Acórdão nº 01611/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 16 de Março de 2004

Magistrado ResponsávelFERNANDA XAVIER
Data da Resolução16 de Março de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da secção de Contencioso Administrativo, do Supremo Tribunal Administrativo: I- RELATÓRIO A..., ... e ...

, com os sinais dos autos, interpõem recurso da sentença do Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa proferida em 30.04.2002 que, em cumprimento do acórdão deste STA de 01.10.98, conheceu do pedido formulado nesta acção pelos Autores, ora recorrentes, sob a alínea c) na petição inicial, de condenação solidária dos Réus a indemnizarem os Autores por outros prejuízos que vierem a ser apurados em execução de sentença, julgando-o improcedente e manteve no mais a decisão anterior do mesmo Tribunal, proferida em 19.06.1990.

Terminam as suas alegações de recurso, formulando as seguintes CONCLUSÕES: 1ª. Os Autores não teriam sofrido os prejuízos que sofreram caso o Município de Sintra e o Estado Português tivessem executado em devido tempo as obras públicas que se mostravam necessárias, segundo as regras de ordem técnica e de prudência comum que deviam ser tidas em consideração, e tivessem atempadamente tomado as medidas adequadas de fiscalização e controle que tinham o dever de praticar, facto que os constitui na obrigação de indemnizar os Autores pelos prejuízos sofridos.

  1. Os prejuízos patrimoniais sofridos pelos AA até à data da propositura da acção, em consequência da actuação ilícita e culposa do Município de Sintra e do Estado Português foram avaliados a preços de Fevereiro de 1985, em 18.391 contos.

  2. Os AA já dispensaram, até à data da propositura da acção, a quantia de 2.728 contos.

  3. Os restantes valores deveriam ter sido actualizados à data da sentença, tendo em atenção a desvalorização monetária devida à inflação- facto notório que, como tal, não carece de prova, nem de alegação, devendo no entanto ser tida em consideração para cômputo do montante de indemnização, aquando do encerramento da discussão em primeira instância (Ac. STJ de 28.02.1980, BMJ 294º, 293)- sendo o coeficiente de desvalorização da moeda a aplicar de 2,84, nos termos da Portaria nº553/2002, de 3 de Junho.

  4. A responsabilidade da Administração não pode ser diminuída com fundamento no artº 570º do Código Civil porquanto: - Não houve culpa dos lesados na produção ou agravamento dos danos; - Os proprietários dos terrenos sulcados por cursos de água apenas podem proceder à limpeza regular dos trechos a seu cargo desde que intimados pelas autoridades hidráulicas competentes para fazê-lo e não se provou que os AA tivessem sido intimados para o efeito, nem que não tivessem intimações nesse sentido.

    - Também não se provou que a falta de limpeza dos trechos que passam pelas suas propriedades tivesse motivado o estado global da Ribeira da Laje na altura dos acontecimentos.

  5. A reparação efectuada em parte dos muros marginais na propriedade dos AA foi feita no cumprimento de uma obrigação natural assumida pela Administração, pelo que as verbas envolvidas não têm que ser reduzidas ao pedido indemnizatório formulado nesta acção.

  6. Ainda que porventura assim não se entendesse, a referida verba de 4.000 contos apenas deveria ser considerada para redução do montante da avaliação por danos com a reconstrução dos muros pelo que o valor de 15.663.000$00 seria então reduzido para 11.663.000$00.

  7. Face a toda a matéria de facto dada como provada e aos 19 anos entretanto decorridos, considera-se extremamente exígua a importância de 300.000$00 fixada na sentença recorrida para indemnização pelos danos morais sofridos pelo A..., entendendo-se como mais justo e totalmente em acordo com as circunstâncias do caso, que os RR sejam condenados a pagar-lhe solidariamente a importância de 1.000.000$00, acrescida de juros legal desde a data da sentença e até efectiva e integral reparação.

  8. A douta sentença recorrida fez uma indevida interpretação e aplicação da lei, violando nomeadamente os artº 564º, 570º, 494º e 496º do Código Civil e 661º do CPC, pelo que é ilegal e deve se revogada, condenando-se solidariamente o Município de Sintra e o Estado Português: - A pagar aos AA a quantia já por eles desembolsada de Esc. 2.728.000$00 (actualmente 13,607,20 euros), como indemnização por danos patrimoniais sofridos até à data da propositura da acção, acrescida de juros legais contados desde a citação e até efectivo e integral reembolso.

    - A pagar aos AA a quantia de Esc. 44.482.920$00 (actualmente 221.879,86 euros) correspondente a 15.663.000$00x2,84 ( coeficiente de desvalorização da moeda a aplicar nos termos da Portaria nº 553/2002, de 3 de Junho) como indemnização dos restantes danos patrimoniais sofridos até à data da propositura da acção, acrescida de juros legais contados desde a data da sentença e até efectiva e integral reparação.

