Acórdão nº 01977A/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Março de 2004

Magistrado ResponsávelANGELINA DOMINGUES
Data da Resolução24 de Março de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na 1ª Secção, 3ª Subsecção do Supremo Tribunal Administrativo 1.1. D.C.N. Internacional (id. a fls 2), notificada da Resolução do Conselho de Ministros nº 183/2003, de 6 de Novembro de 2003, adiante melhor identificada, veio, nos termos do nº 3 do artº 2º e do nº 1 do artº 5º, ambos do DL 134/98, de 15 de Maio, na redacção que lhe foi dada pela Lei nº 4-A/2003, de 19 de Fevereiro, apresentar o Requerimento de Medidas Provisórias, de fls 2 a 64, inc, o qual concluiu formulando os seguintes pedidos: "

  1. Deve ser intimado o Governo, em Conselho de Ministros, na pessoa de Sua Excelência o Senhor Primeiro-Ministro, para que seja suspenso o procedimento tendente a contratar no âmbito do PRAS, de modo a que não sejam celebrados com o adjudicatário escolhido os contratos a que alude o artigo 34.º do PRAS, bem como de outros contratos ou acordos a que alude o n.º 3 da Resolução do Conselho de Ministros n.º 183/2003 e para que promova os actos e as diligencias necessários, nomeadamente, junto de Sua Excelência o Senhor Ministro de Estado e da Defesa Nacional, no sentido de serem suspensas todas as diligências com vista à celebração dos referidos contratos, até ao trânsito em julgado do recurso contencioso de anulação da deliberação de adjudicação; b) Subsidiariamente, caso os contratos a que alude o artigo 34.º do PRAS, bem como outros contratos ou acordos a que alude o n.º 3 da Resolução do Conselho de Ministros n.º 183/2003, já tenham sido celebrados, deve o Governo, em Conselho de Ministros, na pessoa de Sua Excelência o Senhor Primeiro-Ministro, ser intimado para que não sejam praticados quaisquer actos em execução dos referidos contratos." Invoca como fundamento do pedido, no essencial, o seguinte: O acto de adjudicação constante da Resolução do Conselho de Ministros nº 183/2003 é inválido por padecer de diversos vícios: Não ter sido realizada a fase de audiência prévia nos termos legalmente exigidos, não permitindo à Requerente o exercício do seu direito de audiência prévia (artºs 23º a 62º); Ilegal realização de uma nova fase de avaliação das propostas, que não se encontra prevista ou sequer pressuposta no Programa Relativo à Aquisição de Submarinos destinados à Marinha Portuguesa (PRAS) (artºs 63º a 94º inc.); Substituição ilegal do Submarino inicialmente apresentado pelo concorrente ..., infringindo-se os princípios da estabilidade ou inalterabilidade das propostas (artºs 95º a 99º); Desvio de poder (artºs 100º a 102º); Inexistência do Submarino proposto pelo ... (artº 103º e 104º); Avaliação ilegal das propostas - insuficiente e deficientemente fundamentada, padecendo de inúmeros erros e contradições e "de graves violações dos princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da boa fé, da transparência, entre outros".

A deliberação da adjudicação veio lesar direitos e interesses legalmente protegidos da Requerente, porque padece de várias ilegalidades que afectam a regularidade e legalidade do procedimento concursal no âmbito do qual foi tomada, elimina as suas enormes probabilidades de adjudicação, contrariando as legítimas expectativas de ver classificada em 1º lugar a sua proposta e de assim obter o lucro esperado e o prestígio empresarial que decorreria da adjudicação.

Em virtude da prática da decisão em causa, a Requerente ver-se-á impossibilitada de fornecer os Submarinos objecto da adjudicação, sendo o valor da adjudicação a que se propôs, e para o qual se encontrava especialmente preparada e habilitada, 800.000.000,00 Euros, o que representa 40% da sua facturação anual Por outro lado, não poderá ser invocada qualquer consequência negativa para o interesse público no atraso da conclusão do processo de concurso com o decretamento das medidas provisórias, uma vez que o recurso contencioso será processado como urgente e, face aos prazos de entrega dos submarinos objecto de adjudicação propostos pelo ..., em nenhuma hipótese ou circunstância, o fornecimento do primeiro submarino ocorrerá em prazo inferior a cinco anos, não sendo, pois, legítimo argumentar que, "estando perto do fim a vida útil dos submarinos actualmente utilizados pela Marinha Portuguesa" se mostra imperativo que os contratos previstos no PRAS sejam de imediato celebrados, para que os actuais submarinos utilizados pela Marinha Portuguesa sejam substituídos". O procedimento concursal foi lançado há mais de cinco anos, tendo a deliberação de adjudicação sido tomada em 6 de Novembro de 2003, o que só por si demonstra a falta de urgência.

