Acórdão nº 0980/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Novembro de 2003

Magistrado ResponsávelANTÓNIO MADUREIRA
Data da Resolução11 de Novembro de 2003
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1. RELATÓRIO A..., com os devidos sinais nos autos, interpôs, no Tribunal Central Administrativo, recurso contencioso do indeferimento tácito imputável ao Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, na sequência do recurso hierárquico necessário que lhe dirigiu em 19/3/98, do despacho do Director-Geral das Contribuições e Impostos de 16/1/98 que lhe indeferiu o pagamento de juros de mora respeitantes aos quantitativos que lhe foram abonados a título de férias e de subsidio férias e de Natal, relativos ao período entre 5/4/82 e 11/4/89, em que prestou serviço na DGCI, na situação de falsa tarefeira, assacando-lhe o vício de violação de lei, decorrente da violação dos artigos 804.º, 805.º e 806.º do CC e 3.º, n.º 1 do CPA.

Na sua resposta, a autoridade recorrida arguiu as excepções da extemporaneidade do recurso, da manifesta ilegalidade na sua interposição, decorrente do acto impugnado ser meramente confirmativo do despacho que ordenou o pagamento das férias e do subsídio de férias e de Natal à recorrente, efectuado em 7/4/95 (cfr. fls 28), e a de erro na forma de processo, tendo ainda defendido a legalidade do acto impugnado.

Após o Exm.º Magistrado do Ministério Público ter emitido pareceres, nos quais se pronunciou pela procedência das questões prévias e consequente rejeição do recurso (fls 55-56) e pelo improvimento do recurso (fls 86-89), foi proferido acórdão, em 9/5/02, no qual foram julgadas improcedentes as excepções arguidas e foi concedido provimento ao recurso e o acto impugnado anulado, por procedência do vício de violação de lei, decorrente do não pagamento de juros relativos às importâncias que lhe haviam sido pagas a título de férias e subsídio de férias e de Natal, que foram considerados devidos, tendo ainda sido considerado que o Estado não estava isento do seu pagamento nem os mesmos estavam prescritos, em virtude do prazo de prescrição começar a contar a partir do momento em que as referidas prestações foram efectivamente pagas e não a partir do momento em que eram devidas.

Com ele se não conformando, interpôs recurso, para este Supremo Tribunal, o Secretário de Estado dos Assuntos Ficais, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões: 1.ª) - Contrariamente à qualificação jurídica efectuada no douto acórdão recorrido, o acto que processou as importâncias correspondentes a férias e subsídio de férias e de Natal firmou-se como caso decidido na ordem jurídica.

  1. ) - Por outro lado, é clara a intempestividade do recurso contencioso, bem como a confirmatividade dos actos hierarquicamente e contenciosamente impugnados, relativamente ao anterior acto de processamento de abonos.

  2. ) - Do que decorre a ilegalidade da interposição de recurso contencioso da ora recorrida.

  3. ) - Do mesmo modo, diferentemente da interpretação feita no douto acórdão recorrido, não pode entender-se que o pedido efectuado na petição de recurso, pela ora recorrida, seja outro que não o pagamento de juros de mora.

  4. ) - Ora, o recurso contencioso não constitui o meio processual adequado para peticionar o pagamento dessa indemnização.

  5. ) - Pelo que, existindo erro na forma de processo, devia o recurso contencioso ter sido rejeitado.

  6. ) - A Administração pagou à ora recorrida, em 7/4/95, as importâncias correspondentes a férias e subsídio de férias e de Natal.

  7. ) - Praticou esse acto, no uso do poder discricionário, e não na decorrência de qualquer imperativo legal que a tal obrigasse.

  8. ) - E fê-lo por entender ser de uniformizar a situação dos funcionários "ex-tarefeiros" que não lançaram, oportunamente, mão dos meios contenciosos para que lhes fosse reconhecido o direito ao recebimento daqueles quantitativos com a dos que, oportunamente, o fizeram e, por isso, viram, jurisdicionalmente, reconhecido o seu direito.

  9. ) - Assim sendo, não havendo "prestação legalmente devida" não se pode considerar a existência de juros por atraso no seu pagamento.

  10. ) - O acórdão recorrido está, pois, em desconformidade com a lei civil (artigos 805.º e 806.º do CC).

  11. ) - Além disso, nos termos e por força do disposto no n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 49 168, e contrariamente à interpretação que do preceito se faz no douto acórdão recorrido, o Estado estava isento de juros de mora.

  12. ) - Contrariamente ao que consta do douto acórdão recorrido - e de acordo com o estabelecido nos artigos 310.º, d) e 306.º do CC, preceitos com que aquele acórdão se encontra desconforme - mesmo que a ora recorrida tivesse tido direito a juros de mora, o que nem por mera hipótese académica se admite, sempre esse direito estaria prescrito.

Contra-alegou a recorrida (recorrente contenciosa), tendo, em síntese, defendido a bondade da decisão recorrida.

O Exm.º Magistrado do Ministério Público neste STA emitiu o seu douto parecer de fls 137-138, no qual se pronunciou pelo provimento parcial do recurso.

