Acórdão nº 76/06.7TTVIS.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Fevereiro de 2011

Magistrado ResponsávelCARLOS VALVERDE
Data da Resolução18 de Fevereiro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: Questão prévia Pelo Exmo. 1º Juiz-Adjunto foi, ao abrigo do art. 708º do CPC, na redacção anterior à entrada em vigor do DL 303/2007, de 24/8 (diploma pertencem os demais preceitos, a citar sem menção de origem), suscitada a não admissibilidade do recurso interposto pela Ré, face à sucumbência a atender.

Por se tratar de questão tão simples como incontroversa, não se determinou o cumprimento do art. 704º, ex vi do art. 3º, 3, que dispensa o contraditório em casos de “manifesta desnecessidade” e tal é o caso.

A regra geral, em matéria de admissibilidade dos recursos, é a que vem enunciada no art. 678º, 1: “Só é admissível recurso ordinário nas causas de valor superior à alçada do tribunal de que se recorre, desde que as decisões impugnadas sejam desfavoráveis para o recorrente em valor também superior a metade da alçada desse tribunal”.

Decorre deste preceito que a admissibilidade do recurso está subordinada a uma dupla condição: - que o valor da causa seja superior à alçada do tribunal de que se recorre; - que as decisões impugnadas sejam desfavoráveis para o recorrente em valor também superior a metade da alçada desse tribunal.

Ou seja: Se o valor da causa for inferior à alçada, o recurso ordinário será sempre, logo por aí, inadmissível; se for superior, importa atender ainda ao montante da sucumbência, pois o recurso só será admissível se o valor dessa sucumbência for superior a metade da alçada.

Quando a lei conjuga estes dois valores - alçada e sucumbência - para fixar o limite da recorribilidade das decisões, está a significar que o valor último a atender será aquele que corresponde ao desfavor real da decisão e não o que se reporta ao valor formal do processo (cfr. Cardona Ferreira, Reforma Intercalar do Processo Civil – Notas Práticas, 1986, pág. 61).

Sabe-se, por outro lado, que o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões vertidas na minuta alegatória (arts. 684º, 3 e 690º, 1), donde decorre que o tribunal ad quem só pode considerar as questões efectivamente ali vertidas pela parte discordante.

É dizer então, para os efeitos ora em análise, que a sucumbência atendível não será, afinal e necessariamente, aquela que decorre da decisão impugnada, mas tão somente a que, em concreto, se mostre censurada no recurso.

O recorrente não está obrigado a delimitar o objecto do recurso no requerimento de interposição e, se não fizer, o recurso abrange tudo o que na parte dispositiva da decisão lhe for desfavorável (nº 2 do citado art. 684º).

Mas as conclusões da minuta alegatória podem evidenciar, expressa ou tacitamente, uma restrição do objecto inicial do recurso (nº 3 do mesmo preceito), impondo-se, então, considerar se se deve ou não admiti-lo ou conhecer do seu objecto, conforme os casos.

E isto, porque a sucumbência aqui atendível é a sucumbência concretamente censurada e não a decretada.

Na situação sub judicio, a acção tem o valor de € 28.854,34 e a sucumbência da apelante/Ré traduziu-se em € 17.117,39 (12.872,91 + 4.244,48).

Perante estes valores - e porque a recorrente não circunscreveu, desde logo, o objecto do recurso, outra coisa não caberia ao Mmo. Juiz a quo que não fosse proceder à sua admissão.

E, assim, aconteceu.

Porém, as conclusões da minuta alegatória vieram demonstrar que, afinal, a apelante/Ré apenas questiona o segmento decisório que a condena a pagar à A. a quantia de € 4.244,48, adiantado por esta a título de IRS.

Logo, o desfavor efectivamente censurado traduz-se nessa quantia, notoriamente inferior a metade da alçada do tribunal recorrido.

Perante este circunstancialismo, à luz dos princípios enunciados, não é possível conhecer do objecto do recurso interposto pela Ré, por não o permitir o valor da sucumbência impugnada.

--- x --- AA instaurou a presente acção com processo comum contra a Universidade Católica Portuguesa, pedindo a condenação desta a reconhecer a invocada cessação do contrato, por caducidade, como um despedimento ilícito e a sua consequente condenação em indemnização por antiguidade, (opção formulada no início do julgamento), no pagamento das retribuições até ao trânsito em julgado da sentença e ainda no pagamento de € 15.669,86, a título de prestações retributivas não pagas desde Novembro de 2002, € 4.244,48, a título de IRS, € 4.484,00 referente a encargos que tem que suportar com o seu doutoramento na Universidade de Coimbra e ainda € 7.500,00 a título de danos morais, tudo com juros de mora, à taxa legal, para o que alegou, em síntese útil, que foi contratada pela Ré, como assistente, em 01/10/1987, tendo leccionado na Faculdade de Letras, Centro Regional das Beiras, Pólo de Viseu; por carta de 07-07-2005 a Ré fez cessar a relação laboral, invocando a não conclusão do seu doutoramento; durante alguns anos a Ré pagou-lhe uma importância mensal, para além do que constava do respectivo recibo, mas, a partir de Novembro de 2003, deixou de lhe pagar tal importância, relativamente à qual teve que pagar ao Fisco o total de € 4.244,48.

Citada, contestou a Ré, sustentando a licitude da cessação do contrato, pelo facto de a autora não ter concluído o doutoramento.

A A. respondeu, mantendo, no essencial, o alegado na petição inicial.

Instruída e discutida a causa, a 1ª instância veio a julgar a acção parcialmente procedente, com condenação da Ré no pagamento à A. da importância de € 12.872,91, com juros de mora, à taxa legal, desde o trânsito em julgado da sentença.

Não se conformando com a sentença, dela apelaram a A. e a Ré para o Tribunal da Relação de Coimbra, tendo-se aí, por acórdão de 26-05-2009, julgado improcedente a apelação da Ré e, parcialmente procedente a apelação da A., em consequência do que, confirmando-a no mais nela decidido, se revogou a sentença apenas na parte em que não acolheu o pedido de pagamento da quantia de € 4.244,48, respeitante a IRS, condenando-se a Ré no pagamento desta quantia à A., acrescida de juros moratórios, desde a citação.

Irresignadas com este acórdão, dele recorreram a A. e a Ré para este Supremo Tribunal, apenas aqui se curando de conhecer da revista da A., dado não poder conhecer-se, como se entendeu na questão prévia supra suscitada, do recurso da Ré.

No seu recurso, a A. sustenta a procedência integral da acção e alinhou o seguinte quadro conclusivo: 1ª - Concluiu-se no douto Acórdão sub judice que o contrato de trabalho da A. cessou por caducidade, por “impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva de o empregador receber a prestação do trabalho da A. “; 2ª - Só que esta conclusão não é minimamente sustentada em qualquer argumentação factual ou legal; 3ª - Toda a fundamentação desenvolvida vai, sim, no sentido de se pretender demonstrar que o exercício da actividade docente de um assistente se encontra legalmente condicionada à posse do doutoramento; 4ª - Mas também esta modalidade de impedimento, que se consubstanciaria no pretenso facto de a A. estar legalmente impedida de exercer a sua actividade de docente, como assistente, pelo facto de não haver feito o doutoramento, não tem qualquer sustentação; 5 - É que o n° 1 do art° 39° do Estatuto da Carreira de Docente da recorrida não prevê que, para o exercício da actividade docente, como assistente, seja necessário obter o grau académico de doutor, ao fim de determinado período de duração do contrato de trabalho; 6 - Já, diferentemente, quanto aos assistentes estagiários, o referido estatuto prescreve, expressamente, que "não podem permanecer em funções se, até ao termo da terceira renovação do contrato, não apresentarem a dissertação do mestrado..." - n° 2 do art° 40°; 7ª - O que o referido n° 1 do art° 39° do predito estatuto regula é apenas a duração do contrato dos assistentes; 8ª - Dependendo a sua cessação sempre e só de uma livre decisão e vontade do Reitor; 9ª - E não como consequência directa e inelutável de alguma ocorrência superveniente de ordem legal, que tornasse o contrato inviável; 10ª - Há um flagrante equívoco do Tribunal da Relação, equivoco este que radica no facto de entender que a argumentação feita num Acórdão da Relação do Porto, que respeita à situação de um assistente estagiário, que não concluiu o mestrado ao fim do tempo legalmente fixado, também "vale para a situação como a dos autos - em que o assistente (já com o mestrado concluído) não requereu a sua submissão a provas de doutoramento, tendo decorrido o prazo do contrato e das prorrogações "; 11ª - O Tribunal da Relação não se apercebeu que as situações são substancialmente...

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