Acórdão nº 95/09.1PCLRS-A.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 17 de Maio de 2011

Magistrado ResponsávelAGOSTINHO TORRES
Data da Resolução17 de Maio de 2011
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


1.1.

O assistente J... suscitou nos presentes autos nº 95/09.1PCLRS incidente de recusa da Srª Juíza, na sequência da prolação do despacho proferido nos autos de fls 238 a 241, onde lhe foram indeferidas diligências que requerera em sede de instrução e de igual modo, após reclamação do mesmo, mantido parte desse indeferimento.

Na sequência de tal posição processual o arguente afirma que, além de outras decisões subscritas pela Srª magistrada recusante, mas que não identifica em concreto no artº 4º do requerimento, delas referindo serem no mínimo controversas e, algumas, com fraca derroga da justiça e direitos humanos, também na instrução 2119/07.8TALRS em que é assistente e arguido haviam sido verificados dois factos graves que determinaram participação disciplinar ao CSM.

Considerando esse desenvolvimento, entende estar verificado também nos presentes autos séria dúvida de grave ausência de objectividade, de isenção e de imparcialidade da Srª Juíza.

1.2- Instruído o incidente em separado, a Srª Juíza tomou posição a fls 90 e ss, concluindo inexistirem, em sua opinião, razões que sustentem a verificação do pressuposto legal de motivo sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a imparcialidade da visada e salientou até que, por um lado, decidiu o indeferimento das diligências sem sequer ter conhecimento da existência de qualquer participação disciplinar contra si dirigida pelo recusante e, por outro lado, que até acabou por deferir parte da reclamação do despacho em causa. Por último, remeteu-se para as razões do Acórdão da Relação de Lisboa que num outro processo de instrução com o NUIPC 2380/07.8TALRS, por decisão de 19.10.2010, considerou manifestamente infundado o requerimento de recusa que também ali havia sido deduzido.

1.3- Não se vislumbrando quaisquer diligências de prova úteis e profícuas com vista a melhor esclarecimento do caso, cumpre decidir com os elementos já certificados nos autos.

Desde logo, o requerimento é manifestamente infundado.

Vejamos porquê.

1.3.1-Porém, previamente se dirá, desde logo, que a matéria agora a apreciar se circunscreve ao âmbito do procº 95/09, já que a alusão ao que se teria passado nos autos de instrução 2119/07.8TALRS e que terá originado participação disciplinar será de conhecer exclusivamente no âmbito desse mesmo processo, conforme a disciplina incidental regulada nos termos do artº 43º e ss do CPP.

Assim, o que está em causa é o problema criado a partir exclusivamente do despacho proferido de fls 238 a 241 com o qual o recusante discorda na parte em que a Srª Juíza lhe indeferiu apenas parcialmente a reclamação de despacho anterior, relativo a diligências de prova requeridas em sede de instrução.

As ditas diligências reportaram-se, por um lado, à inquirição do condutor do veículo e a informação a solicitar a seguradoras, bem como do cadastro do condutor visando saber se era ou não o assistente o condutor e se ocorrera algum acidente de viação por forma a ser aferida a legalidade da sua detenção e custódia pelos agentes policiais e, por outro lado, uma segunda diligência de prova atinente a pedidos de esclarecimentos técnicos pelo perito médico-legal face a versões opostas sobre a autoria das lesões apresentadas pelo assistente, tendo em vista a compreensão das especificidades técnicas dessas lesões e a determinação provável do seu autor.

No sobredito despacho considerou-se que, nesta parte, a reclamação era improcedente (sendo-o porém noutra parte relativa a audição de testemunhas oculares das agressões e à tomada de declarações ao assistente) E, como fundamento da improcedência considerou a Srª Juíza recusanda apontar as razões que a tal levaram, invocando haver já nos autos elementos suficientes para decisão a proferir sobre a prática de outros ilícitos criminais e, por isso, a primeira da sobredita diligência mostrar-se inócua e carecida de pertinência e, a segunda delas, quanto à audição do perito médico, não requerer a natureza das lesões especiais conhecimentos técnicos, sendo suficiente a mera análise conceptual da natureza das lesões descritas para se poder concluir ou não pela compatibilidade entre elas e os instrumentos de agressão que no caso se prefiguram ou com determinado comportamento agressivo/defensivo bem como o recurso a regras de experiência comum e da experiência concreta da análise de outras situações de agressão.

Considerou ainda que, face à data das lesões e ao facto de haverem sido examinadas em 2009 sem medição ou fotografia das mesmas, qualquer apreciação do perito, v.g. no sentido de serem originadas por elemento masculino ou feminino cairia sempre em juízos hipotéticos insusceptíveis de comprovabilidade efectiva ou de concreto substracto, daí decorrendo que a contribuição do perito nos termos requeridos não se revelava indispensável à avaliação indiciária a efectuar no âmbito da instrução.

Salientou-se ainda nesse despacho que era indeferida também a reconstituição do facto, requerida que havia sido por se ter em vista saber se as lesões que apresentava eram compatíveis com uma actuação instintiva de protecção do ofendido ao ser projectado contra uma parede e o rebordo de uma cadeira, porquanto as lesões não estavam documentadas fotograficamente ou descritas pormenorizadamente (no desenho e dimensão), a visualização dos locais contra os quais se afirma ter havido projecção de pouco serviria em termos de prova e antevendo-se que o recurso às meras regras da experiência, conjugadas com a natureza e localização das sobreditas lesões descritas no auto de exame médico permitiriam formular um juízo indiciário exigível na fase processual em vigente. Havendo ainda diferentes versões a reconstituição afigurar-se ia sem efectiva relevância.

1.3.2- Posto isto, o recusante considerou que a Srª Juíza estava a denegar o deferimento daquelas diligências por falta de objectividade, isenção e imparcialidade.

Esqueceu-se porém de dizer que factos concretos é que, para além da sua pessoal discordância do ponto de vista explanado pela SrªJuíza, fundamentavam aquela falha daqueles três itens de actuação exigidos a um juiz.

Porque é que o recusante desconfia da Srª Juíza? Que motivo sério e grave é esse? Não o diz nem o aponta, sendo o requerimento de recusa de tal leviandade argumentativa que, ao lançar o anátema à Srª magistrada, sem qualquer fundamento tangível e explicado, acobertado em afirmações genéricas e elas mesmo redundantes, merece desde logo e a parir daqui uma veemente censura.

1.3.3- O incidente de recusa é urgente, como resulta, desde logo, da disciplina processual respectiva, designadamente dos art.ºs 43.º a 47.º do CPP e dos prazos aí fixados. Compreende-se, pois, que, na disciplina traçada no CPP, perante o requerimento de recusa, ouvido por escrito, por 5 dias, o juiz “recusado” e produzidas as provas entendidas necessárias pelo Tribunal da decisão, seja esta logo proferida.

[1] Note-se que, diversamente do que sucede no processo civil – que só conhece a suspeição, como incidente referente à imparcialidade –, o processo penal conhece, nesse domínio, o impedimento, a recusa e a escusa, expedientes que disciplina nos art.ºs 39.º a 47.º inclusive.

E essa disciplina, que inclui a recusa de que se tratou é, no quadro do processo penal, completa, não encerrando qualquer lacuna cuja supressão exija o recurso às regras do ordenamento processual civil, no quadro do art. 4.º do CPP, caso em que seria ainda necessária a demonstração de que essas normas se harmonizam com o processo penal, que como é sabido, não é um processo de partes.

[2] Decorre daqui que não é em absoluto necessário recorrer ao CPC para compreender por preenchimento lacunar a correcta tramitação do incidente de recusa, aliás ali previsto com algumas nuances diferentes do regime processual penal ( a mero título de exemplo, será o caso da decisão a cometer ao Presidente da Relação, enquanto no processo criminal compete ao Tribunal imediatamente superior-, sendo-o o da Relação- secção criminal, em regra e à Secção Criminal do STJ , se o juiz recusando a este último pertencer) A questão a decidir então será a de saber se os motivos invocados pelo requerente são de molde a fazer gerar desconfiança sobre a imparcialidade da Srª Juiza recusanda.

A intervenção de um juiz no processo pode ser...

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