Acórdão nº 046380 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Dezembro de 2003
Magistrado Responsável | SANTOS BOTELHO |
Data da Resolução | 09 de Dezembro de 2003 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em conferência, no Pleno da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: 1 - RELATÓRIO 1.1 A "CP - Caminhos de Ferro Portugueses, EP", recorre do Acórdão da Secção, de 14-1-03, que, concedendo provimento ao recurso contencioso interposto pelo Sindicato Nacional dos Maquinistas dos Caminhos de Ferro Portugueses, declarou a nulidade do despacho conjunto do Secretário de Estado dos Transportes e do Secretário de Estado do Trabalho e Formação, de 28-4-00, que tinha procedido à definição dos serviços mínimos julgados indispensáveis a serem cumpridos pelos trabalhadores grevistas e que constam dos anexos I e II do dito despacho.
Nas suas alegações formula as seguintes conclusões: "I. A exigência de garantia dos serviços mínimos constitui uma limitação legítima ao exercício do direito de greve; II. O nº 1 do artigo 8º da Lei da Greve, ao determinar que "nas empreses ou estabelecimentos que se destinem à satisfação de necessidades sociais impreteríveis ficam as associações sindicais e os trabalhadores obrigados a assegurar, durante a grave, a prestação dos serviços mínimos indispensáveis para ocorrer à satisfação daquelas necessidades" (sublinhado nosso), estabelece uma obrigação, isto é, constitui sindicatos e trabalhadores numa posição jurídica passiva; III. Ora, salvo o devido respeito, não parece lógico, nem razoável, transformar uma obrigação num direito, um dever numa prerrogativa ou uma posição jurídica passiva numa posição jurídica activa; IV. A Lei da Greve é clara quando, neste domínio, impõe uma obrigação que tem como destinatários os sindicatos e os trabalhadores. E, por isso mesmo, não se descortina de que forma pode esta obrigação ser transformada na atribuição de um poder a estes sujeitos privados; V. Da mesma forma, não parece lógico, nem razoável, que o conteúdo desta obrigação, que se consubstancia, como se referiu, numa limitação ao exercício do direito de greve, seja definido pelos sujeitos passivos, pelos destinatários dessa exigência, por aqueles cujo direito é limitado; VI. Estranho seria, com efeito, que fossem os sindicatos e os trabalhadores - aqueles que estão vinculados à prestação dos serviços mínimos - a definir a extensão dessa vinculação. Como seria estranho que fossem sindicatos e trabalhadores - aqueles cujo direito de greve é limitado - a estabelecer, em cada caso, a extensão dessa limitação do próprio direito; VII. O nº 1 do artigo 8º da Lei da Greve apenas impõe uma vinculação - a prestação de serviços mínimos -, fixando os seus destinatários - Sindicatos e trabalhadores. Mas nada diz quanto à definição dos serviços mínimos; VIII - A declaração de inconstitucionalidade assentou, única e exclusivamente, em fundamentos de índole formal (processual) e que o Tribunal Constitucional, no Acórdão nº 289/92, de 2 de Setembro de 1992 (in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 23º Volume, pág. 7 e ss.), considerou materialmente conforme à Constituição a possibilidade de intervenção do Governo na fixação dos serviços mínimos; IX. O artigo 8º da Lei da Greve, na redacção vigente, não resolve, pois, a questão da definição dos serviços mínimos. Ora, por força desta Lei e, desde 1997, também da Constituição (nº 3 do artigo 57º) é imposta, como limitação ao direito de greve, a obrigação de prestação de serviços mínimos. Essa limitação funda-se na tutela de interesses gerais da comunidade e tutela de direitos fundamentais dos cidadãos; X. Assim na falta de uma disposição que, neste particular, determine a quem cabe a fixação desses serviços, necessariamente se terá de recorrer aos princípios e regras gerais - com efeito, e como escreve Menezes Cordeiro, "num prisma mais ligado à decisão, pode dizer-se que, em cada problema concreto, não se aplica esta ou aquela norma particularmente vocacionada para nele intervir: é sempre o Direito em bloco (...) que, em cada saída jurídica, intervém"; XI. É, justamente, por força destes princípios e regras gerais que, fatalmente, se terá de concluir que cabe em geral ao Governo, no exercício da competência administrativa, garantir "a execução da lei no tocante à satisfação de necessidades colectivas a cargo do Estado-colectividade"; XII. Competências, em suma, claramente delineadas no artigo 199º da Constituição, cuja alínea f) faz incumbir ao Governo a...
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