Acórdão nº 047495 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Dezembro de 2003

Magistrado ResponsávelCOSTA REIS
Data da Resolução03 de Dezembro de 2003
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

CEUL - Cooperativa de Ensino Universidade Lusíada, CRL, posteriormente transformada em Fundação Minerva - Cultura, Ensino e Investigação Científica, interpôs neste STA, recurso contencioso de anulação do despacho, de 9/1/01, do Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior (SEED), que lhe indeferiu o pedido de reconhecimento de interesse público do Instituto Superior Politécnico Lusíada de Basto, bem como os pedidos de autorização de funcionamento de vários cursos superiores de licenciatura e de bacharelato e reconhecimento dos respectivos graus académicos, imputando-lhe vício de forma - não estava devidamente fundamentado - e erro nos pressupostos de facto - pois que, ao contrário do que o Recorrido supôs, a Recorrente juntou ao processo os curricula e as declarações de compromisso de todos os professores que, de resto, tinham os graus académicos exigidos por lei, especificou o número dos alunos esperados por curso e o equipamento e material didáctico técnico para todos os cursos, indicou as estruturas e as formas de apoio social, e esclareceu com suficiência o seu plano económico e a sua viabilidade financeira.

A Autoridade Recorrida respondeu sustentando a irrecorribilidade do despacho impugnado - por ser meramente confirmativo de anterior indeferimento tácito - mas que, se assim se não entendesse, se devia negar provimento ao recurso por o seu despacho não enfermar de nenhuma das ilegalidades que lhe era imputada.

A Recorrente, ouvida nos termos do art.º 54.º da LPTA, defendeu a impossibilidade de formação de acto confirmativo, uma vez que "jamais pode haver, como é óbvio, identidade de fundamentação da decisão ou pressupostos da mesma entre o despacho recorrido e o acto tácito de indeferimento, já que este último, pela sua própria natureza, é destituído de fundamentação." Relegado para final o conhecimento desta questão prévia, foram as partes notificadas para apresentarem alegações, direito que ambas exerceram.

A Recorrente formulou as seguintes conclusões : 1. É necessário que, na tomada de decisão, tenham sido tomados em consideração os factos reais apresentados, sob pena de ser praticado novo vício do acto administrativo, neste caso, violação da lei por erro nos pressupostos de facto.

  1. É o que sucede, mais uma vez, com o douto despacho recorrido.

  2. Na verdade, os requisitos que o Recorrido considera não cumpridos pela Recorrente encontram-se, todos eles, devidamente cumpridos.

  3. Acresce que, se invoca genericamente a falta de elementos, desconsiderando-se - erroneamente - os em tempo entregues para instrução do processo.

  4. Nos termos da lei, o erro nos pressupostos integra o vício de violação da lei, vício esse gerador da anulabilidade do acto.

  5. Assim, violou o douto despacho recorrido expressamente os artigos 14°, n° 3, 15° n° 3, 28°, 51°, n° 1, al. e), g) e j), n° 4, alínea c), 52, n° 1, alínea c) e n° 2, 57°, 59° do Estatuto do Ensino Superior Particular e Cooperativo, aprovado pelo DL n° 16/94, de 22/1, alterado por rectificação pela Lei n° 37/94, de 11/11, e pelo DL n.º 94/99, de 23/3.

  6. Acresce que, do despacho ora recorrido constam ainda expressamente como motivos do indeferimento que "para além da falta de vários elementos, o incumprimento de vários requisitos fundamentais do Estatuto, designadamente:" 8. Não são mencionados os elementos considerados em falta, nem são identificados todos os requisitos não cumpridos que terão fundamentado a decisão daquele membro do Governo.

  7. No caso em apreço, não foram expressamente invocadas todas as razões de facto que levaram à decisão tomada, pelo que não pode compreender quais os elementos em falta para uma decisão favorável ao seu pedido.

  8. Todas as insuficiências de fundamentação vêem coarctar à Recorrente o seu direito de defesa ao não lhe permitirem tomar posição expressa sobre todos e cada um dos fundamentos do acto de indeferimento da sua pretensão.

  9. Refere ainda o Recorrido que, não estando verificados os requisitos exigidos pelo Estatuto do Ensino Superior Particular e Cooperativo, o pedido teria de ser indeferido, por tratar-se de exercício de um poder vinculado.

  10. Na verdade, todos aqueles requisitos foram integralmente cumpridos pela Recorrente e por isso, ao contrário, o pedido deveria de ser deferido, por tratar-se de exercício de um poder vinculado.

  11. Ora, mesmo actuando no exercício de um poder vinculado, caberá sempre e necessariamente à Administração, fundamentar os seus actos.

  12. De facto, o preceito que exige o dever geral de fundamentação não autoriza qualquer restrição ou condicionamento à obrigação legal de fundamentar.