    - A indemnizar os AA por outros prejuízos que vierem a ser apurados em execução de sentença.

    - A pagar aos A... a quantia de 1.000.000$00 a título de indemnização por danos morais por ele sofridos, acrescidos de juros legais desde a data da decisão e até efectiva e integral reparação.

    - Em procuradoria condigna.

    *Contra-alegou o Estado Português, representado pelo Ministério Público, pronunciando-se pelo não provimento do recurso.

    Contra-alegou também o Município de Sintra, CONCLUINDO assim: 1- Bem andou a douta decisão recorrida ao repartir a responsabilidade pelos danos, nos termos do disposto no artº 570º do CC.

    2- Na verdade, as cheias ocorridas em 18 para 19 de Novembro de 1983, foram as maiores desde 1939 e, face aos registos existentes, calcularam os respectivos serviços um período de retorno de 100 anos.

    3- Dado que as indemnizações fixadas contêm juros moratórios não é possível cumular com os mesmos a correcção monetária.

    4- Dado que foram reconstruídos muros marginais da propriedade dos AA, o montante dispendido com os mesmos deverá ser deduzido ao montante indemnizatório peticionado.

    5- Afigura-se-nos ajustado, desde logo, face à medida da respectiva responsabilidade de determinarem imediatamente os prejuízos decorrentes do acto ilícito de molde a permitir que os mesmos fossem tidos em conta em sede de liquidação de sentença.

    *Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

    *II- OS FACTOS Nos termos do artº 713º, nº 6 do CPC, dão-se aqui por reproduzidos os factos levados ao probatório da sentença proferida nos autos em 19.06.90, mantida pela sentença sob recurso, para que se remete.

    *III- O DIREITO Como resulta dos autos, em 19 de Junho de 1990, foi proferida sentença pelo Mmo. Juiz do TAC de Lisboa que, apreciando a pretensão dos Autores deduzida nesta acção, julgou parcialmente procedente a acção e condenou os Réus Estado e Município de Sintra, solidariamente, a pagar aos Autores (artº 497º do CC): a quantia de 909.933$00, como indemnização por danos patrimoniais sofridos pelos Autores (e já desembolsados) até à propositura da acção, acrescidos de juros legais desde a citação até integral reembolso; a quantia de 1.220.500$00, por danos patrimoniais sofridos pelos Autores, até à data da propositura da acção, acrescida de juros legais, desde a data da sentença e até efectiva e integral reparação; e ao Autor A..., a quantia de 300.000$00, a título de danos morais, por ele sofridos (cf. fls.545 a 562).

    Recorde-se que os Autores haviam pedido, na petição inicial, a condenação solidária dos Réus a pagar-lhes: a) a importância de 2.508.924$00, por eles já desembolsada, como indemnização por danos patrimoniais sofridos até à data da propositura da acção, acrescida de juros legais contados desde a citação e até efectiva e integral reparação b) a importância de 24.206.076$00, como indemnização pelos restantes danos patrimoniais sofridos até à data da propositura da acção.

    c) indemnização por outros prejuízos que vierem a ser apurados em execução de sentença, d) a importância de 1.000.000$00, por danos morais sofridos pelo A....

    e) juros legais sobre os valores referidos de b) a d), contados desde a data da sentença e até integral reparação.

    Tal sentença veio a ser objecto de três recursos jurisdicionais, interpostos pelos Autores, pelo Réu Estado e pelo Réu Município, tendo, por acórdão deste Tribunal, proferido em 01.10.98 (cf. fls.644 a 689), sido negado provimento aos recursos dos Réus e concedido provimento ao recurso dos Autores, com fundamento em nulidade da sentença, por omissão de pronúncia sobre o pedido dos AA formulado na petição inicial sob a alínea c), ou seja, «o pedido de indemnização por outros prejuízos que vierem a ser apurados em execução de sentença», pelo que foi ali determinado « a baixa dos autos ao tribunal a quo, para aí se proceder à reforma da sentença recorrida conhecendo-se do pedido formulado pelos AA, na alínea c) de folhas 224 da sua petição», vindo, em cumprimento do referido acórdão, a ser proferida em 30.02.2002, a sentença ora sob recurso, que julgou improcedente aquele pedido e manteve, no restante, a sentença anterior de 19.06.1990 (cf. fls.726 a 728).

    Conforme se verifica da fundamentação do referido acórdão, nele se apreciou a pretensão dos Réus, de não verificação dos requisitos de responsabilidade civil (ilicitude, culpa, dano e nexo de causalidade) pelos danos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT