Acórdão nº 07157/11 de Tribunal Central Administrativo Sul, 24 de Fevereiro de 2011

Magistrado ResponsávelTERESA DE SOUSA
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2011
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul Vem interposto recurso da sentença do TAC de Lisboa que julgou improcedente a acção de impugnação em matéria de asilo e protecção subsidiária.

Em alegações são formuladas as seguintes conclusões: A.

A douta sentença recorrida é nula por violação de princípios e direitos fundamentais, nomeadamente por se fundamentar em prova nula, pelo que deve ser revogada, com as legais consequências (vd. art.° 659.°/2 e 3 do CPC ex vi art.º 1.º do CPTA: Cf. arts.º 2.°, 9.° b). 18.°/1. 202.º/2 e 268.º/4 da CRP e arts.º 124.° e 125.° do CPA): e caso assim se não entenda, B.

De acordo com o n.° 2 do artigo 3.º da Lei n.° 27/2008, de 30 de Junho, relativa à concessão do estatuto de refugiado, em articulação com a definição prevista pelo artigo 1-A (2) da Convenção de Genebra relativa ao Estatuto dos Refugiados e pelo artigo 1 (2) do seu Protocolo de Nova Iorque de 1967, têm ainda direito à concessão do asilo os estrangeiros e os apátridas que, receando com fundamento ser perseguidos em razão da sua raça, religião, nacionalidade, opiniões políticas ou integração em certo grupo social, não possam ou, por esse receio, não queiram voltar ao Estado da sua nacionalidade ou da sua residência habitual: C.

A ora Recorrente foi forçada pelo pai a conformar-se a um casamento com um primo que não desejava. Por ter mantido uma relação amorosa que não merecia o acordo da família, foi brutalmente espancada pelo noivo, perante a passividade, ou mesmo a anuência dos seus familiares.

Foi ameaçada de morte pelo noivo na eventualidade de perder a sua virgindade antes do casamento, tendo sido vítima, igualmente, de graves sevícias físicas às mãos do namorado que não aceitou a sua separação: D.

Contrariamente ao invocado na decisão ora recorrida, o relato produzido pela Recorrente apresenta-se plausível e coerente por relação com a informação disponível sobre o país de origem, tendo a ora Recorrente exposto os factos relevantes de forma clara e circunstanciada, por mais que uma vez: E.

É manifesto que se encontram verificados os actos persecutórios sustentados pela Recorrente, indiciadores da existência de uma possibilidade razoável de vir a sofrer nova perseguição na eventualidade de ser devolvida ao país da sua nacionalidade: F.

É de conhecimento Universal a tolerância de que gozam o casamento forçado e os actos de violência física e sexual contra mulheres por parte das diversas esferas do Estado guineense, com especial destaque para as forcas de segurança pública e o poder político: G.

Relativamente aos critérios que deverão nortear a admissibilidade dos pedidos de protecção, o ónus da prova que nesta fase impende sobre a Recorrente no sentido de demonstrar a perseguição de que poderá vir a ser vítima é necessariamente menos intenso. Os elementos disponíveis permitem pugnar, neste momento, por um claro preenchimento dos critérios tendentes à concessão do estatuto de refugiado: H.

É manifesto que estão preenchidos os pressupostos de admissibilidade do Pedido de Asilo sub iudice, devendo o mesmo ser admitido para análise final, e em consequência ser a decisão ora recorrida revogada com as legais consequências: I.

A ora Recorrente encontra-se efectivamente impossibilitada de regressar ao seu país de origem, uma vez que é de conhecimento universal a sistemática violação dos direitos humanos, nomeadamente, das mulheres na Guiné-Bissau, e que é constantemente divulgada pelos meios de comunicação social de todo o mundo; J.

A ora Recorrente foi ameaçada de morte pelo noivo arranjado pelo pai e pelo namorado, não restando dúvidas que corre o sério risco de sofrer uma ofensa grave, tal como descrito nos n.º 1 e 2 do art. 7.º da Lei n.º 27/2008, de 30 de Junho; K.

Se a Recorrente for obrigada a regressar ao seu país de origem, e tendo em conta as tradições locais, os membros da sua família submetê-la-ão a todo o tipo de agressão física, tortura, e quiçá, “condená-la-ão à morte, tudo em nome de uma alegada “honra” que esta poderá ter violado ao não aceitar o casamento arranjado pelo pai; L.

Encontram-se preenchidos os pressupostos legais para a concessão da Autorização de Residência por Motivos Humanitários.

Em contra-alegações são formuladas as seguintes conclusões: 9º A Decisão impugnada satisfaz todos os requisitos legais, não existindo qualquer vício susceptível de gerar a invalidade do acto administrativo praticado.

  1. A autoridade recorrida deu pleno cumprimento às normas imperativas vigentes em matéria de Asilo e Refugiados, enquadrando de forma adequada a situação fáctica da recorrente.

  2. Deste modo, não padece tal Decisão de qualquer vício de facto ou de direito.

A EMMP emitiu parecer a fls. 237 a 242, no sentido de ser dado provimento ao recurso, revogando-se a sentença recorrida e substituindo-se por outra que considere procedente a presente acção especial, anulando o acto impugnado e condenando o R. a apreciar e decidir o pedido de asilo ou residência por questões humanitárias à aqui Recorrente, após instrução procedimental com as necessárias diligências, que se fundamentem em elementos probatórios, objectivos e seguros.

Sem vistos, vem o processo à conferência.

Os Factos A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

  1. Abibatu Balde apresentou-se no posto de fronteira do aeroporto de Lisboa em 26 de Julho de 2010, proveniente de Bissau, Guiné Bissau, sendo portadora do passaporte guineense n.°……………, da autorização de residência portuguesa n.°……….., emitidos em nome de M………… e do bilhete de avião para o percurso Bissau Lisboa e regresso. Cfr. folhas 10 e 11 do processo administrativo e acordo das partes.

  2. A……….. B….. apresentou em 28 de Julho de 2010, no Posto de Fronteira do Aeroporto de Lisboa um pedido de asilo, conforme documento com o seguinte teor: (…) DECLARAÇÃO COMPROVATIVA DA APRESENTAÇÃO DE PEDIDO DE ASILO Artigo 14 da Lei n° 27/2008 de 30.06 Nome: M……….. J….. T……., aliás A………. B…….

    Data e Local de nascimento: 09/06/1981, aliás 21/08/1981 -BISSAU (GUINÉ-BISSAU) Nacionalidade: GUINÉ-BISSAU Filiação: pai M………. e mãe D……… Titular do Passaporte ------ PROCESSO N° A presente declaração atesta que a cidadã acima identificada apresentou um pedido de asilo, neste posto de fronteira, aos 28/07/2010.

    O presente documento é válido até à decisão sobre a admissibilidade do presente pedido, a ser proferida pelo Director Nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras nos termos do artigo 24, n° 4, da Lei 27/2008 de 30.06. Enquanto não for proferida a referida decisão, deverá a cidadã acima identificada permanecer na zona internacional deste posto de fronteira, conforme o disposto no artigo 26º, n° 1 do referido diploma.

    Nos termos do artigo 24°, n°2 da Lei 27/2008 de 30.06, é o requerente informado sobre os direitos que lhe assistem e obrigações a que está sujeito, constantes do verso do presente documento.

    Este documento não constitui documento de identidade, nem o reconhecimento do estatuto de refugiado, não confere ao seu titular o direito de entrada em território nacional.

    (…) Posto de Fronteira do Aeroporto de Lisboa, aos 28/07/2010 SUBDIRECTOR DA DIRECÇÃO CENTRAL E FRONTEIRAS PF001 (....) Junto ao aos autos a folhas 28 dos autos.

  3. Aquele pedido de asilo foi indeferido, tendo A……. B…. sido notificada de tal decisão em 4 de Agosto de 2010, nos seguintes termos: SERVIÇO DE ESTRANGEIROS E FRONTEIRAS MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA GABINETE DE ASILO E REFUGIADOS NOTIFICAÇÃO (Artigo 24 n° 5 da Lei nº 27/2008 de 30.06 PROCESSO DE ASILO Nº 91C/10 Aos 04.08.10 pelas 18 h 00 m, no posto de fronteira do Aeroporto de LISBOA, é notificado(a) o(a) cidadão(a) que se identificou como A……….. B……. nascido(a) aos 21.03.88, nacional da Guiné Bissau da decisão de não admissão do seu pedido de asilo, proferida pelo Exmo Director -Nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, ao abrigo do n° 4 do artigo 24 da Lei n° 27/2008 de 30 de Junho.

    Nos termos do n° 3 do artigo 26° da Lei n° 27/08 de 30.06, a decisão de inadmissibilidade do pedido determina o seu regresso ao ponto onde iniciou a sua viagem, ou, em caso de impossibilidade, ao Estado onde foi emitido o documento de viagem com o qual viajou ou a outro local no qual possa ser admitido, nomeadamente um país terceiro seguro.

    Da decisão ora notificada cabe recurso, querendo, para o Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, fax número 21 1545188, a interpor no prazo de setenta e duas horas, com efeito suspensivo.

    Esta decisão foi comunicada ao Conselho Português para os Refugiados, de acordo com o previsto no n° 5, do artigo 24°, da Lei n° 27/08 de 30.06, que, ao abrigo do disposto no n° 4 do artigo 49, da citada Lei, e a pedido, poderá prestar aconselhamento jurídico directo em todas as fases do procedimento de asilo.

    Ao notificado(a) é entregue duplicado da presente notificação, cópia autenticada da decisão agora notificada e da informação do SEF n° 262/GAR/10, constituído por 09 folhas.

    A notificação foi lida ao requerente na língua, que compreende O NOTIFICANTE O NOTIFICADO O INTERPRETE (…) DECISÃO PROCESSO DE ASILO N.º 91C/16 Considerando o disposto nas alíneas b), c) e e) do n.º 2,do art.19º,e no n.º4 do art. 24º, ambos da Lei n.º 27/08, de 30 de Junho, com base na informação n.º 262/GAR/10 do Gabinete de Asilo e Refugiados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, recuso o pedido de asila apresentado pela cidadã que se identificou como A………… B……., nacional da Guiné Bissau.

    Com base na mesma informação e nos termos das disposições legais acima citadas, aplicáveis por força do disposto no artigo 34º da Lei n.º 27/08, do 30 de Junho, considero, não se enquadrar este caso no previsto no artigo 7º da supra citada Lei e, por isso, não admitir o pedido para efeitos de concessão de autorização de residência por razões humanitárias a cidadã identificada.

    Notifique-se a interessada nos termos do n.º 5 do art.º 24º, da Lei n.º 27/08, de 30 de Junho.

    Lisboa, 3 de Agosto de 2010...

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