as normas de afastamento contidas nos art.ºs 59º e 62º do RGEU, ou pelo contrário não as cumpra, porquanto, mesmo que em cima do edifício vizinho, este último sempre seria afectado na mesma forma e na mesma medida pela implantação a distância correcta, ou qualquer outra; c) é óbvio e patente para qualquer observador imparcial que não se verifica aqui a "conditio sine qua non" da relevância negativa da causa virtual, tal como prevista no art. 566º do C.Civil - que o dano determinado pela causa real, se produzisse sempre e em qualquer caso, da mesma forma e com a mesma intensidade, por força de uma causa virtual dada por assente, isto é, que a causa real fosse irrelevante para a produção do dano concreto verificado, cuja medida se virá a apurar em sede de execução de sentença; d) é patente que assim não sucede no caso vertente, nem tal resulta demonstrado pela ré, ou por presunção judicial decorrente da normalidade das coisas, ferindo a mais elementar sensibilidade jurídica afirmar que é irrelevante o facto ilícito culposo de colocar um edifício a 1 ou a 11 metros, quando as normas do RGEU que protegem interesses gerais de salubridade e segurança e, reflexamente, os interesses dos proprietários de imóveis, determinam que o prédio deveria distar 6 ou 17 metros; e) ou seja, contrariamente ao decidido, as questões colocadas pela douta sentença, caso fossem procedentes e não o são, apenas poderiam interferir com a medida da indemnização, facto a averiguar em sede de execução de sentença e não em aferição da verificação dos pressupostos da responsabilidade civil; f) a douta sentença enferma de erro de julgamento ao concluir pela não verificação de causalidade adequada com os fundamentos invocados, pois, como refere Antunes Varela, constitui doutrina assente que "a causa virtual do dano não destrói a relação de causalidade (adequada) entre a causa real e o dano(…) o que interessa à causalidade (ao nexo de causalidade relevante em direito) não é o dano, abstractamente considerado (…) mas o dano concreto (…). Daí que logicamente se aceite que a sede própria da relevância negativa da causa virtual se situa, não no domínio do nexo causal, mas no capítulo da extensão do dano a indemnizar - Antunes Varela, Das Obrigações e, Geral, Vol I, 6º Edição, Coimbra, 1989, pág. 989/899.

g) a douta sentença vai contra a factualidade assente e muito para além do que seriam juízos de normalidade de coisas em sede de irrelevância absoluta da causa virtual, uma vez que é impossível afirmar, num juízo de normalidade de coisas e contrariamente ao decidido, que a excessiva proximidade do prédio do lote 19, não provoca um emparedamento e ensombramento superior e em excesso ao permitido por aquelas normas legais, daquele que provocaria se estivesse `distância regulamentar do prédio dos autores ? E, por essa via, diminuindo para além do permitido as condições de insolação e salubridade, desvaloriza mais as fracções dos autores do que, hipoteticamente desvalorizaria, caso estivesse implantado à distância correcta ? h) e se é óbvio que assim é, não existe a irrelevância inquestionável da causa real, para a hipotética causa virtual, na produção ou medida do dano, que teria de se verificar para excluir a indemnização (medida e não existência) ? i) salvo o devido respeito, é patente o erro de julgamento em que incorreu a douta sentença recorrida, porquanto, nem se verifica a total e manifesta irrelevância do facto danoso real e provado na produção dos danos invocados, por efeito de qualquer causa virtual com relevância negativa, nem a matéria de facto dada como assente no permite; j) os factos ilícitos e culposos dados como provados, foram causa adequada da produção dos prejuízos reclamados na presente acção, pelo que se verifica também este último requisito da responsabilidade civil, ou seja, o nexo de causalidade entre o facto ilícito e os danos apontados (art. 563º do Cód. Civil).

Termina pedindo a revogação da sentença e a condenação do réu no pagamento da indemnização por factos ilícitos no montante que vier a ser liquidado em execução de sentença.

O recorrido nas suas contra-alegações defende a manutenção da...

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