Acórdão nº 068/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 08 de Junho de 2011

Magistrado ResponsávelCASIMIRO GONÇALVES
Data da Resolução08 de Junho de 2011
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1. A Fazenda Pública recorre da sentença que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, julgou procedente a impugnação judicial que A…, SA., com os demais sinais dos autos, deduzira contra a liquidação adicional de IRC referente ao ano de 1995, bem como dos respectivos juros compensatórios.

1.2. A recorrente termina as alegações formulando as conclusões seguintes: I - O Despacho do Director de Finanças de 23 de Abril de 1999 (fls. 87 dos autos), de concordância com o parecer do Chefe de Divisão da Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Lisboa e com o relatório da acção inspectiva, está devidamente fundamentado e indica expressamente a norma ao abrigo da qual é efectuada a correcção à matéria tributável - artigo 16° nº 1 in fine do CIRC.

II - A correcção à matéria tributável baseou-se na verificação os pressupostos legais e de facto para as correcções técnicas propostas à contabilidade do sujeito passivo nos termos do artigo 16° nº l "in fine" do Código do IRC, que permite o controle pela administração fiscal à matéria colectável determinada pelo contribuinte.

III - Face ao conteúdo da matéria constante do relatório, o Despacho do Director de Finanças, fundamenta a prática do acto tributário e explicita-o suficientemente, com um voto de concordância, de modo a que o destinatário ou um cidadão médio possa compreender as razões pelas quais o mesmo teve lugar.

IV - O acto tributário contém de modo claro, suficiente e congruente, a razão do sentido decisório que lhe foi dado, permitindo ao destinatário conhecer os seus fundamentos, de modo a que ele perceba a motivação do seu autor, e ao abrigo de que norma legal ele pode actuar.

V - O Despacho do Director de Finanças contém a norma que legitima o poder correctivo à matéria tributável para efeitos de IRC, pela Administração Fiscal, e do relatório constam claramente os actos que indevidamente foram praticados e explicadas as correcções.

VI - Padece de errada interpretação a Douta sentença fundamentada no vício formal de falta de indicação dos preceitos legais que legitimam o poder correctivo.

Termina pedindo o provimento ao recurso e a revogação da decisão recorrida que julgou procedente a impugnação Judicial.

