Acórdão nº 01679/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Junho de 2004

Magistrado ResponsávelBRANDÃO DE PINHO
Data da Resolução23 de Junho de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do STA: Vem o presente recurso jurisdicional, interposto pelo MINISTRO DAS FINANÇAS, do acórdão do TCA, proferido em 18/02/2003, que concedeu provimento ao recurso contencioso que A.... havia deduzido contra o despacho do Ministro das Finanças, de 31/12/1999 que lhe havia indeferido o pedido de "isenção total de retenção na fonte de IRC relativamente a juros de capitais provenientes do estrangeiro representativos de empréstimos", ao abrigo do art. 36º (actual art. 27º) do EBF.

Fundamentou-se a decisão na não confirmatividade do acto contenciosamente recorrido, dada a alteração na composição da colectividade accionista da requerente (credores não residentes), pelo que aquele é lesivo de direitos; em que a transmissão dos créditos, por suprimento, não implica a mudança do regime legal originário no que importa ao beneficio da isenção de tributação dos juros já que "tanto a cessão da posição contratual como a cessão de créditos ... configuram meros casos de modificação substitutiva da relação jurídica constituída" sendo, por isso, destituídas de eficácia inovatória", desde que obviamente se continue a tratar de credores não residentes, como é o caso, sendo que, nos termos do art. 13º do EBF "a modificação subjectiva na relação jurídica de suprimento envolve, paralelamente, a modificação subjectiva da relação de isenção na pessoa do cessionário, na medida em que se verificam os pressupostos" respectivos.

A autoridade recorrente formulou as seguintes conclusões: "1- O douto Acórdão recorrido fez uma errada interpretação da matéria fáctica constante dos autos, deixou de se pronunciar sobre questões que deveria ter apreciado, para além de, ao ter apreciado questão não suscitada pela recorrente no seu pedido, ter incorrido em excesso de pronúncia, tendo em todo o caso, sem conceder, feito uma incorrecta interpretação e aplicação da lei aos factos.

2- No que se refere à natureza confirmativa do acto recorrido, contrariamente ao afirmado no douto acórdão recorrido, verifica-se a alegada correspondência dos elementos constitutivos de ambos os actos (o acto recorrido e o proferido em 10/02/1999), pois não obsta à relação de confirmatividade a circunstância derivada da alteração na composição da colectividade accionista da então requerente.

3- Na verdade, o que releva para efeito de delimitação dos elementos constitutivos de ambos os actos é o seu reporte ao elemento legal "juros de capitais provenientes do estrangeiro".

E com esse exacto alcance, as decisões proferidas têm idênticos pressupostos fácticos e produzem idênticos efeitos jurídicos.

4- A recorrente imputou ao acto recorrido "vicio de violação das regras dos artigos 4º, 11º e 36º do EBF" e o douto acórdão recorrido decidiu que o despacho recorrido padecia de vicio de violação de lei relativamente aos pressupostos estabelecidos nos artigos 11º, 13º, n.º 3 e 36º do EBF.

Ou seja, pronunciou-se no sentido de a decisão recorrida estar inquinada por vicio não alegado pelo recorrente.

A violação da proibição estipulada no n.º 2 do artigo 660º do CPC determina a nulidade do acórdão por excesso de pronúncia, nos termos da 2ª parte da alínea d) do artigo 668º do CPC ou, no caso de assim se não entender, por conhecimento de um pedido diferente do formulado (al. e) do n.º 1 do artigo 668º do CPC).

5- A matéria de facto apurada no douto acórdão recorrido apenas permitia concluir o que a AF concluiu: que, embora a requerente pretendesse que as posições para as quais requereu a concessão dos benefícios fossem claras e bem delineadas juridicamente, o certo é que, dos respectivos elementos trazidos aos autos, ressaltavam posições confusas de accionistas que se apresentavam a conceder empréstimos sem que, anteriormente, realizassem o respectivo capital subscrito, que continuava em situação devedora. A falta de realização de capital constituía o(s) accionista(s) em devedores da recorrente que, por outro lado, pretendiam, também, ser credores de financiamentos que até nem seriam superiores aos montantes de capital em dívida.

Inexistem novos contratos à data de 6 de Dezembro de 1996, o que denuncia a inexistência de qualquer empréstimo nessa data.

Os elementos apresentados para demonstração da origem dos capitais são irrelevantes, contrariamente ao decidido no douto acórdão recorrido, na medida em que a matéria controvertida se reporta às constantes alterações verificadas nas entidades de origem nacional que, no financiamento intercalar, disponibilizaram capitais e posteriormente transferiram as suas posições para as entidades não residentes.

Assim sendo, por inexistência de contratação de quaisquer novos empréstimos, e por falta de comprovação das situações invocadas pela recorrente, fica por apurar o cabal preenchimento dos pressupostos do beneficio fiscal requerido.

6- O douto acórdão recorrido fez uma incorrecta apreciação da matéria de facto constante dos autos (ao considerar estarem verificados os pressupostos estabelecidos no artigo 36º do EBF) pelo que padece de vicio de violação de lei por erro de facto quanto aos pressupostos de aplicação do mesmo artigo.

