Acórdão nº 01389/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Fevereiro de 2004
Magistrado Responsável | COSTA REIS |
Data da Resolução | 11 de Fevereiro de 2004 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
A... e ... interpuseram, neste Supremo Tribunal, o presente recurso contencioso pedindo a anulação dos despachos conjuntos do Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e do Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças proferidos, respectivamente, em 14/03/02 e 16/03/01, os quais - concordando com os valores contidos nas informações n.ºs 73/02, 148/02 e 149/02, da DRAAL - lhes atribuiu as indemnizações definitivas devidas pelo património que lhes foi expropriado e pelos produtos florestais (cortiça) comercializados pelo Estado durante a ocupação temporária de alguns prédios que lhes pertenciam e cuja posse foi afectada em resultado da aplicação das Leis da Reforma Agrária.
Para tanto, e em resumo, alegaram : - Que a não devolução do património expropriado viola o disposto no art.º 62.º da CRP.
- Que a indemnização que lhes foi atribuída pela expropriação do solo rústico é irrisória porquanto o valor a que foi calculado o Ha não tem qualquer correspondência com o seu valor real e, porque assim, ficaram sem o justo ressarcimento dos reais prejuízos sofridos, o que constitui violação de lei.
- Que a indemnização relativa aos produtos florestais extraídos durante a ocupação dos seus prédios não foi devidamente actualizada e, por esse facto, receberam em 2002 valores correspondentes a 1975 e anos seguintes até 1988 "sem qualquer actualização ao longo do período que decorreu até ao terminus da ocupação e sem contemplar o seu valor real e corrente à data do pagamento da indemnização." .
O Sr. Ministro da Agricultura respondeu para sustentar que o despacho recorrido não tinha incorrido nas ilegalidades que lhe eram apontadas.
As Recorrentes concluíram as suas alegações do seguinte modo : 1. Os 3 despachos recorridos tiveram origem no mesmo facto.
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Os 3 processos instrutores estão em estreita ligação, havendo partilha do património naqueles contemplado.
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Cada uma das recorrentes foi a destinatária de um dos despachos recorridos em nome particular, bem como são ambas destinatárias do despacho em nome de ..., Hros, na qualidade únicas herdeiras.
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Os pontos de discordância são os mesmos nos vários processos, bem como os vícios impugnados e as soluções vertidas.
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Deve assim ser admitida a cumulação de pedidos e a coligação de autores.
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O presente recurso versa apenas sobre a indemnização referente a Património não Devolvido e, dentro deste, versa sobre a indemnização relativa Património Fundiário, bem como sobre a indemnização referente a Produtos Florestais (Cortiça) 7. O Património Fundiário não devolvido diz respeito a 5 prédios rústicos totalizando 225,5590 ha, tendo sido atribuída uma indemnização base de €72.704,69 (Esc.14.575.981 $00).
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A legislação que esteve na base da reforma agrária foi revogada por acto legislativo posterior, nomeadamente art.º 51 da Lei 109/88, de 26/9, e revogação do art.° 82° da CRP, na sua redacção de 1976.
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A quase totalidade do património fundiário expropriado na reforma agrária foi devolvido aos seus anteriores proprietários - V. preâmbulo DL38/95 10.
A devolução da totalidade do património fundiário a alguns proprietários e a devolução de apenas de parte a outros, conforme o fazem os despachos recorridos, é um acto meramente arbitrário e como tal deve ser anulado ou declarado nulo por vício de violação de lei por contrariar o art.º 62.º ou 94.° e art.º 13.º da CRP.
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Mesmo que se admitisse a legalidade da expropriação definitiva de parte do património das ora recorrentes, o pagamento de uma indemnização irrisória ou simbólica relativa a essa expropriação contraria o disposto nos arts. 1°, n.º 2; 3°, aI. a); 4°; 7.º, n.º 1, do DL 199/88, na redacção original ou na dos DL 199/91 e DL 38/95, de 14/2; arts 1°; 3° da Portaria 197-A/95 de 17/3; art.° 1°, n.º 1 da Lei 80/77, de 26/10; arts 13° e 62° ou 94° da CRP - fazendo assim padecer os despachos recorridos, também por este motivo, do vício de violação de lei devendo assim os mesmos ser anulados ou declarados nulos.
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A indemnização a atribuir ao património não devolvido resulta do n.º1 do art°1 al. a) da Portaria 197-A/95, de 17/3, e resulta do acréscimo de juros e capitalização ao valor do rendimento líquido por hectare à data de 1975/1976.
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O valor base máximo a pagar pelas autoridades recorridas por 1 ha de terra é de Esc.146.034$00.
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Dos autos de expropriação amigáveis juntos sob doc. n° 7 a 12 da petição inicial resulta que o valor indemnizatório médio para 1 ha de terra na zona do património dos autos é de Esc. 799.574$00 ou € 3.988,26.
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A área expropriada paga ao valor da média actualizada de valores dá o seguinte valor: Esc.180.351.112$00 ou € 899.587,55.
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O valor definitivo pago às ora Recorrentes foi de Esc. 24.924.929$00 ou € 124.325,02.
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As recorrentes foram prejudicadas por este cálculo em Esc.155.426.183$00 ou € 775.262,53.
