Acórdão nº 026774 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Março de 2002

Magistrado ResponsávelBAETA DE QUEIROZ
Data da Resolução20 de Março de 2002
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

1.1. O MINISTÉRIO PÚBLICO e a FAZENDA PÚBLICA recorrem da sentença do Mmº. Juiz da 2ª Secção do 1º Juízo do Tribunal Tributário de 1ª Instância de Lisboa que julgou procedente a impugnação das liquidações de emolumentos registrais deduzida por A..., S.A., com sede em Carnaxide, Oeiras.

1.2. O Ministério Público formula as conclusões seguintes"a)os emolumentos foram liquidados em 22.02.94; 24.12.94 e 23.12.97b)são de qualificar como taxas e não como impostos:c)os vícios de que possam padecer estão sujeitos à anulabilidade e não à nulidade;d)a sua impugnação estava sujeita ao prazo previsto no disposto no artº 102º do C.P.P.T;e)prazo este que é peremptório, de caducidade e de conhecimento oficioso - artº 333º do C.C.;f)quando foi deduzida, "in casu", a impugnação há muito estava ultrapassado aquele prazo;g)estando, pois, verificada a sua extemporaneidade.

h)foram, assim, violadas, na douta sentença recorrida, desde logo, as disposições legais previstas nos artigos 102 do C.P.P.T. e 333º do C.C".

1.3. A Fazenda Pública, por sua vez, conclui assim as suas alegações:"1)A posição assumida no douto aresto quanto à tempestividade da acção, não encontra eco no entendimento jurisprudencial dominante, de acordo com o qual o regime aplicável à liquidação efectuada com base em preceito que se mostre em desconformidade com normas constitucionais é a anulabilidade, do qual decorre, por sua vez, a inaplicabilidade, ao caso sub judice, do regime de nulidade constante do artº 134º do CPA.

2)Assim, não sendo nula, mas tão só, anulável, não poderia a liquidação em causa ser impugnada a todo o tempo, mas, apenas, no prazo previsto no 23º nº 1 do CPT (idêntico, aliás, ao estabelecido no artº 102º nº 1 do CPPT), pelo que, tendo este sido largamente ultrapassado, a impugnação resulta intempestiva, por tardia.

3)O artº 43º da LGT, sucedendo ao artº 24º do CPT, mantém, no respectivo nº 1, a garantia respeitante ao direito a juros indemnizatórios designadamente quando, em impugnação judicial, se determine que houve erro imputável aos serviços de que tenha resultado pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

4)Sendo certo que o erro a que se reporta o sobredito preceito será o erro não só de facto mas também de direito na liquidação, deverá, não obstante, ser demonstrada a susceptibilidade de imputação do mesmo aos serviços, bem como a necessária repercussão directa do referido erro no que respeita ao montante da dívida tributária que tenha sido objecto de pagamento sendo, por conseguinte, indispensável proceder à indicação da quantia que seria legalmente devida.

5)Ora, no caso vertente, constata-se que não só o apuramento do montante em causa resultou da mera aplicação, pelos serviços, dos normativos então vigentes, como também não consta da sentença recorrida qualquer referência ao eventual acréscimo no que respeita ao montante objecto de pagamento, como consequência da verificação do questionado erro, não tendo, aliás, a decisão em causa procedido à definição do montante da dívida que seria legalmente exigível, sendo certo que as normas de Direito Comunitário aplicáveis não impõem a gratuitidade do serviço prestado e que não existe qualquer normativo susceptível de aplicação alternativa.

6)Decorre do supra referido que a decisão recorrida, ao considerar tempestiva a impugnação deduzida para além do prazo previsto no artº 123º nº 1 do CPT, com base em pressuposto que se mostra claramente contrário ao entendimento jurisprudencial dominante, viola o citado preceito, tal como, ao reconhecer à impugnante o direito a juros indemnizatórios sem que, para tanto, se verificassem cumulativamente os pressupostos constantes do artº 43º do, nº 1 da LGT, faz uma aplicação inadequada deste segmento normativo, pelo que deverá ser revogada, com as legais consequências (...)".

1.4. A recorrida contra-alega, pugnando pela manutenção do julgado, extraindo as seguintes conclusões:"1.

"Quer os emolumentos (...) constituam taxa, quer imposto, são incompatíveis com a alínea c) do artigo 10.º da Directiva 69/335/CEE, do Conselho, de 10 de Outubro de 1985, na interpretação dada pelo TJCE, o que torna despicienda a discussão sobre a correcta qualificação daqueles tributos" (Acórdão do S.T.A., de 13.12.2000, processo n.º 25125).

  1. Da procedência desta questão de fundo que já é pacífica, necessariamente resulta a tempestividade da impugnação apresentada, porquanto existindo no direito processual interno disposição que permite reclamar a todo o tempo a restituição de montantes indevidamente cobrados, com fundamento no desrespeito do direito nacional (o artigo 102.º, n.º 3 do Código de Procedimento e Processo Tributário), uma impugnação baseada na violação do direito comunitário não pode receber um tratamento menos favorável ( princípio da equivalência).

  2. Acresce que a mesma jurisprudência determina que o exercício de direitos comunitários não deve tornar-se impossível, ou sequer excessiva ou indevidamente difícil em virtude da aplicação de prazos de caducidade, fixados em geral na legislação nacional (princípio de efectividade), que é seguramente o que sucede com a aplicação de um prazo de caducidade de 90 dias a contar do pagamento contestado, por maioria de razão quando o fundamento da impugnação em questão reside no incumprimento pelo Estado de uma directiva comunitária, atento o grau de desconhecimento dos particulares relativamente às respectivas disposições - desconhecimento, de resto, legítimo, já que as directivas não se lhes dirigem.

  3. Por força dos princípios fundamentais do primado e do efeito directo, as normas nacionais contrárias ao direito comunitário e respectivos actos de execução são inaplicáveis de pleno direito, podendo tal inaplicabilidade ser invocada a todo o tempo, pelo que a norma processual relevante para aferir da tempestividade da Impugnação apresentada é a estatuída no artigo 102.º, n.º 3 do CPPT, sem prejuízo da aplicação do prazo prescricional das obrigações tributárias, o qual salvaguarda assim os interesses da segurança e certeza jurídicas.

  4. Em todo o caso, a ora Recorrida permite-se recordar que, se dúvidas subsistissem quanto ao bem fundado da posição supra descrita, o que, de resto, não se antevê, este Ilustre Tribunal teria a obrigação de suspender a instância, já que decide em último grau de jurisdição, e de recorrer ao meio que o artigo 234.º do TCE concede aos juízes nacionais, como forma de assegurar a aplicação uniforme do direito comunitário em todos os Estados-membros, a saber, o mecanismo de reenvio...

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