Acórdão nº 0999/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Março de 2004
Magistrado Responsável | FREITAS CARVALHO |
Data da Resolução | 25 de Março de 2004 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam em conferência na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo I. O Exm.º Magistrado do Ministério Público interpõe recurso da sentença de 10-12-2002, do Tribunal Administrativo do Círculo de Coimbra que, na acção de reconhecimento de direito ou interesse legítimo proposta em representação de ..., identificado nos autos, julgou a Ré Secretária de Estado da Segurança Social parte ilegítima, absolvendo-a da instância, procedente a questão prévia da inidoneidade do meio, absolvendo o Réu Administrador Delegado do ISSS, e improcedente a acção absolvendo o mesmo Réu do pedido.
O recurso vem interposto apenas da parte da sentença que julgou procedente a questão prévia e improcedente a acção.
O Magistrado recorrente termina a sua alegação formulando as conclusões seguintes : 1ª. A acção para reconhecimento de direito é o meio próprio, adequado e necessário para cabal defesa dos interesses do representado pelo Ministério Público, interesses esses que, pela simples interposição de recurso contencioso de anulação do acto que lhe fixou a pensão de aposentação, nunca seriam integralmente acautelados, sendo que o Ministério Público, neste caso, age em posição diferente da do representado.
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Com a publicação dos Decs. Lei nºs 335/90, de 29/10 e 45/93, de 20/02, foi reconhecido, no âmbito do sistema de Segurança Social Português, os períodos contributivos verificados nas Caixa de Previdência das ex-colónias, como a Caixa do Pessoal dos Caminhos de Ferro de Benguela, aos seus pensionistas, quer fossem, ou não, pensionistas do regime geral.
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De acordo com o estabelecido no art. 2º, do DL. nº 335/90, com esse reconhecimento tem-se em vista, não só o registo desse período contributivo, mas também a atribuição àqueles pensionistas de uma pensão no âmbito da Segurança Social Portuguesa.
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A atribuição dessa pensão, e não só do reconhecimento desses períodos contributivos, a conceder àqueles pensionistas da Caixa de Previdência do Pessoal dos Caminhos de Ferro de Benguela, resulta expressamente do preâmbulo e da norma I do Despacho nº 16-I/SESS/94, de 24/02, do Secretário de Estado de Segurança Social.
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Extrai-se da norma III do mencionado Despacho nº 16-I/SESS/94 que a atribuição dessas pensões requeridas ao abrigo dos Decs. Lei nºs 335/90 e 45/93 se reportam a 01.01.94 ou à data do requerimento, se apresentado em data posterior.
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Todos os pensionistas da CPP/CFB, quer fossem ou não do regime geral, requereram reconhecimento do período contributiva a fixação da pensão ao abrigo dos Decs. Lei nºs 335/90 e 45/93 e do Despacho nº 16-I/SESS/94, pelo que devia ser-lhes atribuída pensão autónoma, correspondente ao período de trabalho prestado em Angola, de acordo com o único critério legal fixado nos referidos diplomas.
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Tais pensões, uma vez que foram requeridas e fixadas depois de 01.01.94, quando já estava em vigor o DL. nº 329/93, de 25/09, deveriam ter sido calculadas nos termos deste diploma e da Portaria nº 183/94, de 31/03.
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Aos pensionistas do CPP/CFB e do regime geral, portanto, não deveria ter sido calculada e fixada uma pensão nos termos do art. 80º, do Decretado nº 45 266, de 23/06/1963, na redacção dada pelo Decreto nº 486/73, de 27/09, aliás, então revogadas pelo DL. nº 329/93.
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Sendo este regime do DL. nº 329/93 o aplicável às prestações requeridas ou promovidas oficiosamente após a sua entrada em vigor em 01.01.94, como o foram as pensões requeridas pelos pensionistas representados pelo Ministério Público.
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Pelo que, o CNP, neste caso concreto do aqui representado, deveria ter procedido ao cálculo da respectiva pensão em função dos períodos contributivos feitos para a CPP/CFB, tendo em conta os salários reais actualizados pela Portaria nº 183/94, de 31/03 e os dez melhores anos dos últimos quinze anos de descontos que aquela Caixa apresentou no CNP, pensão esta a acumular com a pensão correspondente à que foi fixada pelo CNP, relativa ao trabalho prestado em Portugal, tal como determina o art. 55º, do Decreto-Lei nº 329/93, de 25/09.
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A douta sentença recorrida, ao decidir-se pela procedência da excepção da impropriedade do meio processual utilizado - de acção para reconhecimento de direito - violou o disposto no art. 69º, da LPTA e o art. 268º, nº 4, da CRP (princípio da tutela jurisdicional efectiva).
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A douta sentença recorrida, ao decidir-se, quanto ao seu mérito, pela improcedência da acção, violou o disposto no art. 2º do Decreto-Lei nº 334/90, de 29/10, arts. 55º e 97º, al. a), do Decreto-Lei nº 329/93, de 25/09, art. 1º, do Decreto-Lei nº 45/93, de 20/02, e o Despacho nº 16-I/SESS/94, de 24/02, bem como os princípios, consagrados na Constituição, da igualdade e da justiça (arts. 13º e 266º, nº 2, da CRP, 5º e 6º do CPA), e do direito à segurança social no cômputo de todo o tempo de trabalho na fixação das pensões por velhice e invalidez (art. 63º, nºs 1 e 5, da CRP).
O Instituto de Solidariedade e Segurança Social ISSS apresentou contra-alegações a fls. 401 e seg.s concluindo-as da seguinte forma : 1 . A presente acção foi intentada para ser reconhecido ao Autor reformado da CPP/CFB uma pensão autónoma liquidada pela Segurança Social de acordo com o período contributivo que descontou para essa Instituição (Caixa de Benguela) até 11/11/75 e calculada de acordo com o DL 329/93.
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Que aquela pensão seja acumulada com a eventual pensão que já teria do regime geral da Segurança Social Portuguesa, tal como determina o artº 55º do DL 329/93.
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Todavia, tal pretensão não é possível por violar a letra e o espírito da Lei.
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1. O Despacho 16-I/SESS/94 apenas estabeleceu um conjunto de orientações, permitindo, em 1994, o reconhecimento dos períodos contributivos dos pensionistas de invalidez e velhice da CGF de Benguela, nos termos do DL 335/90, de 29/10, com a redacção do DL 45/93, de 20/2.
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2. O reconhecimento dos períodos contributivos pelo sistema de Segurança Social português, não se destina à atribuição duma pensão autónoma, mas sim ao preenchimento ou alteração da carreira contributiva do beneficiário no regime geral, relevante para a atribuição futura de pensões (artº 2º do DL 335/90) ou melhoria das pensões já atribuídas (mesmo artigo conjugado com o DL 45/93).
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O erro inicial que em opera o M.P. tem sido o entendimento que o DL n.º 335/90, de 29/10, pretendeu atribuir uma pensão autónoma aos ex-residentes nas ex-colónias pelo tempo de descontos nas Caixas de Previdência de inscrição obrigatórias desses territórios.
6 .Não é isso que resultou quer do DL n.º 335/90, quer do DL n.º 45/93, de 20/02, quer do DL n.º 401/93, de 3/12.
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O que resulta claramente deste bloco legal é o que muito bem foi esclarecido no Acórdão proferido em 5/6/02, no processo n.º 267/02, da 1ª Secção, 3ª Subsecção, que se transcreve pela sua acuidade, a seguinte parte: "....Ante o exposto, podemos concluir que, na generalidade, o enquadramento legal do problema do não pagamento das pensões devidas a cidadãos residentes em Portugal por instituições de previdência das ex-colónias não incluía a solução de ser a segurança social portuguesa a assumir a divida dessas entidades, satisfazendo, na vez delas, as exactas prestações em falta. O que o dito regime legal institui, foi a possibilidade de se atender aos períodos contributivos ocorridos nesses territórios, como se eles tivessem acontecido em Portugal, caso em que eles acresceriam ao tempo dos descontos porventura realizados para a segurança social portuguesa, confluindo para uma única pensão. Portanto, e até à luz do estatuído no art.º 55º do DL n.º 329/93, de 25/9, carece de base legal a pretensão, acolhida na sentença «sub censura», de que o CNP era obrigado a pagar ao ora recorrido uma pensão correspondente à que a CPPCFB lhe deveria normalmente prestar, a qual seria acumulável com a pensão que também lhe seria devida pelas contribuições relacionadas com o seu trabalho em Portugal." 8. É um facto indiscutível que este Despacho não foi publicado no D.R. e, sempre foi entendido pela Administração, que se tratava de um mero regulamento interno que, apenas, determinava o "modus faciendi", como devia actuar, face ao não pagamento das pensões aos seus reformados pela Caixa de Previdência de Pessoal dos Caminhos de Ferro de Benguela.
9 . Em abono desta tese, vide recente Acórdão do STA, proferido no proc. n.º 47 479 - da 1ª Secção / 1ª Subsecção, e que corrobora este princípio.
Pela sua acuidade transcreve-se a seguinte parte, pág. n.º 15 : " ... Independentemente da questão da determinação do seu valor normativo - não tendo sido publicados na forma legalmente exigida, são meras instruções aos serviços, no uso dos poderes de superintendência, sem valor regulamentar externo, logo insusceptíveis de fundar directamente direitos e obrigações judicialmente exigíveis".
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Assim, o reconhecimento destes períodos contributivos pelo sistema de Segurança Social Português, não se destinava à atribuição de qualquer pensão autónoma, mas sim: A .1.) - atribuição futura de pensão (artº 2º do DL n.º 335/90) ; A . 2.) - melhoria de pensão já atribuída, com a necessária totalização de todos os descontos efectuados em Portugal com os descontos, também, efectuados, enquanto trabalhadores, no activo, para a CPP/CFB.
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Consequentemente, não houve qualquer diferença de tratamento entre beneficiários, mas a...
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