Acórdão nº 0257/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Abril de 2011
Magistrado Responsável | PIMENTA DO VALE |
Data da Resolução | 13 de Abril de 2011 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1 – A… e Mulher vêm recorrer, nos termos do artº 150º nºs 1 e 2 do CPTA, por via do artº 2º, al. c) do CPPT, do artº 722º, nº 1, al. b) e c) e do artº 666º, nº 2, ambos do CPC, por via do artº 2º, al. e) do CPPT, atento o disposto nos artºs 712º, nºs 1, al. a) e 4 e 3º, nº 3, ambos do CPC, do acórdão do TCAS que concedeu provimento ao recurso interposto pela Representante da Fazenda Pública e, em consequência, revogou a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou improcedente a reclamação que interpusera da decisão do órgão da Execução Fiscal que lhe indeferiu o pedido de anulação de compensação efectuada com créditos de que era titular e penhora de salários, assim como ressarcida dos encargos com (…) garantia bancária prestada […], formulando as seguintes conclusões: I- Da inconstitucionalidade da falta de notificação prévia da matéria de facto oficiosamente alterada com fundamento em contradição e obscuridade.
1- Refere-se no 1° item de fls. 9 do acórdão de que ora se recorre que a “primeira alínea do probatório... se apresenta como contraditória”, e no 2° item, igualmente a fls. 9 do acórdão, que “importa, também, rectificar o segmento inicial da segunda alínea do probatório, no sentido de tomar claro... bem como o segmento final da al. C., quanto à referência á anulação das liquidações...”. Quer dizer, 2- Esse Alto Tribunal, considerando existir contradição e obscuridade na matéria de facto fixada no Tribunal de 1ª instância, decidiu rectificá-la oficiosamente, “ao abrigo do estatuído no art° 712°/1, do CPC (cfr. 1° item de fls. 10 do acórdão). Como se constata, 3- A rectificação da matéria factual operada por esse Alto Tribunal consistiu: a. — Na alteração da “redacção das alíneas A), B), e C) do probatório” (cf. alínea a) do l’ item de fls. 10 do acórdão); e b. — No aditamento das alíneas F), O), H), e 1) - (cfr. alínea b) do 1° item de fls. 10, e fls. 11 do acórdão). Sucede que, 4- A alteração oficiosa da matéria de facto, consubstanciada na rectificação das alíneas A) a C), e no aditamento das alíneas F) a 1), deveria ter sido previamente notificada às partes, designadamente aos ora recorrentes, atento o seu direito de tutela jurisdicional efectiva através de um processo equitativo (cfr. art° 712°/ 1-a), e 4 do CPC; e art° 20°/4 da Constituição), o que não ocorreu. E, não tendo os recorrentes sido notificados previamente das alterações oficiosas à matéria de facto decidida por esse Alto Tribunal, 5- Incorreu esse Alto Tribunal numa omissão processual, por não ter observado o direito ao contraditório que assiste aos recorrentes (cfr. art° 3°/3 do CPC, por via do art° 2°-e) do CPPT), omissão que se requer seja ora suprida (cfr. art° 666°/2 do CPC, por via do art° 2°-e) do CPPT).
Diga-se ainda que, a propósito de tal omissão processual, 6- O Tribunal Constitucional decidiu já em circunstâncias semelhantes, que a omissão de notificação prévia aos interessados das alterações oficiosas à matéria de facto, efectuadas pelo Tribunal de 2ª Instância com fundamento em contradição ou obscuridade da decisão do Tribunal de 1ª Instância — como ocorreu nos autos em apreciação - atento o disposto no art° 3°/3 e no art° 712°/ 1-a) e 4, ambos do CPC, configura uma inconstitucionalidade, “por violação do direito a um processo equitativo consagrado no n.° 4 do artigo 20.º da Constituição” (cfr. decisão, no acórdão n° 346/2009 do Tribunal Constitucional, respeitante ao processo n° 540/07, disponível no portal do MJ, através do endereço www.dgsi.pt). Acrescenta-se ainda no mesmo aresto que, 7- “o artigo 20º da Constituição não se limita a garantir o direito de acesso aos tribunais. Impõe que esse direito se efective — na conformação normativa e na concreta condução — através de um processo equitativo (n.° 4 do artigo 20º da CRP). Levada expressamente ao texto constitucional pela revisão operada pela Lei Constitucional n.° 1/97 a exigência do processo equitativo, conceito em cuja densificação tem papel de relevo a jurisprudência dos órgãos da Convenção Europeia dos Direitos do Homem sobre o conceito homólogo consagrado no artigo 6.º da CEDH já anteriormente se deduzia de outros lugares da Constituição e era reconhecido pela jurisprudência do Tribunal (cfr. p. ex. acórdão n.° 1193/96)”. E continua o mesmo acórdão, 8- “a jurisprudência e a doutrina têm desenvolvido o conceito através de outros princípios que o densificam: (1) direito à igualdade de armas ou igualdade de posição no processo, sendo proibidas todas as diferenças de tratamento arbitrárias; (2) proibição da indefesa e direito ao contraditório, traduzido fundamentalmente na possibilidade de cada uma das partes invocar as razões de facto e direito, oferecer provas, controlar a admissibilidade e a produção das provas da outra parte e pronunciar-se sobre o valor e resultado de umas e outras; (3) direito a prazos razoáveis de acção e de recurso, sendo proibidos os prazos de caducidade demasiados exíguos; (4) direito à fundamentação das decisões; (5) direito à decisão em prazo razoável; (6) direito de conhecimento dos dados do processo (dossier); (7) direito à prova; (8) direito a um processo orientado para a justiça material (Cfr. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, 4. ed.., pá. 415). No caso, não está em consideração a violação do contraditório na sua formulação clássica (audiatur et altera pars), enquanto exige que se dê a cada uma das partes a possibilidade de “deduzir as suas razões (de facto e de direito)”, de “oferecer as suas provas”, de “controlar as provas do adversário” e de “discretear sobre o valor e resultados de umas e outras”. Continuando, refere-se ainda no acórdão que se vem transcrevendo, 9- “A questão que agora se aprecia respeita à proibição das chamadas decisões-surpresa, ou seja, à imposição ao tribunal do dever de ouvir as partes antes de tomar decisões com fundamento de conhecimento oficioso que não tenha sido por elas previamente considerado. O que está em causa não é a garantia de defesa, no sentido negativo...
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