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Caso, em vez de actualizar o montante base recorrendo aos valores médios de transacção, se opte por recorrer à taxa de inflação fixada pelo INE, ou à taxa de juros passivos fixados pelo Banco de Portugal, o resultado será ainda mais desvantajoso para as recorrentes.
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A indemnização base dos presentes autos foi sujeita a uma actualização de 2,6%/ano que corresponde a um aumento total do valor indemnizatório base em 71 %.
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A Taxa de Inflação média, entre 1975 e 2002 foi de 13%, oscilando entre os 29% de 1984 e os 4% de 2002.
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Caso se actualize a indemnização base calculada pela verba Património Fundiário com base na Taxa de Inflação, o valor indemnizatório final será de Esc.178.761.490$00 ou €891.658,55.
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Face ao montante indemnizatório recebido, o facto de não se ter atendido a este critério significou um prejuízo, para as recorrentes, de Esc. 153.836.561$00 ou €767.334,00.
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A Taxa média de Juros Passivos estipulada pelo Banco de Portugal, entre 1975 e 2002, foi de 15,94%, oscilando entre os 28% em 1984 e os 6,84% em 2002.
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Caso se actualize a indemnização base calculada pela verba Património Fundiário com base na Taxa de Juros Passivos, o valor indemnizatório final será de Esc. 257.813.492$00 ou € 1.285.968,28.
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Face ao montante indemnizatório recebido, o facto de não se ter atendido a este critério significou um prejuízo, para as recorrentes, de Esc. 232.888.564$00 ou € 1.161.643.
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Face ao exposto a indemnização paga correspondeu a um verdadeiro confisco, pois o Estado tirou partido de rendibilidades médias de 13 e 15%, pagando apenas 2,6%.
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Quanto à indemnização devida por produtos florestais (cortiça), também resulta que a indemnização paga foi meramente simbólica e irrisória.
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A indemnização base proposta, a título desta verba, foi de Esc.71.426.306$00 ou €356.272,91.
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A indemnização por conta da cortiça corresponde aos montantes pelos quais a cortiça foi vendida à data da sua venda - VALORES HISTÓRICOS.
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A que decresceu um taxa de deflação, acrescendo posteriormente os mesmos juros de 2,6%/ano que foram aplicados à indemnização no seu todo.
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Ninguém poderá pôr em causa que a indemnização a pagar ao proprietário a título de indemnização devida pela verba PRODUTOS FLORESTAIS, como aliás acontece, nomeadamente, com os demais factores indemnizatórios previstos no artº 3 alíneas a), b) e c) da Portaria 197-A/95 (para valores 94/95), terá de ser actualizada para valores de 1994/1995 ou para aqueles praticados à data do pagamento da indemnização.
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O respondente faz depender a actualização ou não da indemnização da actividade que o recorrente exerça.
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Foi exactamente no sentido de se exigir a actualização da indemnização da rubrica PRODUTOS FLORESTAIS que se pronunciou o consagrado jurisconsulto Dr. Robin de Andrade, conforme parecer que se junta.
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Este autor é uma referência na área da legislação sobre a Reforma Agrária porquanto participou activamente nos trabalhos de preparação e execução de alguns dos diplomas que, ainda hoje, regulam esta matéria.
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Face a esta sua posição privilegiada como interveniente, do seu parecer resulta uma dissecção minuciosa do texto e escopo da diversa legislação que versa sobre o assunto objecto dos presentes autos, permitindo ao agente do direito compreender, do ponto de vista sistemático do legislador, o verdadeiro sentido de um conjunto de normas que hoje regulam uma realidade um pouco desactualizada e ultrapassada.
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Para este autor, a integração da cortiça nas diversas rubricas indemnizáveis previstas na lei varia em função da data da sua extracção. Assim, a cortiça será classificada como : i) PRODUTO ARMAZENADO : no caso de já se encontrar extraída (retirada da árvore) à data da ocupação/nacionalização ou expropriação - art.º 11 n.º 6 do DL 199/88, redacção DL 38/95; ii) FRUTO PENDENTE, e como tal integra o capital de exploração nos casos em que ainda se encontrava em criação na árvore à data da ocupação/nacionalização ou expropriação, e que foi extraída enquanto se manteve o desapossamento - Art°11 nº4 do DL 199/88, redacção DL 38/95; iii) RENDIMENTO FLORESTAL : diz respeito à cortiça que se formou depois de uma extracção já efectuada durante o desapossamento, e que viria (9 anos depois) a ser novamente extraída e vendida pelo Estado - art.° 5° nº2 aI. b) do DL 199/88, redacção DL 38/95, que remete para o DL 312/85 de 31/7 e DL 74/89 de 3/3.
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O resultado final é sempre o mesmo, permitir calcular uma indemnização que, mesmo não a conduzindo para o conceito do art.° 62.º, n.º 2, da CRP, que, pelo menos se enquadre no art.º 94° também da CRP, para que não se transforme em uma verba irrisória ou num verdadeiro confisco.
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Apontando no mesmo sentido - da necessária actualização das verbas - com outra fundamentação, também se pronunciou o Prof. Doutor Marcelo Rebelo de Sousa em parecer que também agora se junta.
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Várias alternativas existirão para concretizar a necessidade de actualização da indemnização devida pelas Cortiças, propondo as recorrentes TRÊS ALTERNATIVAS, admitindo-se outras como possíveis.
Sinteticamente as TRÊS ALTERNATIVAS consistem em : 40.
A PRIMEIRA...
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