Acórdão nº 0211/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Junho de 2011
Magistrado Responsável | VALENTE TORRÃO |
Data da Resolução | 01 de Junho de 2011 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I – A Fazenda Publica, veio recorrer da decisão do Mmº Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pela sociedade A…, Ldª, melhor identificada nos autos, contra as liquidações adicionais do IRC relativas aos anos de 2002 e 2003 apresentando, para o efeito, alegações nas quais conclui: 1ª) — A douta sentença recorrida ofende a regra do ónus de prova estabelecida no n° 3 do artigo 74 da LGT e o preceito do n° 2 do artigo 100º do CPPT, 2ª) — Uma vez que na situação questionada houve recurso aos métodos indirectos com apoio no artigo 88º da LGT.
-
) — E, perante a dúvida sobre a quantificação do facto tributável o juiz a que julgou procedente a impugnação, socorrendo-se do disposto no artigo 100º, nº 1 do CPPT.
-
) — Quando nestas circunstâncias, o recto entendimento do regime formulado no artigo 100º do CPPT, impunha ao tribunal recorrido resolver a situação de dúvida a favor da Fazenda Pública.
-
)— Com efeito, o texto do n° 2 do artigo 100º do CPPT obsta a que a disposição inserta no seu nº 1 releve nos casos de determinação indirecta da matéria tributável; introduz uma excepção à regra geral de que a incerteza tem como consequência a anulação do acto impugnado.
6º) — Em correlação com o estabelecido no nº 3 do artigo 74º da LGT.
Pelo exposto, mais dos autos e max. ex. supl., deve julgar-se a impugnação improcedente.
II – Em contra alegações, a entidade recorrida veio a concluir da seguinte forma: A) Na sua petição de impugnação a aqui recorrida, entre outras, tinha como causa de pedir o erro nos pressupostos da avaliação indirecta e a falta de fundamentação e inadequação do critério utilizado para a quantificação da matéria tributável por métodos indiciários, pugnando pelo exagero da mesma; B) O objecto do presente recurso interposto pela Fazenda Pública está limitado à impugnação da douta sentença recorrida na parte em que esta se pronunciou pela anulação dos actos tributários de liquidação de IRC nos termos do nº 1 do artigo 100º do CPPT com fundamento na existência de findada dúvida; C) Ademais, nas suas doutas alegações a Fazenda Pública advoga que a aludida dúvida fundada deveria ser resolvida a favor da Administração Tributária por força da inversão do ónus da prova consagrado no nº 3 do artigo 74° da LGT: D) Que o nº 1 do artigo 100° do CPPT não é aplicável ao caso concreto por força do disposto no n°2 do mesmo artigo que exclui a sua aplicação; E) Ora, a douta sentença recorrida deu por assente um conjunto de factos no seu julgamento da matéria de facto sobre os quais desenvolveu o seu julgamento de direito, considerando que de tais factos decorre uma fundada dúvida quanto à quantificação dos actos tributários (de liquidação), merecedora de anulação dos mesmos nos termos do artigo 100° do CPPT; F) Sendo certo que a questão do ónus da prova contida no artigo 74° da LGT é anterior à do julgamento de direito e apenas releva para disciplina tal matéria quanto à respectiva incumbência do ónus da prova quanto a cada uma das matérias aí versadas; G) Não sendo aquele artigo 74° da articulável com o disposto no artigo 100º do CPPT que se limita a consagrar a consequência jurídica relativa à existência de fundada dúvida quanto à quantificação do acto tributário em que se pronuncia pela sua anulação; H) Ou seja, a aplicação do artigo 74° da LGT situa-se no âmbito do julgamento de facto e o artigo 100° do CPPT aplica-se no âmbito do julgamento de direito; I) Já que este último normativo deve ser interpretado no sentido de que para a anulação do acto tributário é suficiente que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a quantificação da matéria tributável (sem que se tenha que fazer a prova directa e cabal da inadmissibilidade do critério utilizado ou do exagero dessa mesma quantificação).
