Acórdão nº 035590 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Março de 2002

Magistrado ResponsávelPIRES ESTEVES
Data da Resolução19 de Março de 2002
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na 1ª Secção (2ª subsecção) do Supremo Tribunal Administrativo: A...., com sede na ..., Porto, interpôs recurso contencioso de anulação do despacho do "despacho ministerial" de 18 de Abril de 1994 que revogou os alvarás da concessões mineiras nº l997-Santo António, nº 1998- Viveiros, nº 2-Quinta da Ribeira e nº l-Docotim, com fundamento em suspensão ilícita da exploração nos termos dos nºs 1 e 2, alínea d), do artigo 34° do Decreto-Lei nº 88/90, de 16 de Março, conjugado com o artigo 46° n° 1, do Decreto-Lei n° 90/90, da mesma data. Imputou ao acto impugnado a violação do disposto nos artigos 879° e seguintes do Código Civil, 32°,205° n° 1, 213° n° 1, 27° n° 2, 211° n° 4, 266° n° 2 e 18° nº l, da Constituição, e 46° n° 3, 53° e 79º alínea a), da Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais (Lei n° 38/87, de 23 de Dezembro), o que integraria vícios de violação de lei e de usurpação de poder .

Notificado o Ministro da Indústria e Energia, nos termos e para os efeitos do artigo 43° da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos, surgiu a responder o Secretário de Estado da Indústria (fls. 183 a 187), por ser da sua autoria o despacho recorrido, propugnando a improcedência do recurso.

A recorrente apresentou as alegações de fls. 196 a 239, formulando, a final, as seguintes conclusões: "1 - O despacho ministerial de 18 de Abril de 1994 revogou os alvarás das concessões mineiras n.º 1997 - Santo António, n.º 1998 - Vieiros, n.º [3507] - Quinta da Ribeira n.º 2, e n.º [3508] - Docotim n.º 1, à recorrente com fundamento em suspensão ilícita da exploração nos termos dos n.ºs 1 e 2, alínea d), do citado artigo 34.º do Decreto-Lei n.º 88/90, conjugado com o artigo 46.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 90/90, ambos de 16 de Março.

2 - O despacho recorrido parte de pressupostos errados: - o de que a recorrente é a titular das concessões e o de que, por culpa imputável a esta, porque titular das concessões, ocorre uma suspensão ilícita da exploração de tais concessões.

3 - Até à data de 4 de Abril de 1987, a recorrente A.., era propriedade de sócios distintos dos actuais.

4 - Por escritura pública outorgada na data de 4 de Abril de 1987, no Primeiro Cartório Notarial de Santa Maria da Feira, a totalidade dos anteriores sócios alienaram a favor dos actuais sócios da recorrente as participações sociais que detinham na recorrente, concessionária daquelas concessões.

5 - Esta escritura pública de cessão de quotas foi presenciada por B... que acompanhou todas as diligências que antecederam a celebração do negócio de cessão destas quotas e acompanhou os outorgantes nesta escritura de cessão .

6 - Nessa mesma data de 4 de Abril de 1987, mas após a referida cessão de quotas, também no 1.º Cartório Notarial de Santa Maria da Feira, foi assinado um contrato entre a recorrente como primeira outorgante e o B..., como segundo outorgante, e no qual este prometeu vender àquela pedidos de concessão denominados de ..., ..., ... e ..., tendo ficado, para garantia do contrato, como depositário dos alvarás de concessão das minas da recorrente.

7 - Após a outorga deste contrato, a recorrente teve conhecimento que, por força do artigo 50.º da Lei das Minas - Decreto n.º 18 713, de 1 de Agosto de 1930, «sobre as concessões mineiras não podem ser celebrados quaisquer contratos sem prévia autorização do Secretário de Estado da Indústria (actualmente, Secretário de Estado da Energia), pelo que o contrato era nulo por não ser instruído por prévia autorização ministerial.

8- Na data de 10 de Outubro de 1989, o B..., ultrapassando a sua qualidade jurídica de depositário dos títulos de concessões, utilizou os requerimentos das concessões, dados como garantias, e pediu as transmissões dessas concessões ao Secretário de Estado da Energia.

9- Na data de 26 de Dezembro de 1989, a recorrente, em resposta a um ofício da Direcção-Geral de Geologia e Minas, chamou a atenção dos Serviços de Administração Industrial para o facto da: apresentação feita por aquele B... dos quatro requerimentos ser abusiva e indevida, já que tais documentos haviam-lhe sido entregues como garantia de um contrato e nunca para serem utilizados para requerer transmissões de propriedade.

10 - As referidas transmissões foram autorizadas pelo Secretário de Estado da Energia por Portaria de 8 de Fevereiro de 1990.

11 - Os sócios da recorrente só tomaram conhecimento do facto através do Boletim de Minas, n.º 27-1/1990, de Julho de 1990.

12 - Dirigiram-se, de imediato, à Direcção de Geologia e Minas e obtiveram a informação de que tinha sido feita uma escritura de venda das concessões no 5.º Cartório Notarial do Porto, na data de 1 de Março de 1990.

