Acórdão nº PROCESSO N.º 1.252/10.3TALRS.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 17 de Fevereiro de 2011
Magistrado Responsável | ABRUNHOSA DE CARVALHO |
Data da Resolução | 17 de Fevereiro de 2011 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Tribunal da Relação de Lisboa Rua do Arsenal Letra G - 1100-038 Tel: 213222900 - Fax: 213222992 . Email: correio@lisboa.tr.mj.pt Processo n.º 1.252/10.3TALRS.L1***** Nos presentes autos de recurso, acordam, em conferência, os Juízes da 9ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: A “Inspecção…”, em PCO Processo de contra-ordenação.
com o n.º CO/002725/07, pela decisão de fls. 816 a 832, de 17/09/2009, condenou a Arg.
Arguido/a/s.
“G…, Ld.ª”,… pessoa colectiva,…, pela seguinte forma: “Face ao exposto decide-se: a) Condenar a arguida na coima de €30.000,00 (Trinta Mil Euros), pela prática de uma contra-ordenação p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 23º, n.º 1, e 67º, n.º 1, alínea b) do Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro, sancionável com coima de €7.500,00 a €44.890,00; b) Condenar a arguida no pagamento das custas do processo, nos termos do disposto no art.º 58º da Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto, na redacção dada pela Lei 89/2009, de 31 de Agosto, no montante de €100,00 (Cinquenta Euros), correspondente a encargos com comunicações, nomeadamente com as notificações efectuadas.
”.
*Não se conformando com esta condenação, a Arg. impugnou judicialmente esta decisão, para os Juízos Criminais de Loures, nos termos da motivação de fls. 926 a 939.
Após audiência de discussão e julgamento, realizada em 25/05/2010, foi proferida a sentença de fls. 972 a 981, que julgou improcedente a impugnação, decidindo nos seguintes termos: “Pelos fundamentos expostos, julga-se procedente a acusação, por provada, e em consequência mantém-se a decisão administrativa, condenando-se a Recorrente “G…., Lda.”, pela prática de uma contra-ordenação prevista e punida pelos artigos 23º, n.º 1 e 67º, n.º 1, alínea b) do Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro, na coima de € 30.000,00 (trinta mil euros).
Condena-se ainda a Recorrente nas custas, nestas se incluindo duas UC de taxa de justiça.
…”.
*Voltando a não se conformar, a Arg. interpôs recurso para este Tribunal da Relação, nos termos da motivação de fls. 1006 a 1025, concluindo da seguinte forma: “… 1. A sentença recorrida, em sede de enquadramento jurídico dos factos, parte do conceito geral e corrente de descarga e conclui, apoiando-se no conceito jurídico de descarga, que a Recorrente procedeu à deposição de resíduos nas suas instalações sitas em Sacavém.
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E, como no errado entender da sentença recorrida, qualquer deposição temporária de resíduos consubstancia uma operação de armazenamento, considerou que a Recorrente procedeu a uma operação de gestão de resíduos sujeita a licenciamento e decidiu pela manutenção da decisão administrativa que condenou a Recorrente.
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A decisão recorrida incorreu pois numa grave inversão metodológica e numa manifesta confusão conceptual.
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A armazenagem sujeita a licenciamento depende de três pressupostos: que seja uma deposição (i) temporária (ii) controlada e (iii) por prazo determinado antes do seu tratamento, valorização ou eliminação, sendo que no caso sub judice nenhum deles se verifica.
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A sentença recorrida procedeu a uma errada interpretação do disposto no art. 3.º g) e art. 3.º b) do DL 178/2006, de 5 de Setembro e incorreu em erro sobre a norma aplicável ao considerar que a conduta da Recorrente era subsumível ao disposto no art. 23.º n.º 1 e 67.º n.º 1 b) do mesmo diploma legal.
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Apenas se encontrando provado que a Recorrente recebeu resíduos nas suas instalações de Sacavém e que os fez transportar no mesmo dia para outras instalações licenciadas sitas no Barreiro, deveria a sentença recorrida ter procedido à aplicação do art. 23.º n.º 4 do DL 178/2006, de 5 de Setembro, primeira parte “Não estão sujeitas a licenciamento nos termos do presente capítulo as operações de recolha e de transporte de resíduos”, concluindo pela absolvição da Recorrente quanto à contra-ordenação pela qual foi administrativamente condenada.
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A sentença impugnada ao confirmar a decisão administrativa de condenação da ora Recorrente sem que a conduta assumida por esta se encontre tipificada na lei como contra-ordenação, viola o disposto no artigo 1.° do RGCO e no artigo 1.º da LQCOA, preceitos que exigem que para uma conduta humana assumir a característica de infracção contra-ordenacional torna-se indispensável que coincida formalmente com a descrição feita numa norma legal que preveja uma coima.
