Acórdão nº 0869/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Fevereiro de 2011

Magistrado ResponsávelRUI BOTELHO
Data da Resolução03 de Fevereiro de 2011
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I Relatório A…, com melhor identificação nos autos, vem recorrer da sentença do TAC de Lisboa, de 18.6.09, que negou provimento ao recurso contencioso interposto da deliberação da CÂMARA MUNICIPAL DE PORTIMÃO, de 10.4.02, que ordenou a remoção de areias que se encontravam num terreno localizado no sítio do … - Portimão e a sua reposição na situação em que anteriormente se encontrava, imputando-lhe as respectivas despesas.

Para tanto alegou, vindo a concluir como segue: 1. Na apreciação da matéria de facto o tribunal “a quo” confundiu duas questões totalmente distintas e autónomas entre si, como se de uma única questão se tratasse, as quais importa clarificar, distinguindo-as uma da outra; 2. Tendo em consideração a matéria vertida nas alíneas I), O) e P) da “fundamentação de facto” tida como provada, aquele tribunal errou na apreciação dos factos; 3. Com efeito, o depósito de terras e pedras, vulgarmente designado como entulho, é totalmente distinto do depósito de areias denunciado pelo reclamante B… ao qual aludem as alíneas A), B), C), F), J), K) e S); 4. Se por um lado o depósito de terras e pedras - entulho, se reporta a factos verificados junto ao caminho público localizado a sul do prédio propriedade do ora recorrente, nomeadamente próximo do local onde este confina com o prédio propriedade do reclamante C…; 5. Já o depósito de areias localiza-se a norte do prédio propriedade do recorrente, junto à extrema do prédio pertence ao reclamante B…; 6. Para além disso, em termos do procedimento administrativo, ambas as situações de facto tiveram tratamento diferenciado, bem como desfecho totalmente oposto; 7. Na verdade, como descrito na alínea O), o aludidos “aterros de terras e pedras” deram origem à elaboração de um Auto de Noticia, em 20 de Março do ano de 2000 e, consequentemente, à instauração do Processo de Contra-Ordenação n° 44/2000, em 27.03.2000; 8. Processo de Contra-Ordenação esse que veio a ser arquivado, através de despacho emitido em 04.06.2002, notificado ao recorrente através do ofício com a ref. 9982, com data de 14.06.2002, pela simples e única razão de que os factos descritos em sede de auto de notícia não são susceptíveis de serem considerados como constituindo uma alteração da topografia local; 9. Totalmente distinta é a questão relativa ao depósito de areias, à qual se reporta a deliberação de Câmara de 10.04.2002, com o n° 471/02; 10. Pelo facto desta destrinça não ter sido feita pelo tribunal “a quo”, a decisão proferida quanto à matéria de facto encontra-se fundamentada num pressuposto de facto totalmente erróneo, o que de igual modo conduziu á errada aplicação do direito; 11. Termos em que, impugna-se, para os devidos efeitos previstos nas alíneas a) e b) do n°.1 do art°.690°.-A do Cód. de Proc. Civil, ex vi art°.102° da LPTA, a decisão proferida quanto à matéria de facto vertida nas alíneas I), O) e P) da sentença ora colocada em crise.

12. Na realidade, tendo por base o teor da prova constante do processo administrativo, nomeadamente as informações prestadas pelos respectivos serviços técnicos, às quais foi feita expressa alusão nas alíneas referidas, aliado ao teor do Doc. 52 dos autos e fls. 21 do Proc. Admi., bem como dos Docs. ora juntos com a presente peça, em contraposição com os factos descritos nas demais alíneas A), B), C), F), J), K), S), tinha aquele tribunal “a quo” disponíveis e ao seu alcance todos os elementos de facto que conduziam a uma decisão diversa daquela que veio a tornar. Impunha-se pois, necessariamente, uma decisão diversa daquela que veio a ser proferida.

13. Por conseguinte, e sobre esta questão em concreto depósito de terras e pedras junto ao caminho público «localizado a sul da propriedade do ora recorrente, mais concretamente no local onde o prédio que em compropriedade pertence a si, bem como à sua irmã e mãe, confina com o prédio propriedade do reclamante C…, melhor assinalado a laranja no Doc. 1 de acordo com informação n°.1664/99 dos Serviços de fiscalização - não deveria, nem podia, o tribunal “a quo” ter tido em consideração toda essa matéria factual (vertida nas supra citadas alíneas), uma vez que esta de modo algum serviu de suporte à deliberação de Câmara ora impugnada no âmbito da presente lide.

14. Motivo pelo qual mal andou aquele tribunal ao apreciar e valorar esta matéria, fundamentando pois a sua decisão em tais factos, totalmente distintos do depósito de areias salgadas, localizado a norte da aludida propriedade do recorrente.

