Acórdão nº 0267/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 05 de Junho de 2002

Magistrado ResponsávelMADEIRA DOS SANTOS
Data da Resolução05 de Junho de 2002
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: O Ministério Público junto do TAC de Lisboa, em representação de ..., funcionário reformado da Caixa de Previdência do Pessoal do Caminho de Ferro de Benguela (doravante designada por CPPCFB), intentou contra o Secretário de Estado da Segurança Social e o Presidente do Conselho Directivo do Centro Nacional de Pensões uma acção para o reconhecimento do direito daquele representado a auferir uma pensão reportada ao período contributivo realizado para aquela Caixa, pensão essa a acumular com a que lhe é devida em função do período em que contribuiu para a Segurança Social portuguesa pelo trabalho que prestou em Portugal; a título complementar, pediu ainda o reconhecimento do direito ao recebimento das diferenças pecuniárias entre as pensões que lhe vêm sido pagas e os montantes que, por via dessa acumulação de pensões, crê que devia ter recebido.

Através da sentença «a quo», o TAC de Lisboa, após julgar improcedentes as excepções de impropriedade do meio processual e de ilegitimidade passiva daquele Secretário de Estado, julgou a acção procedente, reconhecendo ao autor os seguintes direitos:

  1. A uma pensão calculada em função dos períodos contributivos feitos para a CPPCFB e com base nos critérios estabelecidos no DL n.º 329/93, de 25/9, e na Portaria n.º 183/94, de 31/3, com efeitos a partir de 1/1/94.

  2. A acumular com a pensão correspondente à que foi fixada pela Segurança Social portuguesa e relativa ao trabalho prestado em Portugal c) Ao pagamento das diferenças entre os montantes da pensão a fixar de acordo com as alíneas anteriores e as já pagas desde aquela data até ao presente.

    O Secretário de Estado da Solidariedade e da Segurança Social interpôs recurso dessa sentença, tendo terminado a sua alegação através da enunciação das conclusões seguintes: I - A sentença recorrida deve ser revogada em acórdão a proferir por Vossas Excelências, na medida em que: II - Considerou o recorrente como parte legítima para os termos da presente acção quando, na realidade, ocorre a excepção dilatória da sua ilegitimidade passiva, que tem de conduzir à sua absolvição da instância, nos termos dos artigos 494º, al. e), e 493º, n.º 2, ambos do CPC.

    III - Segundo veneranda jurisprudência desse tribunal, neste tipo de acções a legitimidade passiva é definida pela competência para a prática dos actos decorrentes do reconhecimento dos direitos ou interesses legítimos reconhecidos, e não segundo as regras do art. 26º do CPC.

    IV - A sentença recorrida fez, pois, errada interpretação e aplicação do art. 70º da LPTA e violou, por omissão, o disposto nas alíneas a) e b) do art. 4º e na al. h) do n.º 1 do art. 6º, ambos do DL n.º 96/92, de 27/5, na redacção que lhe foi dada pelo DL n.º 6/98, de 13/1.

    V - A procedência de tal excepção implica a não cognoscibilidade judicial da pretensão deduzida pelo ora recorrido face ao recorrente.

    VI - Se outro fosse, por mera hipótese de patrocínio forense, o entendimento de Vossas Excelências, sempre a acção em apreço teria de ser julgada improcedente e não provada, e o recorrente absolvido dos pedidos nela formulados, pelas razões e com os fundamentos de facto e de direito constantes das alegações oferecidas pelo Conselho Directivo do CNP, aqui tidas por integralmente reproduzidas para todos os legais efeitos.

    VII - O sentido do acórdão a proferir na sequência deste recurso é o perfilhado por essa Alta Instância no seu mais recente aresto, transitado em julgado, proferido sobre igual questão de facto e de direito, cuja certidão se anexa.

    O Presidente do Conselho Directivo do CNP também recorreu da aludida sentença, terminando a sua alegação com o oferecimento das seguintes conclusões: 1 - Foi interposto o presente recurso dado que se considera que a sentença viola o princípio da tipicidade da lei, art. 115º da CRP, a Lei n.º 28/84 (Lei de Bases da Segurança Social), o DL n.º 335/90, de 29/10, o Despacho n.º 16-I/SESS/94, o Despacho n.º 65-I/SESS/94 e o Despacho Conjunto n.º A-74/97-XIII, II Série do DR n.º 98, de 28/4/97.

    2 - Na realidade, o tribunal considerou que o Despacho n.º 16-I/SESS/94 estabeleceu um regime especial, próprio e exclusivo, para um grupo fechado de destinatários, reformados da CPPCFB.

    3 - Na sentença ora recorrida considerou-se: "que, quanto ao despacho n.º 16-I/SESS/94, ele teve por objecto a especificidade da situação dos pensionistas de invalidez e velhice da CPPCFB (cujo pagamento da pensão tinha cessado), sendo certo que não se limitou ao (reconhecimento dos períodos contributivos no âmbito do sistema de Segurança Social português...).

    4 - Ora, com esta interpretação, é evidente que a sentença considera que o Despacho n.º 16-I/SESS/94 criou um regime autónomo e especial para os ex-pensionistas da CPPCFB.

    5 - Contrariamente, o CNP sempre entendeu que o Despacho n.º 16-I/SESS/94 não criou para os reformados da Caixa de Benguela uma pensão autónoma, mas apenas e tão só, face ao não pagamento por essa instituição das reformas aos seus pensionistas, determinou um conjunto de orientações e procedimentos que permitiram, em 1994, o reconhecimento dos períodos contributivos efectuados pelos pensionistas de invalidez e velhice da CPPCFB, enquanto trabalhadores no activo, nos termos do DL n.º 45/93, de 20/2.