7- O douto acórdão recorrido encontra-se ferido de nulidade, por violação do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 668º do CPC, por falta de pronunciamento sobre factos e sua relevância jurídica invocados pela Administração Fiscal.

Com efeito, o douto acórdão recorrido não se pronuncia sobre a relevância da inexistência de contratação de quaisquer novos empréstimos, nos montantes mencionados, à data de 6 de Dezembro de 1996.

8- O acórdão recorrido ao considerar que o despacho sob recurso incorre em vicio de violação de lei por erro sobre os pressupostos de facto e de direito relativamente aos pressupostos estabelecidos no artigo 13º, n.º3, do EBF, faz uma incorrecta interpretação e aplicação da lei aos factos.

A natureza constitutiva da referida autorização apenas permite a aferição da sua legalidade (e consequente sindicância judicial) com fundamento em desvio de poder, nos termos do preceituado no artigo 19º da LOSTA.

Pelo que, o douto acórdão padece de vicio de violação de lei por erro de direito quanto aos pressupostos de aplicação do artigo 13º, n.º 3, do EBF.

Nestes termos e nos mais de direito, que V. Ex.as sabiamente, como sempre, suprirão, deve ser concedido provimento ao presente recurso e declarada a nulidade do douto acórdão recorrido ou, no mínimo, ser ele anulado." E contra-alegou a A..., no sentido da manutenção do aresto recorrido.

O Exm.º magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido da ampliação da matéria de facto, nos termos do art. 712º, n.º 4 do CPC, pois, podendo a isenção de IRC do art. 36º do EBF poder ser concedida pelo Ministro das Finanças, dos juros de capitais mutuados no estrangeiro, reportada - seu art. 11º - à data da verificação dos respectivos pressupostos, importa averiguar, para decidir das questões postas no recurso, "quais as entidades mutuárias não residentes e a data ou datas da concretização dos mútuos" bem como estabelecer - art. 13º, n.º 3 - "se o Ministro das Finanças autorizou ou não as sucessivas transmissões de benefícios fiscais", matéria factual omissa no probatório da decisão recorrida, não obstante a descrição abundante da "engenharia financeira da movimentação accionista dos mutuantes nacionais e estrangeiros, ou melhor, residentes e não residentes".

E, corridos os vistos legais, nada obsta à decisão.

Em sede factual, vem apurado que: 1- A A..., ora recorrente, tem por objecto social a "concepção, operação e exploração de centrais termoeléctricas," - CRC de Lisboa, matricula nº 5489/941125 - doc. 1 do proc. adm. apenso; 2- A Recorrente é titular de licença vinculada de produção de energia eléctrica atribuída pela DG de Energia em 22.JAN.95 nos termos dos arts 9º nº 1 a) e 11º n.º 2 DL 99/91, de 2.3, na central termoeléctrica de ciclo combinado a gás natural localizada na Tapada do Outeiro, freguesia de Medas, concelho de Gondomar - doc. 2 do proc. adm. apenso; 3- Em 23.4.96 a Recorrente requereu ao abrigo do disposto no art. 36º EBF a isenção total de retenção na fonte em sede de IRC "(..) relativamente aos juros devidos e pagos pela Requerente às seguintes entidades: a) Aos seus accionistas, directos e indirectos, não residentes em Portugal quanto aos juros resultantes do seu financiamento directo à Requerente, conforme referido no Anexo 1; [..., ..., ...] b) Aos seus accionistas B... e C... em relação aos juros devidos por estas à ..., e utilizados pelos primeiros para financiamento da Requerente, ou seja, financiamento indirecto da ... à Requerente, conforme referido no Anexo 1; c) Aos bancos não residentes nas condições referidas no parágrafo 20, conforme constam do Anexo 2, envolvidos no financiamento da requerente, levando-se desde já em conta a possibilidade de transferência de posições contratuais destas instituições de crédito, bem como eventualmente BEI e do KfW, para outras instituições de crédito, tais como as referidas no Anexo 3" - doc. n.º 5, fls. 57/64 dos autos; 4- Nos parágrafos 13, 14, 15 e 16 do requerimento de 23.4.96 diz-se: "13. O capital social da Requerente encontra-se actualmente distribuído em 74% dos accionistas que são sociedades não residentes para efeitos fiscais em Portugal e 26% por accionistas que o são. Assim, a estrutura accionista da Requerente é a seguinte: ... 59% ... 10% ... 5% B... 10% ... 10% C... 6% 14. Para efeitos do presente requerimento importa, apenas, reter quais as sociedades que não possuem nem sede social nem direcção efectiva em território português: ..., sociedade residente na Holanda (anteriormente a participação na Requerente era detida pela ..., sociedade residente no Reino Unido e accionista fundador da mesma) sendo, esta directa ou indirectamente detida pela ..., ... e a ..., ambas sociedades residentes na República Federal da Alemanha; por só aos juros dos capitais por estas emprestados à Requerente ser aplicável a isenção prevista...

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