Acórdão nº 0535/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Outubro de 2003

Magistrado ResponsávelPOLIBIO HENRIQUES
Data da Resolução14 de Outubro de 2003
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1. RELATÓRIO "A...", sociedade comercial anónima com sede em lugar do ..., ..., ...-... Lousada, intentou no Tribunal Administrativo do Circulo do Porto, recurso contencioso de anulação da deliberação da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, de 6 de Setembro de 2000.

Por sentença de 31 de Outubro de 2002 o Tribunal Administrativo de Circulo rejeitou o recurso por ser extemporâneo.

Inconformada, a impugnante interpõe recurso dessa decisão para este Supremo Tribunal, apresentando alegações com as seguintes conclusões: 1ª Vem o recurso interposto da sentença que decidiu que, estabelecendo o art. 3º nº 2 do DL nº 134/98 o prazo de 15 dias para interposição do recurso, este teria sido extemporâneo, por o recurso contencioso em causa ter sido interposto ao abrigo das regras gerais de recursos contenciosos administrativos de anulação.

  1. Mas salvo o devido respeito, a decisão é inteiramente errónea, não tendo mesmo ponderado a natureza da matéria que está em discussão nos autos, consagrada pela matéria de facto, toda provada por documentos.

  2. Como resulta dos autos foi interposto recurso contencioso administrativo da deliberação da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia de 6 de Setembro de 2000, comunicada à recorrente pelo ofício daquela de 11.09.00, recebido em 19.09.00, e de que recebeu só em 17.10.00 a informação da respectiva fundamentação, solicitada em 02.10.00 segundo a qual, tendo terminado o procedimento administrativo de concurso para empreitada de obras públicas, com adjudicação da obra à Rte e com aprovação tácita da adjudicação e da minuta do contrato, a «Câmara Municipal na sua reunião de 06 de Setembro de 2000 deliberou anular o concurso de empreitada em assunto a que se refere o anúncio de 31-05-1997».

  3. Ora, o cit. DL nº 134/98 - que transpôs para a ordem interna a Directiva nº 89/665/CEE do Conselho - versa exclusivamente «o regime jurídico do recurso contencioso dos actos administrativos relativos à formação dos contratos» que enumera (seu art. 1º) e, bem assim de «todos os actos administrativos relativos à formação do contrato que lesem direitos ou interesses legalmente protegidos» (art. 2º -1 e 3º - 1).

  4. Tudo isto é feito, ou seja, um regime de impugnação autónomo é estabelecido, para que seja «assegurada uma tutela célere e eficaz dos interesses dos particulares nos processos de formação dos referidos contratos de direito público» (preâmbulo, segundo parágrafo).

  5. Deste modo o diploma veio prever, como originalidades, «uma forma de recurso urgente» (cit. preâmbulo, quinto parágrafo e arts. 2º - 1, 3º - 2 e 4º) e «a possibilidade de os administrados lançarem mão de medidas provisórias, também de carácter urgente» (cit. preâmbulo, sexto parágrafo e artº 2º - 2 e 5º).

  6. Esta urgência («tutela célere e eficaz») é ditada, evidentemente e dentro do espírito do sistema, pela fase da dita formação do contrato e não por qualquer outra fase, ou seja, aquilo que o legislador pretende é não demorar a definição do próprio contrato.

  7. O espírito do sistema é, pois, «interpretado em conjunto com a Directiva nº 89/665/CEE do Conselho, o DL nº 134/98 consente a impugnação contenciosa de actos preparatórios praticados ao longo do procedimento do concurso, no pressuposto de que é desejável que antes de passar à fase de escolha do adjudicatário estejam corrigidas as ilegalidades que inquinem fases antecedentes, pois que tal regime «visa dar satisfação aos interesses dos concorrentes, em geral, e da própria Administração»; e bem assim «o objectivo desse regime é o de, na medida do possível, possibilitar que só se passe à fase da elaboração do contrato uma vez estabilizada a escolha do co-contratante, sendo por isso no interesse de todos os participantes no procedimento, e não apenas do particular recorrente, que se encurtem os prazos judiciais e da interposição do recurso; 9ª Todavia, não é nada disto o que ocorre no caso dos autos: já não se está na fase da formação do contrato.

  8. Pretende-se, isso sim, impugnar contenciosamente o acto posterior ao termo do concurso que decretou a anulação do mesmo concurso, não se tratando já da necessidade de proteger os concorrentes (nem a Administração) da celeridade e da eficácia necessárias à formação do contrato, ao termo do procedimento administrativo concursal, pois que com o acto administrativo recorrido a ordem jurídica ficou sem o concurso, sem a adjudicação, sem o contrato; razão, aliás, por que este recurso nem sequer tem recorrido particular.

  9. Logo, não está presente nestas circunstâncias nada daquilo a que o regime jurídico em causa (o do DL nº 134/98) queira obviar, pelo que esse regime aqui nunca teria aplicação, aplicando-se, sim, o regime geral do contencioso administrativo de anulação.

  10. O DL nº 134/98, de 15.05 só entrou em vigor no dia 16.05.98, dia seguinte ao da sua publicação (seu art. 8º) e o procedimento administrativo em causa iniciou-se em 30.05.97, quando ainda não vigorava o diploma agora invocado.

  11. Ao contrário do que diz a douta sentença recorrida, os diplomas (Directiva e Decreto-Lei) em causa não têm pura natureza adjectiva, mas têm ainda natureza de direito substantivo, não sendo por isso desmerecido pelo facto de terem estabelecido um regime de recurso de prazo curto, excepcional ao da regra processual dos recursos contenciosos de anulação.

  12. Aquilo que está em causa é «que seja assegurada uma tutela célere e eficaz dos interesses dos particulares nos processos...

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