Acórdão nº 01198/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Maio de 2011

Magistrado ResponsávelRUI BOTELHO
Data da Resolução19 de Maio de 2011
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I Relatório A…, com melhor identificação nos autos, veio recorrer do acórdão da Secção que julgou improcedente a acção administrativa especial que propôs contra o CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO visando a anulação da sua deliberação, de 11.9.2009, que lhe impôs a sanção disciplinar de transferência, na sequência de processo disciplinar que lhe fora instaurado.

Para tanto alegou vindo a concluir, assim, a sua alegação: I. O douto acórdão violou, por incorrecta aplicação, o disposto no artigo 33.°, n.°s 2 e 4 do Decreto Lei n.° 100/99, de 31 de Março; II. Pois que ali se não contém qualquer dever de permanência em domicílio; III. Já que, como decorre do n.° 4, o legislador consente que o funcionário esteja no seu domicílio ou noutro local; IV. E permite que, não sendo encontrado no local que indique, justifique a sua ausência; V. O preceito em causa é instrumental relativamente ao dever de assiduidade; VI. E, no caso concreto as faltas dadas pela Recorrente entre 11 e 17 de Fevereiro de 2007, foram julgadas justificadas por doença; VII. De onde, o desiderato das normas logrou ser atingido; VIII. O artigo 182.° do EMP contém uma infracção de resultado e não de actividade; IX. O que decorre do facto de, na redacção da norma, o legislador se referir ao magistrado concretamente em causa e ao desprestígio concretamente causado em determinado meio, e não “à magistratura” ou “aos magistrados”, como sucederia se se quisesse referir a uma mera actividade; X. Pelo que o acórdão recorrido violou o artigo 182.° do EMP; XI. Acresce ainda que, relativamente aos mesmos factos, considerou o Réu, num primeiro momento, configurarem mera negligência, propondo-se puni-los com pena de multa e, depois, e após impugnação administrativa julgada procedente, passou a entendê-los como implicando perda de prestígio, aplicando, por consequência, a pena de transferência; XII. As operações de determinação da culpa e graduação concreta da pena são operações que postulam a interpretação e aplicação da lei e, como tal, não escapam ao controlo judicial, conforme resulta das disposições conjugadas dos artigos 202.°, n° 2, 20.°, n.° 4 da CRP e 6.° da CEDH; XIII. Pelo que, entendimento diverso, isto é, a interpretação do artigo 30, n.° 1, do CPTA em termos de excluir a sindicância judicial de tais matérias afronta os preceitos acima indicados; XIV. Finalmente, quer por se tratar de operações de mera interpretação e aplicação da lei, domínio específico dos tribunais, quer por, no caso concreto, se tratar da aplicação de pena disciplinar a magistrado, e, portanto, nos situarmos em ambiente relativamente ao qual os julgadores têm natural e especial sensibilidade, não poderia o Tribunal deixar de aferir da proporcionalidade da sanção; XV. E, considerando a situação que nunca poderia ser vista como mais do que negligente, bem como a longa carreira da Recorrente, com ausência de antecedentes disciplinares e boas classificações de serviço, julgar violados os artigos 266.°, n.° 1, da CRP e 5.° do CPA, preceitos que, desaplicou, violando-os; Termos em que, deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se o douto acórdão recorrido.

O CSMP contra-alegou, concluindo como segue: 1ª O Acórdão recorrido fez a acertada interpretação e aplicação da norma dos nºs 2 e 4, do artigo 33°, do D. L. n° 100/99, de 31 de Março.

  1. A matéria vertida na alínea B) da ALEGAÇÃO do presente recurso jurisdicional e nas CONCLUSÕES VIII e IX consubstancia um juízo sobre, designadamente, a quebra de prestígio, reportada ao relacionamento da Recorrente com a comunidade e com os Colegas.

  2. A decisão desta questão, nos moldes em que vem colocada, demanda uma (re)apreciação da MATÉRIA DE FACTO, vedada, por lei, ao Tribunal “ad quem”. Na verdade, 4ª O Pleno da Secção do Supremo Tribunal Administrativo só conhece de matéria de direito, nos termos do artigo 12º, n° 3, do ETAF.

  3. A proporcionalidade e a adequação da pena disciplinar imposta à Recorrente pelo acto punitivo FOI EXPRESSAMENTE SINDICADA pela decisão recorrida, dentro dos limites legal e constitucionalmente impostos. POR ISSO, ENTENDE O CSMP QUE DEVE SER JULGADO IMPROCEDENTE O PRESENTE RECURSO.” Sem vistos, mas com distribuição prévia do projecto de acórdão, cumpre decidir.

II Factos O acórdão recorrido deu por assente a seguinte factualidade: a) A Autora é Procuradora-Adjunta, a exercer funções nos serviços do Ministério Público da comarca de … desde 15.09.2005; b) Por despacho do Presidente do CSMP, de 19.03.2007, foi instaurado processo disciplinar contra a Autora (fls. 4 do PA); c) A instrução do processo foi iniciada a 10.04.2007 (fls. 121 a 123 do PA); d) A 11.02.2008 foi elaborado pelo Sr. Inspector “Relatório Final”, no qual propôs a aplicação à arguida da “pena única de dez dias de multa por infracção dos seus deveres profissionais de permanência no domicílio, zelo e de residência na sede do tribunal onde estava colocada..., suspensa na sua execução por um ano...” (fls. 231 e segs. do PA); e) Por acórdão de 06.06.2008, da Secção Disciplinar do CSMP, foi aplicada à Autora a “pena única de transferência para comarca fora do Círculo Judicial de …”, com perda, “ope legis”, de 60 dias de antiguidade (fls. 267 e segs. do PA); f) Por acórdão do Plenário do CSMP, de 07.10.2008, foi anulada aquela decisão da Secção Disciplinar, por considerar verificada a nulidade insuprível prevista no art. 204°, n° 1 do EMP - alteração, no acórdão reclamado, de matéria de facto e de direito sem precedência da possibilidade de defesa - (fls. 328 e segs. do PA); g) Após nova acusação e instrução, foi elaborado pelo Sr. Inspector, a 11.05.2009, novo “Relatório Final”, no qual considerou provados todos os factos incluídos na acusação, e, por violação do dever de permanência no domicílio (art. 33º, n°s 2 a 4 do DL n° 100/99, de 31 de Março), do dever profissional de zelo (art. 3°, n°s 4/b e 6 do DL n° 24/84, de 16 de Janeiro - vigente à data dos factos - e agora previsto no art. 3º, n° 2/e) e 7 do ED aprovado pela Lei nº 58/2008, de 9 de Setembro), e do dever de residência na sede do tribunal (art. 85° da Lei n°47/86, de 15 de Outubro), propôs a aplicação à arguida da “pena única de transferência para comarca fora do Círculo Judicial de … com a perda de 60 dias de antiguidade nos termos do art° 174° do EMP” (fls. 36 e segs. dos autos, 418 e segs. do PA, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido); h) Os factos considerados provados naquele...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT