Acórdão nº 640/06.4TUGMR.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Junho de 2011

Magistrado ResponsávelGONÇALVES ROCHA
Data da Resolução30 de Junho de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: Processo n° 640/06.4TUGMR.P1.S1-4ª secção 1---- AA, intentou uma acção com processo especial, emergente de acidente de trabalho, contra BB, CC, DD e contra BB, Unipessoal, Ldª, pedindo que os RR sejam condenados a pagar-lhe, solidariamente, os seguintes valores: a) - Com início em 15-9-2006, a pensão anual e vitalícia de € 2.883,00, que passará para o montante anual de € 3.844,00 a partir da idade da reforma, quando atingir 65 anos de idade ou caso ocorra incapacidade para o trabalho; b) - A quantia de € 3.087,20, referente a despesas de funeral com transladação; c) - A quantia de € 20,00, referente a despesas efectuadas nos transportes ao Tribunal e d) - Juros de mora, à taxa legal, atento o disposto no artigo 135° do Cód. Proc. do Trabalho.

Alegou para tanto e em síntese, que o seu falecido marido, EE, foi vítima dum acidente de trabalho mortal, ocorrido no dia 13/9/2006, quando trabalhava por conta de todos os RR., cuja responsabilidade infortunística não se encontrava transferida para qualquer seguradora. Auferia então a retribuição anual de € 600,00 x 14 meses, acrescida de € 5,00 por dia de trabalho, caso o almoço não lhe fosse pago, tendo o acidente consistido em ter sofrido uma queda que lhe provocou lesões na cabeça e de que veio a falecer no dia 14/9/2006.

O Instituto de Segurança Social, IP (como sucessor do Centro Nacional de Pensões) deduziu contra os mesmos RR., pedido de reembolso do subsídio por morte e das pensões de sobrevivência que pagou à A. e que no período de Outubro de 2006 a Setembro de 2007 totalizaram €4.298,06, acrescidas das demais quantias que, a este título, lhe venham a ser pagas, tudo com juros de mora, à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento.

Contestaram os RR. ambas as petições, alegando que o falecido não era seu trabalhador e, quanto ao mais, contestaram por impugnação.

Proferido despacho saneador tabelar, foi consignada a matéria assente [MA] e elaborada a base instrutória [BI], que foi objecto de reclamação não atendida.

Realizada audiência de discussão e julgamento, respondeu-se à BI, sem reparo das partes.

Proferida sentença, foi a R, BB, Unipessoal, Ldª condenada a pagar: I - À A, AA: a) - A pensão anual e vitalícia, com início no dia 15/9/2006, no valor de € 1.620,78 até à idade da reforma por velhice sem doença física ou mental e no valor de € 2.161,04 depois disso suceder; b) - A quantia de € 20 a título de despesas de transporte nas deslocações a Tribunal e c) - Juros de mora, à taxa legal, sobre todas essas quantias pecuniárias.

II - Ao Instituto de Segurança Social, LP. a totalidade da quantia vencida e paga à A., a título de subsídio por morte e pensões de sobrevivência (que até Dezembro de 2009 perfaziam a quantia total respectiva de € 2.372,98 e € 6.515,52 - sem prejuízo da soma das demais que, entretanto, venham a ser pagas), até ao limite do valor do respectivo montante acima mencionado, com a inerente desoneração do pagamento de tal quantia até tal limite, por parte da R., à A.

Inconformada com o assim decidido, apelou a R, BB, Unipessoal, Ldª, mas a Relação do Porto julgou a apelação improcedente.

Novamente inconformada trouxe-nos a R a presente revista, tendo concluído desta forma a sua alegação: 1ª O argumento do princípio do dispositivo e do princípio do contraditório, alegados como fundamento principal para a 1ª questão do recurso de apelação, não foi sequer analisado pelo acórdão recorrido, pois antes de verificar como os factos estão provados, é necessário alegá-los nos articulados.

É às partes a quem compete alegar os factos que integram a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções e a decisão só se pode fundamentar nos factos alegados pelas partes.

Os factos das alíneas A), B), D), E) e F), da matéria de facto assente, não foram alegados pela A. na sua petição inicial, não foram alegados pelo interveniente acidental na sua petição e não foram alegados pelos RR. na sua contestação, nem tão pouco os mesmos foram objecto de acordo na tentativa de conciliação.

Ao inserir tais factos na matéria de facto assente, consubstancia uma decisão surpresa, violando o princípio do dispositivo e o princípio do contraditório.

Não é verdade como refere o despacho de fls. 249 que tais alíneas contêm, apenas e tão só, o teor — não impugnado - de documentos constantes dos autos, para além de mencionados na petição inicial e no auto de tentativa de conciliação (nomeadamente, a fls. 24 a 26, 92 a 93, 111 verso e 114), pois o teor dos documentos não correspondem aos factos constantes daquelas alíneas, sendo que em algumas dessas alíneas se refere que se dá por reproduzido o teor (se correspondessem ao teor não era necessário dá-lo por reproduzido).