1.3. Contra-alegou a recorrida A…, SA., rematando com as Conclusões seguintes:

  1. Em 1997, as Autoridades Fiscais realizaram um procedimento inspectivo à ora recorrida, relativo ao exercício de 1995, tendo, no seu âmbito, concluído pela correcção à matéria colectável de IRC daquela, no montante de Esc. 419.382.713$00; B) Tais correcções conduziram à liquidação adicional de imposto e juros compensatórios no valor global de Esc. 238.085.745$00; C) Em 18 de Fevereiro de 2000, a ora recorrida apresentou a petição inicial de impugnação judicial contra o acto de liquidação adicional mencionado na alínea anterior; D) No âmbito de tal impugnação, a ora recorrida, suscitou, desde logo, o vício de falta de fundamentação do acto tributário de que foi destinatária, alegando, para tanto, que, para além de uma deficiente fundamentação da matéria de facto, tal acto carecia ainda de qualquer fundamentação de direito, não sendo, de resto, possível descortinar qual ou quais as normas tributárias que a recorrida teria violado em sede de determinação do lucro tributável para efeitos de IRC; E) Para além de tal vício de forma, a ora recorrida alegou ainda que o acto tributário impugnado padecia de vício de violação da lei, mais concretamente, dos artigos 17°, 18°, 19° e 3°, n° 2 do Código do IRC; F) Na sentença recorrida, a Meritíssima Juiz a quo, para além de ter considerado como assentes vários factos, aduzidos pela recorrida e relevantes para a apreciação das questões relativas aos vícios de violação das normas jurídicas enunciadas na alínea anterior, considerou ainda como verificada a inexistência de fundamentação legal do acto tributário de liquidação, e, como tal, como procedente e provado o vício de forma enunciado na alínea D) supra; G) No âmbito do presente recurso, a Fazenda Pública, através da sua Digna Representante, alega, contudo, motivando em tal argumento o presente recurso, que o vício de forma, mencionado na alínea D) supra, inexiste nos presentes autos, tendo em conta que, no Despacho do Director de Finanças de Lisboa, de 23 de Abril de 1999, que precedeu o acto de liquidação impugnado, se invoca uma norma jurídica constante do Código do IRC, a saber, o artigo 16°, n° l de tal diploma; H) O direito à fundamentação dos actos administrativos e tributários que afectem direitos ou interesses legalmente protegidos é, desde 1982, princípio constitucional com assento no artigo 268° da CRP; I) À data da prática do acto de liquidação, objecto dos presentes autos, tal exigência de fundamentação decorria ainda do artigo 124° do Código de Procedimento Administrativo (CPA); J) Já relativamente a actos tributários praticados em 1999, vem a jurisprudência dos tribunais superiores enfatizando reiteradamente que a fundamentação legalmente exigida carece de ser expressa, clara, suficiente e congruente; K) Apenas a fundamentação que permita, através dos seus termos, que se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide, invocando expressamente as normas legais que determinaram o órgão ou agente a actuar como actuou, e possibilitando ao administrado ou contribuinte, um conhecimento concreto da motivação do acto - ou seja, das razões de facto e de direito que lhe subjazem -, é que poderá ser considerada como conforme com os ditames legais; L) Não é, pois, a referência a uma qualquer norma jurídica que permitirá concluir que existe fundamentação de direito suficiente, mas antes as referências às normas jurídicas violadas pelo contribuinte, suficientemente complementadas com a explicitação da razão ou razões da sua aplicabilidade em cada caso; M) Nem no relatório de inspecção, nem nos Despachos que sobre ele recaíram e que precederam o acto de liquidação impugnado, é possível descortinar quais terão sido afinal a(s) norma(s) jurídica(s), ao abrigo da(s) qual(ais) foram efectuadas as correcções, em sede de IRC, determinadas pelas Autoridades Fiscais à ora recorrida, relativamente ao exercício de 1995; N) Nunca poderia, pois, a Meritíssima juiz a quo ter deixado de concluir, na sentença recorrida, que o acto de liquidação, objecto de impugnação, não se encontrava suficientemente fundamentado, considerando, assim, como provado e procedente o vício de falta de fundamentação suscitado pela ora recorrida na sua impugnação judicial, e anulando o acto tributário de liquidação referido na alínea B) supra.

    Termina pedindo a confirmação do julgado.

    1.4. O MP emite Parecer, no qual se pronuncia pela procedência do recurso, nos termos seguintes: «FUNDAMENTAÇÃO 1. O princípio constitucional da fundamentação dos actos administrativos (art. 268° n° 3 CRP) foi densificado nos arts.124º e 125° CPA e no art. 77° nºs. 1 e 2 LGT (acto administrativo tributário).

    Especificamente, a decisão do procedimento tributária exige sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os integrantes do relatório da fiscalização tributária (art. 77° nº 1 LGT).

    A fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo (art.77° nº 2 LGT).

    O dever legal de fundamentação do acto administrativo cumpre uma dupla função: - endógena, ao exigir ao decisor a expressão dos motivos e critérios determinantes da decisão, assim contribuindo para a sua ponderação e transparência - exógena, ao permitir ao destinatário do acto uma opção esclarecida entre a conformação e a impugnação graciosa ou contenciosa.

    Segundo ensinamento pacífico da doutrina e da jurisprudência a fundamentação do acto administrativo há-de ser: - expressa, traduzida na exposição sucinta dos fundamentos de facto e de direito da decisão - clara, permitindo que pela leitura do...

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