-
Acresce que, ao contrário do alegado pela Fazenda Pública, o disposto no nº 2 deste artigo 100° apenas afasta a existência de dúvida fundada quando em sede de aplicação da avaliação indirecta, esta tiver por fundamento “a inexistência ou desconhecimento, por recusa de exibição, da contabilidade ou escrita e demais documentos legalmente exigidos ou a sua falsificação, ocultação ou destruição”; L) O que não é manifestamente o caso dos autos em apreço onde o recurso a métodos indirectos não teve qualquer dos indicados fundamentos.
-
Ou seja. O nº 2 do artigo 100° não se aplica ao caso concreto sub judice; N) Pelo que, em suma, deverá improceder o douto recurso interposto pela Fazenda Pública e manter-se a douta decisão recorrida.
Nestes termos e nos demais de direito que V. Excelências mui doutamente suprirão, deverá a douta decisão recorrida ser mantida, negando-se provimento ao recurso, com todas as consequências legais daí decorrentes, como é de inteira JUSTIÇA III. O MP não emitiu parecer.
-
Colhidos os vistos legais, cabe decidir.
-
Com interesse para a decisão foram dados como provados em 1ª instância os seguintes factos: A)- A impugnante encontra-se colectada pelo exercício da actividade de “Construção Edifícios” CAE “045211” desde 1986.01.01, estando enquadrada do regime de isenção de IVA conforme art.º 9 CIVA e os rendimentos da actividade exercida estão sujeitos, em sede de IRC, a tributação nos termos dos artigos 1º e 3º do CIRC., cfr. fls. 38 do processo administrativo apenso.
B)- A coberto da Ordem de serviço nº 01200501842/01200501843, com início em 2006.06.20, e o fim em 2006.10.02, a Administração Fiscal procedeu a inspecção à actividade da Impugnante, cfr. fls. 35 do processo administrativo apenso.
C)- O motivo da inspecção foi o PNAIT 222.22 - Empresa do sector da construção civil — Despacho do Sr. Director de Finanças de 2005.09.26, cfr. fls. 38 do apenso.
D)- A inspecção abrangeu os exercícios de 2002 e 2003 e foi de âmbito geral, cfr. fls. 38 do apenso.
E)- Em 25/10/2006, os serviços de inspecção elaboraram o relatório de fls. 35 e segs., do processo administrativo apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzido e donde resulta com interesse para a decisão: RELATÓRIO DE INSPECÇÃO TRIBUTÁRIA I. CONCLUSÕES DA ACÇÃO DE INSPECÇÃO Face aos motivos descritos no presente relatório estamos perante a impossibilidade de determinação directa e exacta da matéria tributável, indo-se assim proceder para os exercícios de 2002 e 2003, à realização da avaliação indirecta nos termos da alínea b) art.º 87º e alínea d) art.º 88 e de acordo com o art.º 90, todos da Lei Geral Tributária (LGT).
São desta forma fixados os lucros tributáveis presumidos nos montantes de € 930.700,87 e € 4.451,00 para 2002 e 2003 respectivamente, tendo implícitas correcções com recurso a avaliação indirecta nos montantes de € 545.753,64 e de € 23.896,74 respectivamente.
II OBJECTIVOS, ÂMBITO E EXTENSÃO DA ACÇÃO INSPECTIVA.
-
3 - CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES FISCAIS O sujeito passivo tem a sede na Av. … FARO, e vem exercendo a actividade na área deste concelho.
Pelo sistema de consultas de IRC e de IVA bem como da Declaração Anual verifica-se que não existem faltas declarativas.
(...) IV. MOTIVOS E EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUE IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS 1. Na acção preparatória da acção de inspecção e através do “Sistema informático do Património” foi possível identificar as fracções transaccionadas pelo s.p. nos exercícios em questão: 2002 (*) Venda efectuada ao sócio gerente 2. Em 2005-11-02, foram remetidas notificações para os adquirentes das diversas fracções alienadas pela empresa no ano de 2002 e 2003, nas quais foram solicitados: - Fotocópia do contrato promessa de compra e...
-
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO