Acórdão nº 01449/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 06 de Maio de 2003
Magistrado Responsável | ALBERTO AUGUSTO OLIVEIRA |
Data da Resolução | 06 de Maio de 2003 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam em conferência na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: 1.
1.1.
A..., intentou acção declarativa de condenação contra o ICERR - Instituto para a Conservação e Exploração da Rede Rodoviária, com base em responsabilidade civil extracontratual pedindo a condenação do Réu a pagar-lhe a quantia de 591.718$00, acrescida de juros legais a partir da citação até efectivo e integral pagamento, referente ao custo da reparação que efectuou no seu veículo, em consequência de um acidente causado por o réu não ter sinalizado a via convenientemente.
1.2.
Por sentença do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, de 15 de Maio de 2002, foi a acção julgada improcedente por não provada e absolvido o réu do pedido.
1.3.
Inconformado com esta decisão, o recorrente interpôs o presente recurso jurisdicional, formulando as seguintes conclusões: "1. A sentença recorrida interpretou e valorou erradamente a factualidade dada como provada.
2. A sentença recorrida interpretou e aplicou erradamente o disposto no artº 4º dos Estatutos do ICERR anexo ao DL nº 237/99 de 25/6 e nos artigos 1º e 60º do D.Reg. nº 22-A/98 (Reg. de Sinalização de Trânsito); 3. A sentença recorrida interpretou e aplicou erradamente o disposto no 563º do CC; 4. Tais dispositivos legais deveriam ter sido interpretados e aplicados no sentido de considerar que a conduta do R. é uma conduta ilícita e culposa e, 5. que tal conduta foi causa adequada do acidente em discussão nos presentes autos.
6. O R. é responsável pelo pagamento da indemnização peticionada, por força do disposto no artigo 483º do CC e do disposto no DL 48051/67 de 21/11.
Nestes termos, nos mais de Direito, e nos do douto suprimento de V.Exªs, deve a sentença de que ora se recorre ser substituída por outra que considere o recorrido responsável pela indemnização dos danos resultantes do acidente e que em consequência o condene nos termos formulados na p.i." 1.4.
O Réu contra-alegou, pugnando pelo não provimento do recurso e confirmação da sentença.
1.5.
O EMMP emitiu parecer no sentido do provimento do recurso, dizendo: "De facto, afigura-se-me que a decisão recorrida apresenta contradição com alguns dos fundamentos expostos e que os factos provados permitem extrair conclusões diferentes das acolhidas.
Conclui a douta sentença que o A. não logrou« «fazer prova concludente de que tenha havido comportamento ilícito e culposo por parte do réu, e não fez, claramente, prova do necessário nexo de causalidade entre a eventual conduta ilícita do réu e a ocorrência do acidente ". No entanto, foi pela falta deste último pressuposto que julgou inverificada a "incursão do réu em responsabilidade civil aquiliana ".
Porém, na exposição dos seus fundamentos e embora de forma pouco expressa, a douta sentença revela aceitar a existência de um facto ilícito, omissivo, consistente na não eliminação de uma antiga linha longitudinal, pintada a branco no pavimento e que correspondia ao anterior traçado da Estrada Nacional n° 4, indicando que a mesma seguia em frente, facto esse alegado pelo A.
De facto considerou a douta sentença: « onde poderia haver de alguma forma ilicitude por parte do Réu, era pelo facto de não ter apagado a anterior marca no asfalto, relativa à estrada "velha", na medida em que a sua existência podia confundir os condutores quanto ao efectivo desenvolvimento da estrada, tanto mais sendo de noite e estando o tempo chuvoso, como era o caso.» Tendo ficado provado que já não era esse o traçado da estrada na ocasião do acidente, prolongando-se então a estrada em curva, haveria que concluir que o R., ao não ter procedido àquela eliminação, incumprira a obrigação de preservar a segurança rodoviária através de sinalização horizontal e vertical adequadas, obrigação que lhe era cometida pelo art. 4 n.º 2 c) do respectivo Estatuto, aprovado pelo Decreto-Lei n° 237/99, de 25/6.