A natureza urgente dos processos regulados pelo DL nº 134/98 e o respectivo regime sempre obsta à invocação de argumentos temporais, por parte das Autoridades Requeridas. (sic) Conclui que: O decretamento da medida provisória ora requerida não acarretará consequências negativas para o interesse público, ou pelo menos, e caso acarretasse, essas consequências negativas nunca excederiam o proveito a obter pela Requerente, pelo que se deverão considerar verificados os requisitos da concessão da medida provisória ora requerida, nos termos do nº 4 do artº 5º do DL 134/98, de 15 de Maio. (juntou 19 documentos) 1.2. A entidade requerida, Conselho de Ministros, apresentou a Resposta de fls. 951 a fls. 1024 inc., na qual começa por suscitar como questão prévia a ilegitimidade passiva do Conselho de Ministros, por, alegadamente, e em síntese, o órgão administrativo com competência no domínio em causa ser o Ministro de Estado e da Defesa Nacional e não o Conselho de Ministros, em relação ao qual, mesmo a competência gizada nos artºs 48º e 49º do PRAS se encontraria, na fase actual, totalmente esvaziada de conteúdo.

A procedência da aludida excepção determinaria a absolvição da instância da entidade requerida, obstando a que o Tribunal conhecesse do mérito da pretensão da Requerente, nos termos das disposições conjugadas dos artºs 494º, alínea e) e 493º, nº 2, 1ª parte do C.P.C., ex vi artº 1º da L.P.T.A.

À cautela, defende, subsequentemente, a inverificação dos pressupostos do decretamento das medidas provisórias requeridos pela A..., por não se verificarem as ilegalidades referidas pela Requerente na respectiva peça processual, pois, quer a proposta acolhida pela decisão de adjudicação dos submarinos às Requeridas particulares, quer os demais actos integrados no procedimento em análise, observaram na íntegra o regime aplicável, pelo que, conclui, é manifesta a inexistência, in casu, de fumus boni juris.

Acresce que, não se verificariam os pressupostos do decretamento da medida provisória previstos no nº 4 do artº 5º do Decreto-Lei 134/98, de 15 de Maio, por se impor a conclusão do Tribunal, em juízo de probabilidade, ponderados os direitos ou interesses susceptíveis de serem lesados, que as consequências negativas para o interesse público excederiam o proveito a obter pela requerente.

De facto, alega, em síntese, os submarinos são meios militares navais que desempenham uma gama muitíssimo importante de missões, tanto na óptica da defesa nacional propriamente dita, quanto na de outros aspectos do interesse público - vigilância e prevenção da violação da Zona Económica Exclusiva; Controlo de Navegação; Controlo e intercepção de operações ilícitas; Transporte discreto e seguro de entidades e bens de valor elevado; Dissuasão; Treino dos navios de superfície; Recolha de informações; Reconhecimento avançado; Plataforma de lançamento e de recolha de grupos de operações especiais; Protecção de forças navais de superfície; Aviso antecipado em zonas de elevado risco; Pesquisa oceanográfica (ainda que com limitações) - sendo, pela sua própria natureza, o único meio militar naval com capacidade para desempenhar todas e cada uma destas missões com tal discrição.

Seria, por isso, imprescindível a titularidade, pelo Estado, de uma esquadrilha de submarinos moderna e operacional, sendo certo que algumas daquelas missões são essenciais em tempo de paz.

E, ao invés do sugerido pela Requerente, a longa duração do procedimento pré-contratual aqui em análise, (lançado em 1998 e que só agora vê o seu termo) é sinal de zelo e diligência, dada a extrema complexidade da matéria, a sensibilidade e heterogeneidade dos interesses envolvidos e a elevadíssima expressão financeira do Programa, que recomendaram se progredisse com cautela e rigor, com vista à obtenção de better value for money. Os dois submarinos actualmente ao serviço da Marinha Portuguesa serão abatidos, por obsolescência absoluta, em 2005 (no caso do NRP Delfim, com um ciclo de vida de 36 anos após a entrada ao serviço) e em 2009 (no caso do NRP Barracuda, com um ciclo de vida de quarenta anos após a entrada ao serviço), prevendo-se que o NRP Barracuda, em especial, venha a operar entre 2004 e 2009 em condições muito próximas do limite do aceitável. A capacidade submarina depende não só da existência dos actuais submarinos até que sejam recebidos os novos, mas também da existência de condições para manter, pelo menos, um número mínimo de submarinistas habilitados, por forma a viabilizar a recepção dos futuros submarinos e o treino constante das respectivas guarnições. A suspensão do procedimento de aquisição dos novos submarinos provocaria necessariamente um hiato, sendo necessários quatro anos para recuperar o nível da capacidade perdida por cada ano sem actividade operacional submarina.

Donde se depreenderia que, dois anos sem a aludida actividade operacional - tempo de duração previsível para a obtenção de decisão transitada em julgado no recurso contencioso, mesmo urgente, em matéria desta complexidade -, poderiam significar oito anos de recuperação após a recepção de novos submarinos.

Tal hiato teria gravíssimas implicações em três níveis: Formação e treino das futuras guarnições; desempenho das missões próprias dos submarinos, atrás expostas; participação de Portugal no quadro das alianças militares em que se integra e afirmação internacional.

Por último, conclui «na eventualidade de ser decretada a medida provisória...

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