Acórdão nº 021240 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 30 de Janeiro de 2002

Data30 Janeiro 2002
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, no Plenário do Supremo Tribunal Administrativo:A - O relatório 1. A..., com os demais sinais dos autos, dizendo-se inconformada com o acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário, de 02 de Dezembro de 1999, o qual negou provimento ao recurso jurisdicional interposto do acórdão da Secção de Contencioso Tributário do mesmo Supremo Tribunal, de 25 de Março de 1998, que julgou deserto o recurso contencioso interposto do despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais por haver entendido como falta das alegações a que alude o art.º 67º do RSTA o requerimento feito pela recorrente de dar "como reproduzido e integrado para todos os efeitos legais tudo quanto se deixou alegado em sede de requerimento de recurso de fls. ... (petição inicial do recurso contencioso), para cujo teor e fundamentação integral se remete", dele recorre para esta formação judicial, sustentado estar o aí decidido em oposição com o julgado no acórdão da Secção do Contencioso Administrativo do mesmo Supremo Tribunal, de 11 de Maio de 1995, prolatado no Proc. n.º 30 938.

  1. O acórdão preliminar de fls. 466 e segs. dos autos julgou verificada a alegada oposição de julgados e ordenou o prosseguimento do recurso.

  2. Alegando sobre o objecto do recurso, a recorrente refutou o decidido com base nos fundamentos que sintetizou nas seguintes conclusões: "1ª - No moderno pensamento jurídico, estão definitivamente ultrapassados os acanhados limites do positivismo; ao conceptualismo sacralizado na lógica dogmática dos conceitos sucedem-se a jurisprudência dos interesses, que afirmando o primado dos interesses reais que subjazem à lei, outorgam aos Tribunais a certamente mais nobre missão de, satisfazendo as necessidades da vida, proceder a um juízo normativo dos critérios de valoração da Lei, em definitivo rompimento com o estéril método de subsunção lógico-formal; 2ª - Como assim, também no direito processual, a lógica dogmática deve ceder a vez à interpretação teleológica e, nesse enfoque, o processo deve ser entendido como uma organização normativa de actos que, viabilizando a discussão de toda e qualquer litígio levado a juízo, permita atingir o objectivo que é a razão primeira e última da actividade jurisdicional - rectius: a boa decisão da causa.

    3ª - Na apreciação da questão sub judicio dever-se-á ainda ter em consideração os novos ventos que, com a reforma de 95, enformam o processo civil, na qual se aprofundou e privilegiou a verdade material sobre a verdade formal, a prevalência da substância sobre a forma; 4ª - Privilegiando o formal ao material, sacrificando a interpretação normativa ao rito sacramental e conceitualista, o douto acórdão recorrido decidiu ao arrepio desse moderno pensamento metodológico que os Códigos há muito acolheram e fizeram seu; 5ª - Com efeito, na petição de recurso, a recorrente alegou exaustivamente, ao longo de 174 artigos, as razões de facto e de direito que consubstanciam os vícios imputados ao acto impugnado, terminando por sumariar essas proposições, dissecados desenvolvidamente, em 17 conclusões; de sorte que, ao remeter expressamente, em sede de alegações, para todos e cada um desses fundamentos fáctico-juridícos, a recorrente reverteu para essa peça processual as razões de discordância do acto recorrido, as quais dela ficam a fazer parte integrante; 6ª - Por via dessa remissão, o Tribunal ficou plenamente habilitado a conhecer e decidir dos fundamentos de facto e de direito do recurso.