  13. Com efeito, a decisão do Recorrido deveria apresentar todas as razões de facto, claras e concretas, para que a Recorrente pudesse compreender quais os elementos ditos em falta para assim exercer o seu direito de defesa.

  14. Sendo certo que, a falta de fundamentação acarreta a anulabilidade do despacho ora recorrido, por vício de forma, nos termos conjugados dos mencionados artigos 124.º, n.º 1, al. c), 125.º e 135.º do CPA.

  15. Acresce que, o Recorrido veio suscitar a irrecorribilidade do acto recorrido, alegando que o mesmo é meramente confirmativo do acto tácito de indeferimento, anteriormente proferido.

  16. Ora, tal entendimento não pode ser aceite já que, de acordo com o art.º 109.° do CPA, só ao particular é conferida a faculdade de presumir indeferida a sua pretensão.

  17. Com efeito, o princípio de decisão tácita é estabelecido em benefício exclusivo dos administrados, consistindo numa das suas garantias adjectivas, face à passividade da Administração.

  18. Nesta conformidade, pode o administrado não impugnar o acto tácito, optando por aguardar a decisão expressa, e se entender proceder à sua impugnação e se o tivesse impugnado poderia depois substituir o objecto do recurso quando fosse confrontado com um acto expresso (art.° 51°, n.º. 1 da LPT A).

  19. Por outro lado, caso se opte pela não impugnação do acto tácito, continua a impender sobre a Administração o dever legal de decidir.

  20. Nestes termos, conclui-se que o Despacho recorrido não é um acto confirmativo do acto tácito de indeferimento do pedido da Recorrente.

  21. Por outro lado, só se considera acto confirmativo aquele que, relativamente ao acto confirmado, apresente identidade de sujeitos, de objecto, de decisão e que, além disso assente nos mesmos pressupostos de facto e de direito.

  22. Ou seja, o acto confirmativo é aquele que se limita a manter uma decisão anterior, sem nada acrescentar ou retirar ao seu conteúdo.

  23. Nestes termos, o Despacho recorrido não poderá ser classificado como acto confirmativo do acto tácito, já que assenta em distintos pressupostos de facto e de direito, não existindo assim identidade de fundamentação.

  24. Ora, nem poderá haver identidade de fundamentação da decisão, entre o despacho recorrido e o acto tácito, na medida em que este último, pela sua própria natureza, é infundamentável.

  25. Por outro lado, verifica-se que o acto de indeferimento tácito não foi objecto de notificação à Recorrente de publicação imposta por lei ou de impugnação deduzida por aquela.

  26. Com efeito, e nos termos do art.º 55.° da LPTA, o recurso só poderá ser rejeitado com fundamento no carácter confirmativo do acto recorrido, quando o acto anterior tiver sido objecto de notificação ao recorrente, de publicação imposta por lei ou de impugnação deduzida por aquele.

  27. Nesta conformidade, nunca poderia o recurso ser rejeitado com fundamento no seu carácter meramente confirmativo.

  28. Assim, não pode merecer acolhimento o entendimento do Recorrido, pelo que, deve considerar-se o acto recorrido susceptível de impugnação contenciosa.

    A Autoridade Recorrida, por seu turno, concluiu assim : 1. O presente recurso deve ser considerado improcedente, quer por irrecorribilidade do acto impugnado, quer por inexistência dos vícios invocados; 2. Com efeito, o despacho recorrido é um acto meramente confirmativo da decisão tácita de indeferimento do pedido da Recorrente, como resulta do regime constante do artigo 53.º do EESPC; 3. Na verdade, aí prevê-se um verdadeiro acto tácito de indeferimento e não uma mera presunção de indeferimento, como se julga ter ficado demonstrado; 4. Por outro lado, o acto recorrido encontra-se devidamente fundamentado, não se verificando o alegado vício de forma por falta de fundamentação, como decorre do próprio requerimento de recurso da recorrente; 5. Também não se verifica qualquer erro nos pressupostos, porquanto as insuficiências de instrução que fundamentaram o indeferimento do pedido de reconhecimento de interesse público encontram-se demonstradas no processo administrativo junto aos autos.

    A Ilustre Magistrada do Ministério Público pronunciou-se pela recorribilidade do acto impugnado - e portanto, pela improcedência da questão prévia suscitada pela Autoridade Recorrida - por entender que o indeferimento tácito não pode dar origem a posterior acto confirmativo e, no tocante ao mérito, pelo não provimento do recurso, por considerar que o acto recorrido não só está devidamente fundamentado como não sofre dos vícios que lhe foram imputados.

    Mostrando-se colhidos os vistos legais cumpre decidir.

    FUNDAMENTAÇÃO I.

    MATÉRIA DE FACTO.

    Julgam-se provados os seguintes factos : 1.

    A Recorrente, em 16/11/98, dirigiu ao Sr. Ministro da Educação requerimento pedindo, "nos termos e ao abrigo no disposto sobretudo nos citados preceitos do Estatuto do Ensino Superior...

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