Acórdão nº 2675/08.3PCCBR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 30 de Março de 2011
Magistrado Responsável | PAULO VAL |
Data da Resolução | 30 de Março de 2011 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Em conferência na 5.ª secção criminal do Tribunal da Relação de Coimbra 1- No 4.º juizo criminal do Tribunal Criminal de Coimbra, no processo acima referido, foi, por despacho judicial de 7-9-2010 ( fls 3 e sgs deste recurso ), indeferida a admissão da ofendida CM… como assistente pelo facto de a mesma, apesar de ser advogada, não ter constituido mandatário judicial 2- Inconformada, recorreu esta, tendo concluído a sua motivação pela forma seguinte : A decisão ora recorrida viola o artigo 20° n° 1 da. Constituição da República .Portuguesa, porque viola uma das vertentes de acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva, e o artigo 202.° n° 2 na medida em que ao ser proferida antes da resposta da ofendida e interessada, está a negar urn direito fundamental da ofendida, aqui recorrente, está a negar a esta de forma frontal a defesa dos seus direitos e legitimos interesses, violação de normas constitucionais aqui colocada em termos habeis para os devidos efeitos.
A decisão recorrida carece de fundamentação expressa e legalmente válida ao invocar uma restrição de urn direito constitucional quando não fundamenta essa restrição nem diz qual é a norma constitticional que permite essa restrição, nem existe tal norna constitucional restritiva - o que constitui causa de nulidade da decisão recorrida quanto ao respectivo conteúdo.
Quanto à questão de fundo ao respectivo teor a decisão ora recorrida ao negar a ofendida urn direito de que ela goza face ao disposto nos artigos 61.° 64.° e 67.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, viola estas normas A decisão faz uma incorrecta interpretação do instituto da representação ao dizer que para-a existir representação tem de ser duas pessoas, quarido existe na nossa Ordem Juridica tantas casos de representação corn uma única pessoa que se representa a si mesma numa outra função, tais corno no negócio consigo mesmo, o progenitor que é representante legal do menor, etc, A decisão também faz urna incorrecta interpretação e valoração da função do advogado do assistente ao dizer que ele deve ser imparcial, quando sabemos que o advogado é sempre parcial, cabendo a imparcialidade apenas ao juiz.
A decisão também denota uma preocupação incaracteristica corn o eventual público da assistência aos julgamentos, quando o juiz deve preocupar-se únicamente em obedecer a lei, apenas a esta devendo obediência, e não a outros factores alheios à sua função de julgar. Alias, o juiz se o entender, até pode proibir a assistência ao julgamento se a mesma se revelar perturbadora da ordern e dos trabalhos, muito. menos urn juiz estará sujeito às opiniões do público da sala de audiências. A este factor é que o juiz deve atender e não ao facto de uma lei desagradar ao público, A lei que permite que a ofendida se represente a si mesma como advogada é lei especial que não sofreu qulquer restrição, e deve prevalecer sobre a lei geral- principio básico do direito Deve a decisão recorrida ser revogada e substituida por outra que admita a ofendida a intervir nos termos expostos 3- Nesta Relação, o Exmo PGA conclui pela procedência do recurso 4- Foram colhidos os vistos legais e teve lugar a conferência 5- A única questão suscitada nestes autos traduz-se em saber se , sendo a ofendida advogada, carece, para se apresentar como assistente nos autos, de constituir mandatário judicial ou se, dada tal qualidade de advogada, pode defender causa própria sem necessidade de qualquer mediação.
O despacho recorrido tem, em resumo e com interesse, o seguinte teor : « (...) Do disposto no artigo 61.°, n.° 3 do Estatuto da Ordem dos Advogados (Lei n.° 15/2005, de 26 de Janeirol) resulta que os advogados podem advogar em qualquer jurisdição, decorrendo implicito que o possam fazer em causa própria. Porém, uma tal faculdade estatutária nao constitui urn direito absoluto que se projecte ilimitadamente sobre todo o ordenamento juridico. Vai até onde pode ir e cede onde flyer que ceder. Como direito subjectivo que é está sujeito a regra da colisao de direitos (artigo 335.º C.Civil) e a restrição constitucional de direitos (artigo 18.°, n°s 2 e 3 da CRP).
Como preceitua o n.° 1 do artigo 70.° do C.P.Penal, os assistentes são sempre representados por advogado. 0 conceito «representado» remete para o instituto da representação regulado nos artigos 258.° a 269.° do Codigo Civil, donde se conclui que para o instituto funcionar torna-se necessário a existência de pelo menos duas pessoas: uma o representado (dominus negotii) e outra o representante (alien° nomine)2. Deste modo, quando uma pessoa se...
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