Acórdão nº 01327/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Fevereiro de 2003
Magistrado Responsável | BAETA DE QUEIROZ |
Data da Resolução | 12 de Fevereiro de 2003 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
1.1.
A..., LDA., com sede em Cadinha, Lourosa, recorre da sentença do Mmº. Juiz do Tribunal Tributário de 1ª Instância de Aveiro que julgou improcedente, por extemporânea, a impugnação do acto de liquidação de imposto automóvel (IA) praticado pela Alfândega de Aveiro, por ocasião da importação definitiva de um veículo automóvel usado.
Formula as seguintes conclusões:"1.
A douta sentença a quo não cumpriu o dever prescrito no n.º 2 do art. 668.º do CPC de resolver todas as questões submetidas à sua apreciação. Não se pronunciou sobre a inaplicabilidade das tabelas de redução do IA (ilegalidade abstracta de liquidação), nem sobre a alegada violação do conteúdo essencial dos direitos fundamentais de propriedade e de o contribuinte não poder ser obrigado a pagar impostos contra normas de DC, de hierarquia superior. Por conseguinte, enferma do vício de nulidade.
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As tabelas de redução do IA, previstas no DL n.º 40/93, no que concerne aos automóveis usados importados do espaço comunitário, contrariam o art. 90.º do TR, por não garantirem sempre que o montante do imposto devido não excede o montante do imposto residual incorporado no valor dos veículos similares já matriculados no território nacional, como sentenciou o TJCE no ac. do caso ... .
Em consequência, atento o princípio do primado do DC e a sua aplicabilidade directa, são inaplicáveis na ordem jurídica portuguesa e até já deviam ter sido abrogadas expressamente pelo Legislador, por respeito ao princípio da segurança jurídica.
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Tais tabelas, bem como o DL em que foram inseridas, são posteriores ao art. 90.º do TR, pelo que, segundo a jurisprudência do TJCE, firmada, entre outros, no caso Simmenthal, no mínimo, são «desprovidas de qualquer eficácia» (no sentido de que são inaplicáveis a qualquer caso, ou ineficazes); ou, mais apropriadamente, mostra-se «impedida a sua formação válida», o que deve entender-se como estando «desprovidas de existência jurídica». O que, em qualquer das hipóteses, em termos práticos (ao nível dos efeitos), corresponde melhor à figura da nulidade ou da inexistência jurídica (embora haja quem as não autonomize) do que à mera anulabilidade.
Com efeito, nulidade e inaplicabilidade são conceitos distintos, sendo a inaplicabilidade uma figura mais próxima da ineficácia e da nulidade do que da anulabilidade, que sentença indevidamente privilegiou.
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Assim sendo, e sob pena de esvaziamento de tal proibição de aplicação, os actos administrativos de liquidação e cobrança do IA que a esta tenham procedido não são anuláveis, mas ineficazes ou então nulos por natureza, conforme a tese que se perfile.
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A existência no ordenamento jurídico nacional de mecanismos como a oposição à execução com fundamento em ilegalidade abstracta da liquidação e de revisão dos actos tributários em prazos bem superiores ao de 90 concebido para a impugnação judicial e graciosa é a prova de que o direito de atacar o acto tributário e de exigir a restituição do tributo indevidamente cobrado não está necessariamente sujeito àquele curto prazo de caducidade, concebido para sindicar apenas os actos anuláveis, mas que o legislador não impôs, nem expressa, nem claramente, para os actos que violem o DC, tanto mais que a enumeração dos actos nulos no n.º 2 do art. 133.º do CPA não é taxativa.
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O vício da não conformação com o DC, por gerar um desvalor jurídico que, no mínimo, corresponde ao da nulidade do acto de liquidação impugnado, acarreta a suspensão da contagem dos prazos processuais, porquanto a mesma pode ser arguida a todo o tempo, nos termos do art. 134.º do CPA, aplicável ao processo tributário.
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Impõe-se a mesma conclusão pelo facto de não existir qualquer base normativa válida aplicável que autorize a liquidação e cobrança de tal tributo, sendo certo que a aplicação da tabela de redução do IA, por contrária ao DC, a cujo cumprimento a AT também está vinculada, representa um erro imputável ao órgão administrativo.
Este, por não existir norma nacional aplicável, facto que tem a obrigação de conhecer, incorreu em erro grosseiro, só a si imputável, exorbitou das suas competências ao praticar o acto impugnado e agiu sem base jurídica válida, pois sendo a tabela de reduções inaplicável é como se não existisse.
Deste modo, a aplicação da "lei nacional" corresponde a agir sem lei ou contra lei fundamental, de hierarquia superior (constitucional e comunitária).
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Estando a fixação dos aspectos essenciais dos impostos sujeitos à reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República e à reserva de lei, e não existindo lei conforme ao DC que valide a liquidação e cobrança do IA, as tabelas...
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