Acórdão nº 046261 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Janeiro de 2004
Magistrado Responsável | COSTA REIS |
Data da Resolução | 22 de Janeiro de 2004 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
A... vem, com fundamento em vícios de violação de lei e de forma, interpor recurso contencioso do despacho conjunto do Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e do Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças, de 3/2/00 e de 18/02/00, respectivamente, que, no âmbito da Reforma Agrária e nos termos do art.º 8.º do DL n.º 38/95, de 14/02, fixou a indemnização definitiva que lhe era devida.
No final da sua alegação enunciou as seguintes conclusões : 1. Em face das múltiplas ilegalidades que inquinaram o processo expropriativo-nacionalizador referido, o Recorrente tentou pôr termo aos agravos cometidos pela Administração, quer junto desta quer junto da ordem jurisdicional cível e administrativa, e em ambas a todos os graus de jurisdição.
Em conclusão, a mesma e substancial questão foi posta internamente: a) à Jurisdição Cível, que se considerou incompetente, remetendo o ora Recorrente para a Jurisdição Administrativa; b) à Jurisdição Administrativa, que se julgou incompetente por tal competência pertencer à Administração Pública; c) à Administração Pública, que se limitou a nada fazer e a remeter, por múltiplas vezes, o Recorrente para os Tribunais (cita-se, a título de exemplo, o doc. nº 6 junto com a petição).
Em face da flagrante violação dos direitos constitucionalmente consagrados do Recorrente, violação essa insusceptível de controlo judicial interno, em 3/1/96 o ora Recorrente deduziu junto da Comissão Europeia dos Direitos do Homem uma Queixa, tendo em vista a condenação do Estado pela flagrante violação que as "indemnizações pela Reforma Agrária" constituem do disposto nos artigos 6º, 13º e 17 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e artigo 1º do Protocolo nº I Adicional à Convenção. Após a tramitação devida, tal Comissão Europeia veio, mau grado os desejos do Estado português, em 23/04/1998 a declarar a Queixa "admissível", tendo a própria Comissão, o Estado português e o Queixoso requerido a intervenção superior e definitiva do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Por doutíssimo Acórdão de 11/1/00, veio aquele Tribunal Europeu dos Direitos do Homem a declarar que o Estado Português, com a conduta levada a cabo relativamente ao aqui Recorrente, havia violado o artigo 1º do Protocolo nº l Adicional à Convenção Europeia dos Direitos do Homem, decisão essa já transitada em julgado.
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Vinte e Cinco Anos volvidos e só motivado pela condenação internacional de que foi objecto, veio o Estado a praticar (pelo menos formalmente), o acto de fixação da indemnização definitiva devida ao Recorrente... (!), mais precisamente, após a condenação internacional, o Estado, veio a notificar o ora Recorrente de uma "aparente" 3.ª Proposta de Indemnização, na qual o montante fixado foi reduzido para Esc. 207.159.000$00. Assim, só formalmente o Estado se desonerou da obrigação de praticar o acto administrativo, como se verá.
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Como atrás ficou exposto, em Dezembro de 1993, foi proferida Decisão pelo TAC de Lisboa onde expressamente se reconheceu o direito que agora a Administração, através do acto impugnando, pretendeu fixar, pelo que, tendo transitado em julgado a citada Sentença, possui uma força e uma autoridade que consiste na ordinária imutabilidade do decidido, na força executiva da mesma e na insusceptibilidade de novo conhecimento da questão de mérito respectiva. E o decidido tem força obrigatória fora do processo, entre as mesmas partes (671º, 673º, 771º e 778º do CPC) .... como sucede in casu. Assim sendo, todos os danos dados como provados pela douta Sentença do TAC de Lisboa de 29/11/1993 (e repetidos pelo douto Acórdão do STA de 12/07/1994), tinham que ter sido indemnizados no acto recorrido. Não o tendo feito, o acto recorrido é inválido, por vício de violação de lei, gerando a mesma a nulidade do acto, nos termos do disposto no art.º 133º nº 2 al. h) do CPA.
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Por outro lado, o entendimento sustentado entre aspas na citação feita sob a alínea c) da Informação nº 09/DSDR/2000( Entendimento segundo o qual as expropriações nacionalizações pela Reforma Agrária não implicam "contrapartida do valor dos bens expropriados".
), foi já considerado inconstitucional, entendendo o Tribunal Constitucional que as indemnizações por quaisquer expropriações, têm de indemnizar de modo justo e célere o particular expropriado (cfr. Acórdãos n.ºs 39/88, 381/89 e 52/90 todos do Tribunal Constitucional).
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Com efeito, conforme resulta do mesmo (Despachos exarados sobre a Informação nº 19/DSDR/2000), a respectiva compreensão é totalmente impossível se não se atender à 2ª e 3ª Propostas efectuadas pela Administração ao Recorrente (respectivamente Ofício nº 14413 de 22/07/1999 e Informação nº 09/DSDR/2000), as quais terão, conjuntamente com os respectivos "relatórios informáticos", que ser integradas no acto, para se analisar o mesmo integralmente.
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Quanto a isto, estranha-se que, após ter sido notificado o ora Recorrente para o teor da 3ª Proposta e ter formulado 3ª Reclamação nos termos e prazos legais; as entidades recorridas terem feito da 3ª Reclamação letra morta (ao praticar o MADRP a "sua parte do acto" no dia imediato à dedução daquela, a que acresce o facto de a 3ª Reclamação ter sido enviada para Castelo Branco e o MADRP estar sediado em Lisboa) - (cfr. art.º 8º nº 3 do DL 199/88 e art.ºs 59º e 135º do CPA) o que permite concluir pela existência de um vício de forma por preterição da formalidade essencial de audiência prévia do interessado, aqui Recorrente.
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Paralelamente cabe alertar para um erro de cálculo (i.e., mero erro na realização de operações de adição e subtracção), que vicia o acto recorrido, tal como resulta de pp. 7 e 8 da Informação nº 09/DSDR/2000 subjacente ao Relatório Informático que subiu a Despacho. É que efectuando-se as operações referidas na Informação nº 09/DSDR/2000 (de acréscimo e dedução) sobre o montante proposto anteriormente, a saber 207.302.000$00, não se obtém o valor de 207.159.000$00, mas sim o valor de 209.192.016$00. Pois se, de 207.302.000$00, se subtraírem os montantes rectificados constantes de p. 8 da Informação em causa (4.350.000$00 (..);60.000$00 (..) e 449.920$00), e se adicionarem os montantes rectificados também aí referidos (2.500.000$00 (..); 599.936$00 (..);3.650.000$00), obtém-se o valor ilíquido final de indemnização definitiva de Esc. 209.192.016$00. Em suma, o lapso verificado (erro de cálculo na manifestação de vontade das entidades recorridas), é manifesto na medida em que da leitura da fundamentação do acto resulta a incorrecção deste e conduz igualmente à invalidade por ilegalidade do acto.
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Por outro lado, o Recorrente, não obstante as suas insistências nunca encontrou resposta na fundamentação do acto impugnando às seguintes questões: - O montante fixado, de 207.159.000$00, é um valor ilíquido de que deduções e acréscimos? - a "dedução" expressamente prevista na fundamentação do acto segundo o qual há que descontar ao valor fixado o montante de indemnização provisória (no valor 16.235.623$00) paga em 16/09/1991, não deveria ser acompanhada de um acréscimo dos juros vencidos pelos títulos (em que tal indemnização provisória se consubstanciava), vencidos entre 1975 e 1991, e nunca pagos ao Recorrente ? - Os valores que serviram de base à fixação do montante indemnizatório em apreço reportam-se, à data da lesão do património do Recorrente ou constituem alguns deles valores posteriores a 1975/1976? Se não se reportam às datas em que o património sofreu intervenção, a que datas se reportam tais valores? - Se se reportam a momentos anteriores ao do pagamento efectivo, porque formas se "actualizam" tais valores a padrões actuais? 9. Como resulta do alegado no artigo 1º deste articulado, com a Nacionalização do Monte do Rochão e da Rebela, o Estado apropriou-se de uma área total de 1.145,500 Ha.
(respectivamente 893,075 Ha. e 252,425 Ha.); com a (cfr. doc. nº 9 que se juntou com a Petição) Expropriação do Monte Pardal, o Estado privou o Recorrente de uma área de 959,4 Ha., o que perfaz uma desapropriação forçosa de terras num total de 2.104,9 Ha..
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Seguidamente, em 1976, foi fixada a "Reserva" ao Recorrente no total de 53,975 Ha., reserva essa demarcada sobre o Monte do Rochão e que correspondia a 7.000 pontos, apesar de, o Recorrente ter direito a uma reserva na ordem dos 91.000 pontos. A situação alterou-se, parcialmente, a partir de Outubro de 1985, quando foi devolvido ao Recorrente o prédio denominado Monte da Rebela, com a área de 252,425 Ha., permitindo ao Recorrente "recuperar" uma área de 306,4 Ha.. Posteriormente, em Maio de 1990, ao Recorrente é devolvida uma área de 482,225 Ha. de terras do Monte do Rochão. A última alteração ocorreu em Outubro de 1991, quando o Estado devolveu ao Recorrente uma área de 93,5 Ha. de terras do Monte Pardal.
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O que significa que o Estado ainda hoje mantém na sua titularidade 1.222,775 Ha., terras estas que o Recorrente perdeu definitivamente, as quais se integram em parte do Monte do Rochão e em parte no Monte Pardal.
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O Recorrente requereu em 27/02/1976 a atribuição de uma área de reserva nos prédios nacionalizados e expropriado, tendo sido deferido tal requerimento. Contudo, o Estado atribuiu ao Recorrente uma Reserva de 7.000 pontos, e manteve-a ao longo dos anos, quando: - desde 1976 tinha direito a explorar uma reserva de 50.000 pontos; - desde 1977 (Novembro) tinha direito a explorar uma reserva de 91.000 pontos.
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Em suma, viu-se o Recorrente privado de uma Reserva a que tinha direito por Lei e "em virtude dos atrasos na atribuição da reserva (..) sofreu prejuízos no montante de Esc. 165.000$00 mensais", conforme ficou provado na douta Decisão do TAC de Lisboa, no facto provado sob a respectiva alínea ad) (resposta ao quesito 21º).
E tal decisão constitui caso julgado quanto à prova desse facto entre o aqui Recorrente e o Estado. Ora, no acto recorrido não encontra qualquer referência a tal dano sofrido pelo ora Recorrente, o que constitui erro de facto e violação...
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