15. Por outro lado, em face dos demais factos tidos como provados, não existem elementos suficientes e bastantes nos autos que permitissem ao tribunal “a quo” considerar, como efectivamente veio a fazer, no que concerne especificamente ao depósito de areias salgadas, que houve alteração da topografia local; 16. Sendo certo que, por alteração da topografia local deve entender-se como sendo qualquer modificação, realizada pela actividade humana ou causa natural, verificada no solo, que implique a subida, ou descida, da respectiva cota que previamente a essa modificação existia. Essa modificação poderá ser resultante da realização de um aterro, talude (corte de barreira), de perfurações, escavações e/ou terraplanagens com a respectiva movimentação de terras, o que origina pois a alteração do revelo natural e as camadas de solo arável; 17. Na verdade, um depósito de areias, com carácter meramente provisório, tal como aquele que demonstram as fotografias constantes de fls. 7 do processo administrativo e doc. 2 junto ao presente, não deve ser considerado como alterando a topografia local; 18. Com o referido depósito de areias, a cota do solo sobre o qual aquelas foram depositadas de modo algum veio a ser alterada, uma vez que não foi feito qualquer trabalho de terraplanagem ou movimentação de terras (aliás, nem tal facto foi referido em nenhuma informação prestada pelos serviços de fiscalização da Câmara Municipal de Portimão). Nesse aspecto, basta verificar que, após a remoção de toda a areia, o solo manteve todo o declive que tinha antes da areia ali ser colocada, conforme bem demonstram as fotografias juntas como Docs. 6 a 8; 19. Além do mais, foi imputado ao recorrente a realização de actos que implicaram a alteração da topografia local, sem que no entanto tenha sido feita uma descrição exaustiva de tais factos susceptíveis de serem considerados como alteração topográfica; 20. Em nenhuma das informações prestadas pelos serviços da entidade recorrida, é feita qualquer alusão, concreta e objectiva, da cota que o terreno em causa tinha, antes de efectuado o depósito e a cota que o mesmo passou a ter com aquele depósito.

21. Em momento algum foi demonstrado, no âmbito do processo administrativo, através do meio idóneo para tanto, isto é, através de um levantamento topográfico, qual a alteração que o terreno do recorrente sofreu em termos de cota, não obstante o despacho de 24.06.1999 (constante de fls. 6 do Proc. Admi. que importa ter em consideração) ter determinado a deslocação ao local da fiscalização municipal acompanhada “por um topografo camarário” 22. Só mediante o aludido levantamento topográfico, que nunca foi realizado, teria sido possível, concluir no sentido em que concluíram os serviços municipais na informação n°.1279 - V.S./99 - S.O.P.; 23. Deste modo, terá andado mal o tribunal “a quo” ao considerar, como na realidade considerou, que está demonstrada a alteração da topografia local tendo presente o teor de toda a documentação constante do processo administrativo; 24. E, como tal, terá sido violado o disposto na aliena a) do n°.1 do art°.1° do Decreto-Lei n° 445/91, de 20 de Novembro, na redacção que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei n°. 250/94, de 15 de Outubro; 25. Sem prejuízo, diremos também que o Decreto-Lei n°. 445/91, de 20 de Novembro, na redacção que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei n°. 250/91, de 15 de Outubro e posteriormente pela Lei n° 22/96, de 26 de Julho, não poderá ser aplicado ao caso concreto dos presentes autos; 26. O diploma em causa, como aliás desde logo o seu preâmbulo faz referência, visa regular e disciplinar todo o processo de licenciamento municipal de obras particulares, e estas são todas aquelas operações urbanísticas referentes a obras de construção civil tendentes à edificação ou construção de novos edifícios, sua reconstrução, ampliação, alteração, reparação ou demolição, não descurando, como parece evidente, os trabalhos de escavação ou terraplanagem que muitas das vezes aquele tipo de operações acarreta para a construção de um qualquer edifício; 27. O legislador, quando decidiu alterar o regime legal até então estabelecido pelo Decreto Lei n°.166/70, de 15 de Abril, teve apenas e somente em vista criar procedimentos legais tendentes a regular todo o referido processo de licenciamento das denominadas obras particulares, intenção essa que é bem patente ao longo de todo o dispositivo desse diploma legal, e que saiu ainda mais reforçada com a alteração operada com a publicação do Decreto Lei n°. 250/94, de 15 de Outubro; 28. O diploma legal em análise tem esse âmbito de aplicação muito restrito, mas bem definido, e como tal muito objectivo, no qual não se inclui a situação concreta dos presentes autos - depósito de areias num prédio rústico; 29. E tanto assim é que os diplomas que vierem regulamentar a matéria legislada -. Portarias n°s. 1115-A/94 e 1115-B/94, de 15 de Dezembro não aludem a qualquer modelo, ou espécie, de Alvará de Licença que titule esse tipo de actividade; 30. Nenhum dos modelos definidos por esses diplomas se...

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