Em seu entender, o acórdão recorrido deve ser confirmado no que respeita ao julgamento das excepções arguidas.

E deve ser revogado quanto ao seu fundo, por considerar que não há lugar a pagamento de juros moratórios quando, por razões de justiça e equidade, a Administração revoga um acto já consolidado, e em função do novo acto é reconhecido ao recorrente direito ao pagamento de férias e respectivo subsídio e subsídio de Natal vencidos antecipadamente.

Foram colhidos os vistos dos Exm.ºs Juízes Adjuntos, pelo que cumpre decidir.

  1. FUNDAMENTAÇÃO 2. 1. OS FACTOS: O acórdão recorrido considerou provados os seguintes factos: 1. Em 31/7/95, A... requereu, ao Director - Geral das Contribuições e Impostos, que lhe fossem pagos os juros devidos pela mora no pagamento das importâncias referentes aos meses de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, nos vários anos em que esteve na situação irregular de tarefeira.

  2. Em 28/10/97, a Direcção dos Serviços Jurídicos e do Contencioso da Direcção - Geral dos Impostos, emitiu parecer, onde se pode ler, a final: "(...) somos de parecer que devem ser indeferidos os requerimentos em que é pedido o pagamento de juros de mora sobre os quantitativos pagos respeitantes a férias, subsídios de férias e de Natal, e eventualmente a diuturnidades e diferenças salariais, reportados ao período de tempo em que os interessados foram considerados tarefeiros." 3. Sobre o dito parecer, o Director - Geral dos Impostos proferiu o seguinte despacho, datado de 16/1/98: "Concordo. Indefiro." 4. Interpôs, então, para o senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais recurso hierárquico, peticionando, a final, a revogação do acto recorrido e a sua substituição por outro que determinasse o abono das quantias devidas a título de juros moratórios, calculados à taxa legal, contados desde a data do vencimento de cada uma as prestações respeitantes a férias não gozadas, subsídios de férias e de Natal, pelo período de tempo que permaneceu ao serviço ao serviço da Direcção - Geral Impostos como falsa tarefeira e até à data em que estas prestações lhe forem liquidadas.

  3. Sobre tal recurso hierárquico não foi proferida decisão expressa.

  4. Acrescentamos-lhe que a recorrente foi notificado do despacho do Director- Geral dos Impostos de 16/1/98 em 8/2/98 (fls 10 dos autos), bem como todo o teor da informação referida em 2.

  5. 2. O DIREITO: Como foi referido, no relatório, o presente recurso jurisdicional ataca o acórdão recorrido na sua globalidade, ou seja, na parte em que julgou improcedentes as excepções da extemporaneidade do recurso, da manifesta ilegalidade na sua interposição, decorrente do acto impugnado ser meramente confirmativo do acto de processamento das férias, subsidio de férias e de Natal e do erro na forma de processo, bem como na parte em que julgou procedente o vício de violação de lei arguido.

    Iremos, assim, conhecer do recurso pela ordem das questões enunciadas, ou seja, começar pelas questões prévias de índole formal e, depois, tratar da questão de mérito.

    Assinalamos, previamente, que sendo o objecto do recurso precisamente idêntico ao do recurso n.º 917/02-12, que relatámos em 6 de Fevereiro próximo passado, e sendo igualmente rigorosamente idênticas as alegações da recorrente, o iremos seguir na íntegra, dado não vislumbrarmos qualquer razão para mudar a posição nele sustentada.

    E, assim, temos: 2. 2. 1. Extemporaneidade e manifesta ilegalidade do recurso: Iremos tratar estas excepções em conjunto, porquanto, de acordo com a construção do recorrente, se apresentam, no fundo, absolutamente interligadas.

    Com efeito, a extemporaneidade do recurso não decorre, na sua formulação, do facto do recurso hierárquico não ter sido interposto no prazo de 30 dias, a contar da notificação do acto expresso praticado pelo DGCI, que indeferiu a pretensão da recorrida (recorrente contenciosa) - o que não se verificou, porquanto foi notificado do acto em 5/2/98 e interpôs o recurso em 19/3/98, pelo que apenas se contando os dia úteis (artigo 72.º do CPA), estava dentro do prazo -, mas sim do facto de não ter sido interposto recurso hierárquico, no prazo de 30 dias, do acto de pagamento das férias, subsidio de férias e de Natal, ocorrido, conforme foi referido, em 7/4/95.

    O que está subjacente à sua construção é, no fundo, a consideração de que o acto que procedeu a esses pagamentos não é uma simples operação material, mas um verdadeiro acto jurídico, que, por não ter sido impugnado, se firmou na ordem jurídica, como caso decidido ou resolvido. E, estando perfeitamente firmada na ordem jurídica a solução que se traduzira no pagamento dessas precisas quantias, a decisão do DGCI seria meramente confirmativa da do referido acto de 7/4/95, pelo que o recorrente não teria o dever legal de decidir o recurso hierárquico que, a propósito desses pagamentos, lhe fora dirigido, pelo que não havia indeferimento tácito - e o recurso carecia de objecto.

    Mas carece de razão o recorrido, por duas ordens (consequenciais) de...

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