    6 - Ora, a interpretação do tribunal contraria frontalmente a «ratio» da lei.

    7 - Violando, igualmente, quer o art. 2º do DL n.º 335/90, de 29/10, quer o art. 1º do DL n.º 45/93, de 20/2.

    8 - Aliás, quem já tinha subjectivado a qualidade de titular de prestações, não pode, no âmbito do regime geral, ter direito a duas pensões, como pretende a sentença recorrida - «vide» art. 55º do DL n.º 329/93.

    9 - Se dúvidas houvesse, elas figuram dissipadas com a prolação de recente acórdão do STA, em que se confirma na íntegra a tese defendida pelo CNP.

    10 - De facto, na pág. 15 deste douto acórdão, afirma-se: "...independentemente da questão da determinação do seu valor normativo (do Despacho n.º 16-I/SESS/94), não tendo sido publicado na forma legalmente exigida, são meras instruções aos serviços, no uso de poderes de superintendência, sem valor regulamentar externo, logo insusceptíveis de fundar directamente direitos e obrigações judicialmente exigíveis".

    11 - Assim sendo, das duas, uma: ou o Despacho n.º 16-I/SESS/94 criou norma legislativa - aceite pacificamente pelo tribunal - pelo que este regulamento interno violou, obviamente, o princípio constitucional da tipicidade das leis - art. 115º, n.º 1, da CRP; ou foi o próprio tribunal que criou a norma, violando o princípio da separação de poderes - art. 111º da CRP.

    12 - Assim, a sentença viola, também, o princípio constitucional da tipicidade.

    13 - Ora, a interpretação versada na sentença viola, quer a Lei n.º 28/84 (Lei de Bases da Segurança Social), quer o DL n.º 335/90, de 29/10, o Despacho n.º 16-I/SESS/94, o Despacho n.º 65-I/SESS/94 e o Despacho Conjunto n.º A-74/97-XIII, II Série do DR n.º 98, de 28/4/97.

    14 - Na realidade, como princípio fundamental e basilar do sistema de segurança social, afirma-se e reafirma-se o princípio de que, no regime geral, os beneficiários não podem acumular mais do que uma pensão; em caso de acumulação somam-se os salários e totalizam-se os períodos contributivos.

    15 - Apenas se podem acumular pensões do regime geral com outros.

    16 - Com a publicação do Desp. Conj. A-74/97-XIII, ficaram dissipadas quaisquer dúvidas que pudessem existir.

    17 - Deste diploma retira-se, claramente, qual a intenção do legislador.

    18 - Já no decurso da interposição do presente recurso, o CNP foi notificado do acórdão do STA proferido no proc. n.º 47.497, da 1.ª Subsecção, que vem confirmar na íntegra a posição do CNP relativa à interpretação do citado Despacho n.º 16-I/SESS/94.

    O recorrido contra-alegou, formulando as seguintes conclusões: 1 - O Secretário de Estado da Solidariedade e Segurança Social tem legitimidade passiva na presente acção, atentas as disposições conjugadas do art. 70º, n.º 1, da LPTA, e art. 26º do CPC, e sendo certo que está em causa a aplicação e interpretação do Despacho n.º 16-I/SESS/94, da sua autoria.

    2 - Com a publicação do DL 335/90, de 29/12, DL 45/93, de 20/10, e DL 401/93, de 3/12, passou a ser considerado, no âmbito da segurança social portuguesa, o reconhecimento dos períodos contributivos verificados nas caixas de previdência das ex-colónias, como a CPPCFB, aos seus pensionistas, quer fossem ou não pensionistas do regime geral.

    3 - Nos termos do estatuído no art. 2º do DL 335/90, de 29/12, teve-se em vista não só o registo do período contributivo, mas também a atribuição de uma pensão, no âmbito da segurança social portuguesa, àqueles pensionistas.

    4 - A atribuição dessa pensão, e não somente o reconhecimento dos períodos contributivos, resulta expressamente do preâmbulo do DL 401/93, de 3/12, e do preâmbulo e norma I do Despacho 16-I/SESS/94.

    5 - Decorre da norma III do mesmo Despacho 16-I/SESS/94, que a atribuição das pensões requeridas nos termos do DL 335/90, de 29/12, e DL 45/93, de 20/2, se reporta a 1/1/94 ou à data do requerimento, se apresentado fora das condições mencionadas na al. a) da norma III.

    6 - O pensionista da CPP/CFB, a que se refere a presente acção, que é também pensionista do regime geral, solicitou o reconhecimento do período contributivo para aquela caixa e a fixação de pensão ao abrigo do DL 335/90 e DL 45/93 e Desp. 16-I/SESS/94.

    7 - Pelo que tem direito a que lhe seja atribuída uma pensão autónoma correspondente ao período de trabalho, e consequente período retributivo, prestado em Angola, de acordo com o único critério legal fixado naqueles diplomas.

    8 - Sendo o pensionista em causa simultaneamente pensionista do regime geral, a pensão em causa não deve, porém, ser calculada com apelo ao disposto no art. 80º do Decreto 45.266, de 23/6/63, na redacção do Decreto 486/73, de 27/9, diplomas, aliás, já revogados pelo DL 329/93, de 25/9.

    9 - Tal pensão deverá ser calculada nos termos do...

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