13 - Nesta escritura, o B... utilizara uma procuração antiga, outorgada pelo antigo sócio gerente da recorrente, em data anterior à que o B... sabia ter cessado as funções de gerente daquele sócio cedente das suas quotas e dissera nessa escritura que vendera a si próprio as concessões da A... pela quantia de 1500 contos, quantia que a recorrente nunca recebeu nem com a qual nunca tinha acordado.

14 - Tal ocorrência tivera a sua origem no facto do B... ter usado uma procuração que tinha em seu poder , emitida pela A..., na data de 21 de Novembro de. 1985, na Secretaria Notarial de Vila do Conde, anterior, pois, à data de aquisição da recorrente pelos actuais sócios desta.

15 - A recorrente, desde a data referida das cessões de quotas, 4 de Abril de 1987, nunca havia dado quaisquer instruções, ordens, para que o B... vendesse fosse o que fosse.

16 - Acresce que o B... antecipadamente e desde sempre, sabia que após aquela data de 4 de Abril de 1987, os sócios e os gerentes da recorrente eram pessoas diferentes do sócio e gerente de 1985 e que a recorrente, através dos seus actuais sócios e gerentes, nem sequer sabia ou podia prever que o B... tinha em seu poder qualquer procuração da recorrente para representar esta.

17 - Acresce que o B... sabia e tinha pleno conhecimento e consciência que a recorrente não sabia da existência da procuração que usou para. a outorga da escritura e que nem sequer podia prever que o B... tinha em seu poder tal procuração .

18 - Acresce ainda que nenhum preço existiu nem nunca foi acordado qualquer preço para a venda das. concessões referenciadas nem a recorrente recebeu qualquer preço derivado desta venda de 1 de Março de 1990, tendo o B... prestado falsas declarações no Notário ao indicar o preço de 1500 contos e ao dizer que a recorrente já recebera este preço.

19 - A recorrente instaurou, então, no Tribunal Cível do Porto, uma acção ordinária de declaração de nulidade da escritura de venda de 1 de Março de 1990 lavrada pelo B..., no 5.º Cartório Notarial do Porto, a qual se mantém pendente no 9.º Juízo Cível, 3.ª Secção, tendo o n.º 7248.

20 - A recorrente, na data de 16 de Agosto de 1990, comunicou por escrito ao Senhor Secretário de Estado da Energia a ocorrência dos factos e requereu que não procedesse à homologação das transmissões em causa e ordenasse o arquivamento dos processos e fez comunicação idêntica ao Senhor Director-Geral de Geologia e Minas em que pediu a suspensão do processo até decisão judicial.

21 - A recorrente chegou, até, a instaurar uma providência cautelar contra o Senhor Secretário de Estado da Energia e Direcção-Geral de Geologia e Minas para evitar a homologação da aquisição.

22 - O Senhor Secretário de Estado veio a indeferir a homologação da venda e aquele B... recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo da decisão de não homologação, tendo o processo o n. º 29 183.

23 - Por sua vez, a recorrente instaurou no 9.º Juízo Cível da Comarca do Porto uma acção ordinária contra o B..., pedindo a declaração da nulidade da venda.

24 - Neste momento, a titularidade das concessões encontram-se em duas situações de litígio, ambas decorrentes da transmissão feita por escritura de 1 de Março de 1990 e cuja decisão tem influência decisiva na validade e eficácia da transmissão : a) - uma, que corre termos no Supremo Tribunal Administrativo, em que se discute a homologação ou não da aquisição feita por B... e que é , condição da eficácia da transmissão; b) - uma outra, que corre termos no Tribunal Cível do Porto, em que se discute a transmissão feita e que é condição da. validade da transmissão ou sua nulidade.

25 - A recorrente A.... não tem legitimidade actual (desde 1 de Março de 1990) para praticar actos válidos como concessionária enquanto a decisão jurídica a proferir na acção em que pediu o decretar da nulidade ou a declaração da anulação da transmissão escriturada em 1 de Março de 1990 não julgar a acção procedente e a mesma transitar em julgado.

26 - A recorrente, como resulta claro do exposto, não colocou a exploração em situação de suspensão ilícita e, pelo contrário, foi um acto ilícito praticado por terceiro (B...) quem colocou a exploração em situação de suspensão .

27 - Nos termos da lei do processo, e face ao princípio da estabilidade da instância, a partir do momento em que foi iniciada a discussão jurídica e, mais do que isso, a discussão judicial, tem que considerar-se suspensos todos os prazos legais a serem cumpridos por força da titularidade da exploração.

28 - A titularidade das referidas explorações e legitimidade para a execução de todos os trabalhos e tarefas inerentes às mesmas concessões está dependente da procedência da acção ordinária n.º 7248/90 que a recorrente interpôs contra B... e que pende na 3.ª Secção do 9.º Juízo Cível do Tribunal da Comarca do Porto.

29 - Tendo a instauração dos processos (judicial e administrativo) estabilizado a instância e decidido quanto à suspensão da contagem de prazos para o exercício de direitos, deve igualmente ser decidido e ordenada a suspensão da contagem de prazos para a prática de actos de execução, de pesquisa e lavra mineira, até decisão final, transitada em julgado, dos referidos processos.

30 - lnexiste norma, seja da legislação nacional, seja na legislação comunitária, que legitime a imposição à recorrente da...

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