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A sentença recorrida, ao acolher o entendimento da decisão administrativa quanto à determinação do montante da coima aplicável, não procedeu a uma correcta ponderação das circunstâncias legalmente previstas para o efeito - nomeadamente a escassa gravidade da conduta e a diminuta ou inexistente culpa da Recorrente - violando frontalmente o art. 18.º do RGCOC e o art. 20.º n.º 1 e n.º 2 da LQCOA.
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Os artigos 9.º e 10.º da Directiva nº 2006/12/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de Abril, e respectivos Anexos I A e 1 B, devem ser interpretados no sentido de que as actividades de “armazenagem” ou “acumulação” de resíduos que não antecedam imediatamente quaisquer operações de “valorização” ou “eliminação” não se encontrem sujeitos a licenciamento/autorização a emitir por uma autoridade competente nacional.
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Os artigos 9.º e 10.º da Directiva nº 2006/12/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de Abril, e respectivos Anexos I A e 1 B, devem ser interpretados no sentido de que as actividades de “armazenagem” ou “acumulação” de resíduos que antecedam imediatamente a simples actividade de “transporte” de resíduos não se encontrem sujeitos a licenciamento/autorização a emitir por uma autoridade competente nacional.
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Os tribunais portugueses estão vinculados pelo direito comunitário a interpretar os artigos 3.º, al. b) e 23.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro, no sentido de que as actividades de “armazenagem” ou “acumulação” de resíduos que não antecedam imediatamente quaisquer operações de “valorização” ou “eliminação” não se encontrem sujeitos ao licenciamento/autorização previsto nos artigos 9.º e 10.º da Directiva nº 2006/12/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de Abril, e respectivos Anexos I A e 1 B.
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O Tribunal ad quem, uma vez que constitui objecto do presente recurso a correcta interpretação do direito comunitário e irá julgar em última instância, está legalmente obrigado, nos termos do disposto no último parágrafo do artigo 267.º do TUE, a promover o reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeia a propósito das questões suscitadas nas três conclusões anteriores.
NESTES TERMOS E NOS DEMAIS DE DIREITO APLICÁVEIS, a) Deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a sentença recorrida e absolvendo a Recorrente da prática da contra-ordenação pela qual vem injustamente condenada; b) Deverá, nos termos do artigo 267.º do Tratado da União Europeia, serem submetidas ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias as questões prejudiciais colocadas pela Recorrente, como é de JUSTIÇA! …”.
* O Exm.º Magistrado do MP Ministério Público.
respondeu ao recurso, nos termos de fls. 1030 a 1039, concluindo da seguinte forma: “… 1º. Em face da factualidade assente, a não provada e a respectiva motivação, conclui-se que douta sentença proferida não nos merece qualquer censura, pois bem ajuizou da prova produzida em audiência, fazendo correcta qualificação dos factos e aplicando correctamente a coima; 2º. Não existe qualquer errada subsunção da matéria de facto provada ao direito nem tão-pouco na determinação da medida da coima aplicável; 3º. Os factos provados não recaem na previsão do artigo 23º, n.º 4 do Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro pelo que não pode concluir-se que não estejam sujeitos a licenciamento.
4º. A actividade verificada, e praticada pela recorrente, recai na definição de “armazenagem” e não estando licenciada, pratica a contra-ordenação prevista no artigo 23º, n.º 1 e 67º, n.º, 1, alínea b) do mesmo diploma legal; 5º. Atendendo à falta de licenciamento para as operações de gestão de resíduos, atendendo a que a arguida tinha conhecimento que estava obrigada a obter a competente licença para proceder à gestão de resíduos nas suas instalações e que actuava sem essa mesma licença, atendendo aos seus antecedentes contra-ordenacionais, ao dolo; 6º. ao benefício económico consubstanciado no não pagamento dos montantes inerentes à obtenção do licenciamento em causa e, por fim, atendendo à moldura abstracta para a coima em causa, sancionável com coima entre 7.500 €uros a 44.890 €uros, entendemos que a coima aplicada - de 30.000 €uros - é adequada e proporcional; 7º. O Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro, que estabelece o regime geral de gestão de resíduos, transpôs para a Ordem Jurídica interna a Directiva n.º 2006/12/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de Abril, e a Directiva n.º 91/689/CEE, do Conselho, de 12 de Dezembro, de onde decorre a consagração do princípio do licenciamento das operações de gestão de resíduos; 8º. O Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro, não viola as Directivas enunciados estando...
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