Assim, contrariamente ao que concluiu a final, afigura-se que a sentença considerou a existência de um facto ilícito, e culposo" imputável ao R. A dado passo é mesmo referido: «ainda que se admitisse algum comportamento ilícito por parte do réu ou alguma culpa sua, nos termos ditos...».
Subsiste a questão da existência do nexo de causalidade entre o facto ilícito e os danos (estes dados como provados).
Ora, foi dado como provado que o acidente se deu porque o A não se apercebeu do prolongamento da curva e seguiu em frente, indo embater num veículo que seguia na direcção contrária. Ou seja, o A seguiu a orientação indicada pela referida linha existente no pavimento e que não correspondia já ao traçado da estrada.
Por outro lado, não foi alegada ou provada qualquer outra causa extraordinária decisiva para a orientação seguida pelo A.
Porém, não obstante ter reconhecido a probabilidade de a subsistência da linha confundir os condutores (probabilidade que considerou mesmo agravada em condições como as que existiam na ocasião do acidente de noite, com chuva), a sentença não concluiu pela existência de nexo de causalidade entre aquele facto e os danos verificados, já que o A. não logrou provar que seguiu em frente induzido pela referida linha.
E a douta sentença suscita, em sede de hipótese, outras causas possíveis e excludentes daquela (chuva, falta de luminosidade, etc.), em parte coincidentes com aquelas que antes considerara concorrentes e agravadoras do risco que, por si só, constituía a subsistência da referida linha longitudinal pintada no pavimento.
Ora, afigura-se-me que, por aplicação das regras da experiência comum na apreciação da prova e de acordo com a teoria da causalidade adequada acolhida pelo art. 563º do C.C., deve ser dado como provada a existência de nexo de causalidade entre o facto ilícito e os danos.
Conforme se considerou no douto acórdão deste S.T.A. de 14/3/02, pr. 48394 "...a já aludida omissão é susceptível de se mostrar, face à experiência comum, como tendo contribuído para a produção dos danos dados como provados na sentença, não resultando da factualidade apurada que a conduta do recorrido tenha sido a única causa do acidente».
Considero pois que os elementos que a sentença recorrida contém, permitem concluir de forma diferente e alterar a decisão proferida, nos termos do art. 712° n° 1 b) do CPC, julgando-se verificados os pressupostos da obrigação de indemnizar prevista no Dec. Lei n° 48051 de 21/11/67 e procedente a acção.
Caso se considere que não existem todos os elementos suficientes para tal conclusão, afigura-se-me que a douta sentença deve então ser anulada, nos termos do art. 712 n.º 4 do CPC".
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
2.
2.1.
Em sede de matéria de facto, a sentença considerou: "Da discussão resultaram apurados os seguintes factos: i) O autor é o dono e possuidor do auto ligeiro de passageiros de marca Renault 21, com a matrícula ...-...-... - A); ii) Numa via paralela ao IP7/A6, no sentido de Badajoz - Elvas, existe uma curva para a direita, considerando aquele sentido de marcha e após esta curva encontra-se um entroncamento Gramicha/Elvas - B); iii) A zona em causa tinha sido objecto de obras que alteraram o anterior traçado da E, N. n. 4-C); iv) Antes da curva mencionada em B) a estrada configura um segmento de recta D; v) No dia 04.12.1999, cerca das 19 horas, o autor conduzia o FX na E. N. n. 4, que segue paralela ao IP7/A6, no sentido Badajoz - Elvas, próximo de uma curva para a direita, considerando o seu sentido de marcha - ponto 1; vi) A referida curva é mais acentuada na parte final- ponto 2; vii) O segmento de recta mencionado em D) prolonga-se por cerca de 800 metros - pontos 4 e 5 da matéria de facto; viii) Antes da mencionada curva não existia, na altura, sinalização vertical que...
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