Acórdão nº 047940 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Junho de 2003

Magistrado ResponsávelSÃO PEDRO
Data da Resolução25 de Junho de 2003
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo 1.

Relatório A..., identificado dos autos recorre da sentença proferida no Tribunal Administrativo de Círculo do Porto que julgou improcedente a acção ordinária que interpusera contra o ESTADO PORTUGUÊS e o MINISTRO DA SAÚDE.

A MINISTRA DA SAÚDE recorreu subordinadamente da mesma sentença limitando o seu recurso à questão prévia, não atendida na sentença relativamente à legitimidade passiva da Ministra da Saúde.

O recorrente, A..., formulou as seguintes conclusões: 1) a responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas no domínio dos actos de gestão pública rege-se pelo disposto no presente diploma em tudo que não esteja previsto em leis especiais - art. 1º do Dec. Lei 48.051, de 21 de Novembro de 1967; 2) O Estado e demais pessoas colectivas públicas respondem perante terceiros pelas ofensas dos direitos ou das disposições legais destinadas a proteger os seus interesses, resultantes de actos ilícitos culposamente praticados pelos respectivos órgãos ou agentes administrativos no exercício das suas funções e por causa desse exercício; quando satisfizerem qualquer indemnização nos termos do número anterior, o Estado e demais pessoas colectivas públicas gozam do direito de regresso contra os titulares do órgão ou os agentes culpados, se estes houverem procedido com diligência e zelo manifestamente inferiores àqueles a que se achavam obrigados em razão do cargo - art. 2º do mesmo diploma; 3) Os titulares do órgão e os agentes administrativos do Estado e demais pessoas colectivas públicas respondem civilmente perante terceiros pela prática de actos que ofendam direitos destes ou as disposições legais destinadas a proteger os seus interesses, se tiverem excedido os limites das suas funções, ou se no desempenho destas e por sua causa tiverem procedido dolosamente - art. 3º, n.º 1 do mesmo diploma; 4) Consideram-se ilícitos os actos jurídicos que violem as normas legais e regulamentares ou os princípios gerais aplicáveis e os actos materiais que infrinjam estas normas e princípios ou ainda as regras de ordem técnica e de prudência comum que devam ser tidas em consideração - art. 6º do mesmo diploma.

5) O Governo é um órgão complexo constituído por outros órgãos: o Primeiro Ministro, Os Ministros, os Secretários de Estado e os Subsecretários de Estado, e, eventualmente, os Vice Primeiros Ministros; 6) O Ministro é um órgão simples inserido no Governo e que dirige, cada um, o seu Ministério; 7) Assim, em face do que fica dito, somos de considerar ser o Estado Português uma pessoa colectiva de direito público (...) e o Ministro da Saúde, significando o mesmo que Governo e sendo um órgão singular, e nessa medida confundindo-se com o respectivo titular, é um órgão de uma pessoa colectiva pública, no caso da pessoa colectiva Estado Português"; 8) Considerando que a legitimidade processual se afere em função dos termos em que o autor configura o direito invocado e a posição das partes, perante o pedido formulado e a causa de pedir, têm na relação material controvertida, tal como a apresenta o autor, somos de considerar que quer o Estado Português, quer o Ministro da Saúde são partes legítimas neste processo" ; 9) Os órgãos da Administração Pública devem actuar em obediência à lei e ao direito, dentro dos limites dos poderes que lhes estejam atribuídos e em conformidade com os fins para que os mesmos poderes lhes foram conferidos; 10)Os actos administrativos devem ser fundamentados, nomeadamente se implicarem revogação, modificação ou suspensão de acto administrativo anterior - art. 3º e 124º do CPA; 11)O acto anulado e nos autos identificado violou a norma legal que impõe à Pessoa Colectiva pública Estado e ao Órgão Ministro da Saúde o dever de fundamentação; 12)A responsabilidade civil extracontratual do Estado assenta nos seguintes pressupostos concomitantemente exigíveis: o facto de o órgão ou o agente, constituído por um comportamento voluntário que pode revestir a forma de acção ou omissão; a ilicitude, advinda da ofensa de direitos de terceiros ou de disposições legais emitidos com vista à protecção de interesses alheios; a culpa, nexo de imputação ético - jurídico que na forma de mera culpa, traduz a censura dirigida ao autor do facto por não ter usado da diligência que teria um homem normal perante as circunstâncias do caso concreto, ou, no âmbito da responsabilidade civil extra contratual do Estado por acto ilícito, daquela que teria um funcionário ou agente típico; o dano, lesão de ordem patrimonial, só havendo direito a indemnização no caso desta última quando o dano, pela sua gravidade, avaliada segundo um padrão objectivo, merece a tutela do direito; nexo de causalidade entre a conduta e o dano, apurado segundo a teoria da causalidade adequada; 13)A culpa dos titulares do órgão ou agentes é apreciada nos termos do art. 487º do C. Civil ou seja pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias do caso - art. 4º, 1 do Dec. Lei 48.051 - e adaptando esta regra à responsabilidade civil extra contratual do Estado e demais pessoas colectivas, somos confrontados com a diligência exigível a um funcionário ou agente típico, isto é, zeloso e respeitador da lei e dos regulamentos.

14)Não fora o acto ilegal praticado pela Ministra da Saúde, o autor teria cumprido a comissão de serviço na íntegra e não teria sofrido os danos morais e patrimoniais que descreve; 15)Os factos invocados pelo Estado na sua contestação e que teriam originado a actuação da Ministra da Saúde não constam como fundamentação do acto recorrido, não resultam provados e não correspondem à verdade as insinuações que podem ser eventualmente retiradas do respectivo teor, provando que o comportamento dos réus provocou danos morais sérios ao autor, por violação de direitos tutelados por lei: o respeito pelo bom nome e a dignidade da pessoa; 16)A Ministra da Saúde não usou da diligência que teria um funcionário ou agente típico, ou seja, respeitador da lei e dos seus regulamentos, pois ao praticar um acto, afinal infundamentado, fez com isso afirmações que traduzem violação de direitos e de disposições legais que protegem o recorrente, a saber, o seu bom nome, a sua reputação; 17)Não foi praticado novo acto administrativo, expurgado do vício, permanecendo a ilicitude, pelo que da não fundamentação inicial resultam danos para o recorrente que, a ser julgada improcedente a presente acção, ficarão por ressarcir; 18)As normas jurídicas que impõem a obrigação de fundamentação visam permitir a reconstituição do itinerário cognoscitivo percorrido por quem decide. 19)A ilegalidade ou ilicitude decorrente do vício de forma por falta de fundamentação não pode, em regra, servir de suporte ao ressarcimento de danos causados pelo acto administrativo, porquanto a mesma se insere em círculo de interesses exterior ao horizonte de responsabilidade da norma.

20)Os tribunais administrativos são competentes em razão da matéria para apreciar os pedidos de indemnização feitos à Administração com fundamento em danos decorrentes de actos de gestão pública. São actos de gestão pública os actos praticados pelos órgãos ou agentes da Administração no exercício de um poder público, ou seja no exercício de uma função de direito, sob o domínio de normas de direito público ainda que não envolvam ou representem o exercício de meios de coacção. Neste conceito se integrem os actos praticados no exercício da actividade administrativa.

21)O Estado é responsável directamente pela lesão dos direitos, liberdades e garantias cometida pelos titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, ainda que a lesão seja produzida por actos lícitos.

22)Se o autor em acção de indemnização por responsabilidade civil extra contratual pretende o ressarcimento de prejuízos que na petição alega terem sido causados por...

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