Acórdão nº 1639/03.8 TBBNV.L1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Março de 2011

Magistrado ResponsávelNUNO CAMEIRA
Data da Resolução02 de Março de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I.

Síntese dos termos essenciais da causa e dos recursos AA, solteira, maior, e seus pais BB e CC, casados entre si, propuseram uma acção ordinária contra DD.

Pediram a condenação da ré no pagamento da quantia total de € 1.452.521,00 e juros legais de mora a contar da citação, sendo € 1.200.000,00 à autora AA e € 252.521,00 aos autores BB e CC, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e morais sofridos por virtude do acidente descrito na petição inicial - queda de árvore implantada num pinhal pertencente à ré em cima duma viatura na qual a autora AA se fazia transportar no banco ao lado do condutor e que teve por consequência, além do mais, ficar esta lesada tetraplégica.

A ré contestou, impugnando quer a culpa na verificação do acidente, quer a extensão dos danos invocados na petição. Alegou, em suma, o excesso de velocidade do veículo em que a autora AA seguia, tendo em conta as condições atmosféricas muito adversas que na altura se faziam sentir e o facto de o piso da estrada estar molhado, existirem lençóis de água e haver fortes rajadas de vento; e alegou ainda, para afastar a sua culpa, que a vigilância que ela, ré, mandava efectuar aos arbustos e árvores existentes no local era a adequada e suficiente, face à inexistência de ocorrências passadas.

Posteriormente ao saneamento da causa os autores apresentaram articulado superveniente e requereram a ampliação do pedido, ambos admitidos, pedindo a condenação da ré a pagar à 1ª autora a quantia de € 1.650.000,00 e aos 2º e 3º autores a de € 752.521,00.

No decurso da audiência de julgamento também a ré apresentou um articulado superveniente (fls 984 e sgs), que foi de igual modo admitido, com o consequente aditamento dos correspondentes quesitos à base instrutória organizada (fls 1068 e 1069).

Concluído o julgamento e estabelecidos os factos foi proferida sentença em 23/1/09 nos seguintes termos, que se reproduzem (parte decisória): “Pelo exposto, julgo a acção parcialmente procedente, porque provada apenas em parte, e, em consequência: 1. Condeno a Ré, DD, a pagar à A. AA:

  1. A quantia de € 280.000,00 (duzentos e oitenta mil euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora vincendos, à taxa legal, a contar da data da presente sentença, até integral pagamento; b) A quantia de € 385.000,00 (trezentos e oitenta e cinco mil euros) a título de danos patrimoniais, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, sendo a contar da citação relativamente aos danos por perda de capacidade de ganho e a contar da presente sentença quanto aos demais danos futuros para aquisição de bens e serviços, e até integral pagamento; 2. Condeno a Ré, DD, a pagar aos AA. BB e CC: a) A quantia de € 131,403,50 (cento e trinta e um mil quatrocentos e três euros e cinquenta cêntimos) a título de danos patrimoniais, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, a contar da citação da Ré no que tange aos danos patrimoniais vencidos a essa data, sendo que relativamente aos danos que apenas se foram vencendo durante a presente acção – danos por lucros cessantes e despesas com medicamentos, transportes a médicos e laboratórios, fraldas e algálias que apenas ocorreram após a citação - , os juros apenas são devidos a partir do mês em que cada um deles se venceu e até integral pagamento; b) O que se liquidar em execução de sentença, relativamente aos danos patrimoniais pela aquisição da cadeira de rodas, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, a contar da citação da Ré e até integral pagamento; 3. Condeno a Ré, DD, a pagar ao A. BB a quantia de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora vincendos; à taxa legal, a contar da data da presente sentença, até integral pagamento; 4. Condeno a Ré, DD, a pagar à A. CC a quantia de € 60.000,00 (sessenta mil euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora vincendos, à taxa legal, a contar da data da presente sentença, até integral pagamento; 5. Absolvo a Ré DD do demais peticionado pelos AA. AA, BB e CC”.

    Tendo ambas as partes apelado, a Relação proferiu em 10/4/10 a seguinte decisão: “Face ao exposto, julga-se improcedente, por não provada, a Apelação apresentada pela Apelante DD.

    Bem como julga-se parcialmente procedente, na medida em que foi provada, a Apelação apresentada pelos AA., determinando-se, em conformidade: - a alteração da resposta única dadas aos quesitos 109.º, 110.º, 111.º, 167.º e 168.º da Base Instrutória, que passa a ter a seguinte redacção: “Provado que a 1.ª Autora precisa de adquirir uma viatura automóvel transformada para transporte de passageiros com deficiência motora superior a 90%, que actualmente já comprou uma que custou € 27.999.20, e posteriormente precisará de outras, para ser transportada em veículo automóvel, conduzido por outra pessoa, cujo custo não será inferior a € 28.000,00”.

    - a alteração da resposta dada ao quesito 175.º da Base Instrutória, que passa a ter a seguinte redacção: “Provado apenas que durante o tempo o tempo em que o 2.º A. viveu em Vila Real, só vinha a Benavente, em média de 3 em 3 semanas, por causa das dificuldades económicas, com o esclarecimento de que o 2.º A. encontra-se actualmente a trabalhar em Benavente, a explorar um estabelecimento de restauração”.

    E, em consonância com o que acima se deixa expresso, para além dos valores já fixados na sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância, aditar e alterar ainda os seguintes valores indemnizatórios: - Condenar a Ré a pagar à 1.ª A., a título de danos patrimoniais a quantia de € 27.999,20 (valor da aquisição da viatura da 1.ª A.), acrescida de juros legais desde a data da notificação do articulado superveniente, no caso, desde 24 de Fevereiro de 2007, e até integral pagamento; - Condenar a Ré a pagar à 1.ª A., a título de danos não patrimoniais, a quantia de € 320.000,00 (trezentos e vinte mil euros), alterando-se, assim, o valor inicialmente fixado pelo Tribunal de 1.ª Instância.

    - Condenar a Ré a pagar à 1.ª A., as quantias de € 200.000,00 (duzentos mil euros) a título de danos patrimoniais pela perda de capacidade de trabalho e de € 300.000,00 (trezentos mil euros) a título de danos futuros, alterando-se, assim, o valor inicialmente fixado pelo Tribunal de 1.ª Instância.

    - Condenar a Ré a pagar as quantias de € 80.000,00 (oitenta mil euros) para o 2.º A. e de € 100.000,00 (cem mil euros) para a 3.ª A., a título de danos não patrimoniais, alterando-se, assim, o valor inicialmente fixado pelo Tribunal de 1.ª Instância.

    - Condenar a Ré a pagar aos 2.ª e 3.ª AA. a quantia que se vier a apurar a título de danos patrimoniais decorrentes do encerramento do mini-mercado explorado pela 3.ª A., tendo por base a quantia de € 1.500,00 mensais (mil e quinhentos euros), contados desde o momento do encerramento daquele estabelecimento até ao momento em que o 2.º A. passou a explorar o estabelecimento de restauração, com juros desde a fixação daquele montante e até integral pagamento.

    Mantém-se, no mais, a condenação fixada por aquele Tribunal de 1.ª Instância”.

    De novo inconformados, quer os autores, quer a ré recorreram para o STJ, pedindo a revogação do acórdão da 2ª instância (parcial, no caso dos autores; no caso da ré, total). Os autores sustentam que a ré deve ser condenada a pagar-lhes, vista a proibição do artº 661º, nº 1, do CPC, as quantias constantes dos pedidos ampliados; a ré, por seu turno, defende a sua absolvição total do pedido, ou, no mínimo, caso se conclua que é responsável, a redução equitativa da indemnização, atentos os seus rendimentos e baixo grau de culpabilidade; isto sem prejuízo do pedido de suspensão da instância até ao trânsito em julgado da sentença proferida na causa prejudicial pendente e da arguição de nulidade da sentença da 1ª instância por omissão de pronúncia.

    Foram apresentadas contra alegações em ambos os recursos, defendendo a sua improcedência.

    Tudo visto, cumpre decidir.

    II.

    Fundamentação

  2. Matéria de Facto São os seguintes os factos definitivamente assentes, após as modificações introduzidas pela Relação: 1.

    No dia 6/12/00 a 1.ª A. viajava na Estrada Nacional (E.N.) 118 no sentido Benavente — Samora Correia; 2.

    Seguia no veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ...-...-NT no lugar da frente, ou seja, no banco situado ao lado do condutor, que era o seu amigo, e então namorado, EE; 3.

    No dia 6/12/00, cerca das 21,30 horas, junto ao quilómetro 38.300 da EN 118, uma árvore caiu em cima do veículo mencionado no ponto 2, no sítio que a 1ª A. nele ocupava; 4.

    A referida árvore encontrava-se implantada no prédio rústico designado “Pinhal do José Justino e Sesmaria do Vale ou Vale das Hortas”, descrito na Conservatória do Registo Predial de Benavente sob o nº 02572/251196 da freguesia de Benavente ; 5.

    Desde pelo menos 1995 que a R. é dona desse prédio, possuindo-o, detendo-o materialmente e retirando dele as respectivas utilidades; 6.

    A árvore que caiu em cima da viatura onde seguia a 1.ª A. era: uma acácia mimosa; com cerca de 15 metros de altura; pesada; com tronco com cerca de 60 centímetros de diâmetro junto à base; tinha pelo menos 40 anos de idade; e encontrava-se implantada a cerca de três metros do limite do lado direito da faixa de rodagem da EN 118, para quem segue no sentido Benavente – Samora Correia; 7.

    A árvore que caiu em cima da viatura onde a 1.ª A. seguia tinha raízes à mostra, do lado oposto à estrada, devido ao peso que exercia sobre a base do tronco porque estava inclinada sobre a faixa de rodagem há mais de 10 anos devido ao seu peso e em virtude de o terreno onde estava implantada ser arenoso, com pouca capacidade de fixação de árvores e sujeito a elevada erosão pelos elementos naturais, designadamente chuva e vento; 8.

    Na noite do dia 6 para 7 de Dezembro de 2000, em grande parte do país, incluindo a região de Benavente, o tempo apresentou-se com céu nublado ou...

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