    7ª - De resto, quer no Parecer do Digno Representante do Ministério Público junto aos autos a fls.... quer no acórdão recorrido se considerou que a petição inicial de recurso continha elementos bastantes para valer como alegação; 8ª - Como tal, foi cabalmente cumprido o ónus de alegar, por decorrência do princípio de que a remissão para um articulado ou documento vale como alegação da matéria de facto e direito dele constante; 9ª - No rigor das coisas, ao expor, desenvolver e, a final, sintetizar em conclusões todas as razões fáctico-jurídicas do recurso contencioso, a recorrente cumpriu na petição, por antecipação, o ónus de alegar; 10ª - Assim antecipadas, as alegações mostram-se conformes aos ditames legais, pois se os prazos judiciais não se podem exceder nada proíbe que se antecipem; 11ª - Mesmo que, por força dessa remissão, as alegações possam ser consideradas como pouco ortodoxas, a sua eventual imperfeição, que apenas dialeticamente se figura, não obsta ao conhecimento do recurso que só pode ser considerado deserto em face de absoluta falta de alegações; 12ª - Devendo em qualquer caso, considerar-se o modo como a recorrente produz as suas alegações como uma mera irregularidade irrelevante que em nada influi no exame e decisão da causa; 13ª - Em todo o caso, ao abrigo do princípio do aproveitamento dos actos processuais e perante o teor da peça processual de fls..... epigrafada de Alegações bem como o teor da petição de recurso para a qual aquela remete deveria ter sido considerado cumprido pela recorrente o ónus de alegar; 14ª - Ainda que se entenda estarmos perante um caso de falta de alegações, mesmo nessa derradeira alternativa apenas hipotizada para feitos de demonstração de raciocínio, não há lugar à deserção do recurso, pois nos recursos interpostos directamente para o STA, não é aplicável a sanção prescrita no art.º 690º n.º 2 do Cód. Proc. Civil, em cuja previsão se louva a douta decisão recorrida - cfr. jurisprudência citada em ( ) supra; 15ª - No acórdão recorrido violaram-se, data venia, as normas supra citadas, nomeadamente, o art.º 67º, § único do RSTA, o art.º 137º, 138º, 291º e 690º do Cód. De Proc. Civil; 16ª - o acórdão recorrido ao interpretar os art.ºs 291º, n.º 2 e 690º, n.º 3 no sentido em que o fez, violou ainda o direito constitucional à tutela judicial efectiva, consagrado no art.º 20º da Constituição.

    17ª - O conflito de jurisprudência entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento deve, assim, ser resolvido, em conformidade com o entendimento perfilhado neste último que corresponde, de resto, à jurisprudência amplamente dominante".

  3. A autoridade recorrida contra-alegou defendendo o julgado com base nas razões sintetizadas nas seguintes conclusões: "A - O douto acórdão recorrido ao concluir que a exigência legal de apresentação de alegações não pode ser substituída pela remissão para a petição de recurso e, consequentemente, que tal facto implica o não cumprimento do ónus de alegar que conduz à deserção do recurso, fez uma correcta interpretação e aplicação da lei aos factos.

    B - No recurso contencioso de anulação, existem dois ónus distintos a cargo do recorrente que pretende fazer valer a sua pretensão de ver anulado determinado acto administrativo, a saber: a apresentação de uma petição de recurso e, na fase de discussão da causa, a apresentação de alegações.

    C - Estas são peças processuais distintas, estão sujeitas a formalismos diversos, tem finalidades próprias e ocorrem em momentos processuais distintos, logo não podem ser apresentadas conjuntamente.

    D - Assim, não pode a apresentação da petição inicial ser entendida como uma apresentação antecipada das alegações do mesmo recurso.

    E - Impondo a lei ao recorrente o ónus de apresentar alegações, concluindo pelas razões pelas quais se pede a anulação do acto sob recurso, não pode o mesmo dispensar-se do cumprimento de tal ónus transferindo para o tribunal o encargo de seleccionar, dentre tudo o que foi referido na petição de recurso aquilo que pode consubstanciar uma alegação.

    F - E não obstando à deserção do recurso o facto de a referida petição de recurso conter conclusões.

    G - Por outro lado, é aplicável aos recursos directamente interpostos para o STA, o § único do art.º 67º do RSTA, pelo que, à alegação e à sua falta é aplicável o disposto no art.º 690º do CPC quanto á deserção do recurso por falta de apresentação de alegação.

    H - Não há qualquer inconstitucionalidade na interpretação feita pelo acórdão recorrido dos art.ºs 291º n.º 1 e 2 e 690º n.º 3 do CPC de que a falta de alegação implica a deserção do recurso, uma vez que este facto não restringe o direito de acesso aos tribunais".

  4. O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso por, segundo diz, sufragar "a...

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