Acórdão nº 048061 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 15 de Janeiro de 2002
Magistrado Responsável | FERREIRA NETO |
Data da Resolução | 15 de Janeiro de 2002 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo.
I - A..., viúva, doméstica, por si e em representação dos seus filhos menores à altura B... e C..., intentou contra a Câmara Municipal de S. João da Pesqueira " acção sobre responsabilidade civil".
A fundamentar o pedido alegou a morte por afogamento de D..., pai de seus filhos e que foi seu marido, na piscina daquela Câmara e por conduta ilícita e culposa da mesma.
Invocou danos materiais e morais, que calculou em 14.300.000$00.
A R. contestou por impugnação, negando a sua responsabilidade e, afirmando em qualquer caso, o valor exagerado dos danos, concluindo pela improcedência da acção.
Foi proferido despacho saneador e elaborados a especificação e o questionário, que foram objecto de reclamação de ambas as partes, parcialmente atendidas.
Após 7 anos de demora no cumprimento da carta rogatória enviada à Justiça Francesa, os AA. vieram a desistir da mesma.
Entretanto os dois filhos de A... atingiram a maioridade, tendo junto por isso as respectivas procurações forenses.
Instruídos os autos, procedeu-se a julgamento, tendo aí os AA ampliado o pedido para 39.000.000$00.
O Tribunal Colectivo respondeu aos quesitos e fundamentou pela forma constante de fls. 204 a 206.
A Ré Câmara alegou de direito.
Pelos despachos de fls. 32, 216 e 217 foi concedido aos AA. o apoio judiciário na modalidade de dispensa de preparos e do prévio pagamento de custas.
A final foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente provada e procedente, condenou a Câmara Municipal de S. João da Pesqueira a pagar as seguintes quantias: - à A. A..., 14.833.000$00; ao A. B..., 4.233.500$00; à A. C..., 4.513.500$00.
Inconformada a R. interpôs recurso para este STA, o mesmo tendo feito os AA, por forma subordinada.
Oportunamente a Câmara Municipal de S. João da Pesqueira apresentou as suas alegações, que concluiu assim: - "1º - No caso vertente pode alterar-se por força do disposto no nº 1 alínea a) do artº. 712º do CPC a decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto (reporta ao quesito 5º).
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- Dos autos constam todos os elementos que serviram de base à resposta ao referido quesito.
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- A resposta a dar a tal quesito, por V. Exª, deverá ser a de não provado.
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- Os Senhores Juízes da 1ª Instância ao responderem provado a tal quesito e ao fundamentarem a sua resposta violaram o disposto no artº 653º - 2 do CPC e 342º - 1 do CPC.
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- Inexiste, no caso em apreço, legislação que obrigue a haver nas chamadas piscinas municipais de recreio pessoal de vigilância e socorro.
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- Não houve no caso vertente qualquer ilicitude derivada de uma omissão por infracção de regras de prudência comum, pelo que neste particular a sentença posta em crise violou o artº 6º do DL 48051 de 26/11/67 e 483 - 1 do CC.
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- São condicionantes da obrigação de indemnizar os requisitos "ilicitude" e "culpa" e estes não se verificaram no caso vertente.
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- Julgando por isso totalmente improcedente a presente acção farão V Exªs Justiça.
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- Sem conceder e por obrigação decorrente do patrocínio dir-se-á estarem manifestamente empolados os valores encontrados a título de indemnização e ter a actualização do pedido decorrido de uma demora de anos não assacável à ré /recorrida, pelo que a ser fixada qualquer indemnização não deverá esta no seu total ultrapassar 14.300.000$00; Os AA contra - alegaram neste recurso, concluindo assim: " 1º - Ao contrário do sustentado pela recorrente, não é possível alterar-se a resposta dada pelo Colectivo ao quesito 5º do questionário uma vez que não consta dos autos toda a prova produzida a seu propósito; 2º - Nomeadamente, não constam os depoimentos produzidos em audiência pelas três testemunhas arroladas pela Ré ouvidas, por sua indicação, a esse quesito; 3º - A inexistência de legislação que obrigue a haver nas chamadas piscinas municipais de recreio pessoal de vigilância e socorro não isenta de culpa a Câmara Municipal - ou qualquer outra entidade - quando não disponha desse pessoal e se verifique um afogamento; 4º Uma piscina é por natureza um local perigoso quer para quem não saiba nadar quer para quem o saiba, propiciando afogamentos; 5º - Apenas a existência de pessoal de vigilância e socorro é susceptível de minimizar essa perigosidade; 6º - A culpa da Recorrente Câmara radica, ainda, no facto de ter aberto ao público uma piscina "com água turva, de modo a ver-se com dificuldade o fundo da mesma", o que também propicia acidentes e inibe salvamentos, quando necessários, como foi o caso dos autos; 7º - A culpa da Recorrente no infortunado afogamento dos autos sempre se presumiria, nos termos dos nºs 1 e 2 do artº. 493 do C. Civil; 8º - Os montantes indemnizatórios fixados pecam é por defeito não por excesso como se procurará demonstrar no recurso subordinado interposto pelos aqui recorridos; 9º - A douta sentença recorrida não violou qualquer quesito legal, mormente os indicados pela Recorrente." Entretanto os mesmos AA alegaram o recurso subordinado que haviam interposto, concluindo pela seguinte forma: "1ª - Considerando a matéria de facto provada e assente, as indemnizações devidas a cada um dos AA. em função da morte do seu infeliz marido e pai (excluindo a compensação pela perda do seu direito à vida) são as seguintes: - À A. viúva - 15.000.000$00, sendo 5.000.000$00 a título de danos morais próprios; - ao A. B... - 10.000.000$00, sendo 4.000.000$00 a título de danos morais próprios; - à A. C... - 9.000.000$00, sendo 4.000.000$00 a título de danos morais próprios.
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- Os montantes indicados resultam entre outros, do disposto nos artºs .495º, nº 3 e 562º do C. Civil e, no que tange a danos morais, da equidade para que o artº 496º do mesmo Código remete; 3ª - Ainda que, ao menos na aparência, a indemnização não tenha função punitiva (ao contrário, p. ex., do que sucede no direito norte americano), não pode deixar de relevar-se que a morte do infeliz D... ocorreu numa actividade de lazer da família que devia proporcionar alegria e bem estar e, contra todo o "dever ser" redundou em tragédia, por culpa grave da Ré; 4 - Tendo os montantes indemnizatórios sido à data da sentença, após ela e até efectivo pagamento correm juros à taxa legal, pois a Ré está em mora pelo menos desde a citação; 5 - Quando não decidiu como acima propugnado a douta sentença violou o disposto nos artºs. 495º, nº 3, 496º e 562 do Código Civil citados na...
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