Mas mesmo que se considere que aquelas alíneas correspondem ao teor dos documentos, tal não se poderia levar à matéria de facto assente, pois os documentos são meios de prova e não por si só, factos.

Não se pode confundir os meios de prova, com os factos que eles provam, como a decisão de fls. 249 e a decisão recorrida parecem confundir.

O disposto na alínea d) do n° 1 do art° 131° do CPT, só se aplica à matéria de facto controvertida e não à matéria de facto assente, pois para essa é a alínea c) e referida pela recorrente na sua reclamação.

Ao levar-se aqueles documentos aos factos assentes, teria também que se levar os outros documentos que não foram impugnados, nomeadamente o documento n° 1 da contestação do Instituto da Segurança Social, o que não aconteceu, e que se constasse dos factos assentes teria o condão de julgar logo a acção improcedente no despacho saneador.

No caso de se considerar que os factos em causa são necessários para decisão do mérito da causa, como considera a decisão recorrida, uma vez que os mesmos não foram alegados na petição inicial, o Tribunal só poderia despachar num de dois modos, ou considerava inepta a petição inicial, ou lançava mão do despacho de aperfeiçoamento, que neste caso e sendo dado cumprimento ao mesmo, a recorrente seria notificada para exercer o direito de contraditório face à petição aperfeiçoada, mas nunca poderia ser o Tribunal a substituir-se às partes, alegando ele próprio factos, e muito menos, não permitindo à outra parte, neste caso a recorrente, exercer o direito do contraditório.

Face ao exposto o despacho de fls. 249 e a decisão recorrida, por erro de interpretação e de aplicação viola o disposto nos artigos 30º, 264°, 515°, 546° e seguintes e 646°, n°s 4 e 5, do CPC e nas alíneas c) e d) do n° 1 [do artigo131º] do CPT.

Pelo que, deverá o despacho de fls. 249 ser revogado e substituído por outro que elimine as alíneas A), B), D), E) e F) da matéria de facto assente.

  1. - A 2ª questão do recurso de apelação é uma questão de direito, pois o que aqui importa saber é se o Tribunal de 1ª instância violou ou não o princípio do dispositivo e o princípio do contraditório, não relevando se as respostas dadas estão ou não em conformidade com a prova produzida.

    Contrariamente ao que consta da decisão recorrida, a decisão sobre a matéria de facto constante da BI, pode ser posta em causa com base no excesso e desconformidade, pois se as partes podem reclamar dos factos incluídos na Base Instrutória, por excesso, por maioria de razão também podem reclamar das respostas dadas por excesso, pois se na elaboração da base instrutória não se pode incluir factos que não sejam alegados pelas partes, ao responder à Base Instrutória, também não se pode incluir factos que não foram alegados pelas partes e aos quais não se tenha dado oportunidade a todas as partes para se pronunciar sobre os mesmos.

    Quanto ao momento para pôr em causa essas respostas excessivas, é evidente que pode ser no recurso, pois a decisão sobre a matéria de facto não transita em julgado, ficando só assente com o trânsito em julgado da sentença.

    Aliás, conforme se constata dos autos, a recorrente não esteve representada na leitura da decisão sobre a matéria de facto, nem tal decisão foi notificada à recorrente, pelo que a recorrente não podia reclamar nesse momento.

    Nesta conformidade, agora é necessário verificar se as respostas foram dadas por excesso e se foi violado o princípio do dispositivo e do contraditório.

    Conforme se vê da matéria de facto controvertida e [d]as respostas dadas àquela matéria de facto, e que aqui e por brevidade, face ao seu volume e estarmos perante as conclusões, se dão por reproduzidas para todos os efeitos legais, aquelas respostas à matéria de facto controvertida, com excepção aos quesitos 11°, 22°, 23° e 24°, foram dadas por excesso e respondendo-se numa redacção e em sentido diverso ao questionado, pelo que não há correspondência entre os factos alegados pela A. e o que consta da matéria de facto provada, consubstanciando, assim e mais uma vez, uma decisão surpresa, o que viola o princípio do contraditório e o princípio do dispositivo.

    Face ao exposto a decisão à matéria de facto com excepção da resposta dada aos quesitos 11°, 22°, 23° e 24º, por erro de interpretação e de aplicação viola o disposto nos artigos 30º, 264°, 664° do CPC, pelo que tais respostas terão que se ter por não escritas.

    Assim e na consequência de se considerar tais resposta como não escritas deve a acção ser julgada improcedente quanto à aqui recorrente.

  2. - O argumento utilizado pela decisão recorrida, para julgar improcedente a terceira questão do recurso de apelação, está em contradição com um dos argumentos utilizados para julgar improcedente a primeira questão.

    Ora, na primeira questão do recurso de apelação, para que o documento particular tivesse capacidade de prova plena, não era relevante que o mesmo não fosse dirigido à parte contrária e a posição assumida nos articulados (neste caso na contestação) não é suficiente para se considerar como impugnados e na terceira questão, para que o documento particular tenha capacidade de prova plena, era necessário que documento fosse dirigido à parte contrária e a posição...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT