Acórdão nº 048420 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 16 de Abril de 2002

Magistrado ResponsávelMARQUES BORGES
Data da Resolução16 de Abril de 2002
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção do Contencioso Administrativo do STA I - A Magistrada do Ministério Público junto do TAC de Lisboa interpôs recurso jurisdicional da decisão daquele Tribunal de 15.9.2000 pela qual o Estado Português foi condenado a pagar aos AA. a quantia de 10000 contos a título de danos morais, na quantia de 4315000$00 a título de lucros cessantes e, em quantia a liquidar em execução de sentença relativamente a despesas financeiras resultantes de aceites sacados junto da Banca, de letras em carteira e de outras despesas bancárias, ao cerceamento do crédito, ao decréscimo no volume de negócios e perda de oportunidades, sendo que sobre todas as quantias em que o Estado foi condenado incide a taxa de desvalorização da moeda nacional, com base nos índices do Banco de Portugal e até efectivo reembolso.

Nas suas conclusões referiu o recorrente: 1.- Não se verificando a denominada situação de confiança criada pelo Estado e determinante do prosseguimento de fornecimentos a crédito, por estes fornecimentos terem ocorrido em momento anterior à intervenção do Estado na A..., não se verifica o primeiro dos pressupostos exigidos no art.2º do D.L. 48051 de 21.11.67, a existência de um comportamento ilícito.

  1. - Estando em causa dívidas decorrentes de fornecimentos efectuados pelo A. a crédito, em período anterior à intervenção do Estado na empresa A..., resulta a inexistência de qualquer nexo de causalidade entre a actuação do Estado nos moldes considerados na sentença recorrida e os danos alegados pelo A 3.- Assim não tendo entendido a sentença recorrida infringiu o disposto no art. 659 nº 3 do CPC.

  2. - Tendo esse Supremo Tribunal por Acórdão de 30.4.87 decidido não ser o foro administrativo competente para conhecer da actuação dos gestores designados pelo Estado, mesmo na sua qualidade de representantes e enquanto defensores dos direitos e interesses deste, não poderia o tribunal "a quo" vir contra o já decidido e transitado, sob pena de infracção do caso julgado formal que assim operou nos termos do disposto no art. 672º do CPC.

  3. - Por força do Acórdão citado, ficou a causa de pedir na presente acção circunscrita à responsabilidade do Réu decorrente da actuação de órgãos e agentes do Estado, Ministros, Conselho de Ministros).

  4. - No entanto e tal como o A configura a sua pretensão, o conhecimento do objecto da acção, por não configurar uma relação jurídica administrativa, está excluída do conhecimento da jurisdição administrativa.

    Assim: 6.a- Se a questão for considerada pelo ângulo da tutela de confiança, invocando o A o contexto jurídico-comercial (saques e aceites e letras, descontos e créditos bancários, etc.) de que emerge a sua pretensão, reconduz-se esta a uma questão de direito privado, excluída da jurisdição administrativa nos termos do disposto no art. 4º nº1, al. f) do ETAF.

  5. b- considerando que fundamenta o A a sua pretensão nas " promessas " de reestruturação do sector da distribuição efectuadas por agentes do Estado, constituem estas, actos consubstanciados num projecto político, revestindo a natureza de actos próprios da função política, actos esses, bem como a responsabilidade pelos danos decorrentes desse exercício que constituem matéria excluída da jurisdição administrativa, nos termos do disposto no art. 4º nº.1 al. a) do ETAF.

  6. c- se se entender que o que está em causa é a alegada omissão de medidas que levassem à efectiva criação da empresa pública de distribuição, nesse caso, revestindo tal medida a natureza de medida de direcção ou intervenção económica do mercado, relevaria ela inteiramente da discricionariedade legislativa do Governo. Pelo que estaria em causa o exercício (ou omissão) da função legislativa, questão que igualmente não cabe no âmbito da jurisdição administrativa, de acordo com o preceituado no art. 4º.nº.1 alínea b) do ETAF.

    6.ºd - Finalmente e na parte em que o A faz decorrer os prejuízos alegados, do facto do Estado não ter adoptado as medidas necessárias à preservação do património da A..., após a declaração de falência, a responsabilidade por tal não será imputável ao Estado no âmbito da responsabilidade extracontratual por acto de gestão pública, uma vez que a administração dos bens que compõem a massa falida, compete ao liquidatário judicial - art. 141 do D.L. 132/93 de 23.4. (Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e da Falência ), cabendo impugnação dos actos do liquidatário judicial para o juiz do processo( art. 136 do mesmo diploma). Pelo que, está igualmente excluído do âmbito da jurisdição administrativa a responsabilidade por actos e omissões decorrentes do exercício das funções de liquidatário judicial.

    Pelo que deve ser julgado procedente o recurso e revogada a decisão recorrida. II.- Os AA não contra- alegaram. III- Colhidos os vistos legais cumpre decidir. A) A decisão recorrida deu como assente a seguinte matéria de facto: A - O A. é comerciante em nome individual e dedica-se à actividade de edição e comércio de livros. B - No exercício desta actividade o A. manteve relações comerciais com a A..., C - Em Setembro de 1973, iniciou o A. relações comerciais com a A..., tendo trocado com a mesma correspondência para a distribuição de algumas das suas obras. D - Em meados de 1974, o A. estabeleceu com a A... um contrato de - distribuição exclusiva das suas edições.

    E - A A... cumpriu as suas obrigações até Março de 1975.

    F - Em 7 de Abril de 1975, a A... vem denunciar unilateralmente o contrato que firmara em Janeiro.

    G - Em 28 de Setembro de 1977, o Conselho de Ministros deliberou determinar, ao abrigo do disposto no Dec. Lei nº 422/76, de 29 de Maio, a intervenção do Estado nas empresas A... e B... ; H - Em 17 de Janeiro de 1979, o Governo decretou a desintervenção da A.... e determinou que seja requerida a falência.

    I - Em consequência da nacionalização da C..., o Estado Português ficou detentor de posição maioritariamente no capital social da A... .

    J - Em 7 de Setembro de 1975 a Comissão de Trabalhadores da A... fez a exposição de fls. (arts. 38º a 42º PI; doc. 33 P.I.) L - Por despacho do Secretário de Estado dos Investimentos Públicos de 17.12.75, foram recomendadas à banca, até que se definissem as linhas de reestruturação do sector, em prazo limite que se dizia haver conveniência em fixar, a reforma integral, por 90 dias, "dos efeitos descontados letras e aceites bancários) "relativos às empresas editoriais e de distribuição cujo vencimento ocorresse até 28.2.76 e a substituição dos já vencidos, com cobrança dos respectivos juros [art. 48º P.I., doc. 36 P.I.].

    M - Por despacho de 13.3.76 da mesma entidade, foi recomendado aos bancos, por intermédio do grupo de trabalho de financiamento do Banco de Portugal, que tivesse em consideração, por um período adicional de 60 dias, o anterior despacho de 17.12.75 [art. 51' P.1. doe. 37 P.1.1.

    N - Por despacho de 16.3.76 a mesma entidade determinou que não contasse para efeitos de plafond de crédito dos fornecedores das empresas editoriais e de distribuição os saques dos fornecedores cuja regularização se encontrasse delas dependentes e que, consequentemente, lhes fossem concedidas novas facilidades de crédito [art. 45 e 51 PI; doe. 38 P11; O - Por despacho de 20.05.76, o Subsecretário de Estado dos Investimentos Públicos comunicou à Direcção Geral da Fazenda e ao Banco de Portugal ter sido decidida em Conselho de Ministros a concessão de um aval de 11.000 contos à A... [arts. 45 e 58 P.I.; doe. 39 P11; P - Por despacho de 19.7.76 a mesma entidade concedeu um aval de 3.500 contos à A..., referindo...

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